quarta-feira, 20 de março de 2013

PIROU?



Quem nunca pirou na batatinha, nunca viajou na maionese ou deu um piti em local publico que atire a primeira pedra. As vezes estamos somente falando em voz alta, mas para quem está ao redor é uma gritaria só! Conhecer pessoas bipolares, seres humanos com TOC, hipocondríacos, moças com TPM no último grau, é uma constante na vida da gente. “No meu tempo”, como diria minha avó, não existia esta quantidade de definições para tantas faltas de controle. Geralmente a mocinha que pirava o cabeção era uma histérica, e o rapazinho, um desequilibrado. E estávamos conversados! Mas, graças a Freud e às novas definições da língua portuguesa, os adjetivos e denominações para uma simples pirada estão à disposição para uso irrestrito!

Com base nesta observação, de como caminha humanidade, estreou no Teatro do Leblon, na sala Marilia Pera, o divertidíssimo espetáculo ˜Pirou?˜. Amparados num ótimo texto de Regiana Antonini, o espetáculo é o encontro de quatro atores, bem centrados, que interpretam papeis completamente pirados em encontros inusitados nas mais variadas formas de piração: a TPM com o TOC, a bipolar com o complexo de inferioridade e o eterno perseguido com a hipocondríaca.  É inegável a imensa capacidade de se comunicar com a plateia que os textos de Regiana Antonini têm. Já assisti a alguns espetáculos desta autora e sempre me surpreende a sua inteligente fórmula de como fazer a plateia se identificar com o que está vendo no palco. Aplausos.

Na parte técnica, o cenário Henrique Neves é composto de três bancadas de camarim ao fundo e três conjuntos de mesa com duas cadeiras, servindo ora de bar, ora de escritório. Nada além do necessário para contar aquelas histórias. Figurino e do Bruno Perlatto é simples, mas o necessário para não atrapalhar as loucas performances dos atores. Bruno criou um “guarda-pó" azul típico de hospício para os atores receberem a plateia e fazerem a narração / ligação entre as cenas. Durante os esquetes, as roupas auxiliam na caracterização dos personagens. Dani Sanches assina a luz desta comedia sabendo que ali o humor, o brilho, é dos atores.

Michel Bercovith dirige o espetáculo com leveza e coloca certa ordem na casa, mas é claro que o talento dos atores não os permitem seguirem à risca um espetáculo amarrado com camisa de força, portanto, Michel opta por deixa-los mais à solta para que a criatividade possa aflorar, bem como a piração de cada ator seja bem utilizada a favor do humor.

Quem se diverte para valer, antes mesmo de divertir a plateia, é o elenco. Tatá Lopes e Zé Auro Travassos, engraçadíssimos,  estão excelentes nos papeis que interpretam, levando ao extremo a piração e a loucura ideal para que o espetáculo seja comunicativo. Milena Toscano, nos brinda com uma divertidíssima "possuidora" de TOC e uma bipolar que as vezes chega a ser “tripolar” tamanha a quantidade de loucuras que fala. Bruno Barros completa o elenco apoiando os colegas como o chefe do departamento, o garçom e o farmacêutico.

Nos dias de hoje basta abrir um jornal, assistir televisão, para se ficar indignado com tantas loucuras e absurdos cometidos pelo Congresso Nacional. Somos tomados de um ódio e uma impotência sem tamanho. Sem contar as desgraças das chuvas recorrentes em nosso Estado e nossa cidade Rio de Janeiro. Por quanto tampo vamos resistir bravamente às atrocidades que estamos sendo alvo pelos políticos que nos governam, não sabemos. Mas, graças a espetáculos divertidos e comunicativos como "Pirou?" temos uma folga neste mar de sujeira e lama e podemos nos divertir a valer para encarar de frente o universo que nos rodeia. Quer rir muito? Vá já ao teatro pirar com este espetáculo!



segunda-feira, 18 de março de 2013

CAIXA DE AREIA



Justifico este longo e tenebroso verão da minha ausência nos comentários. O trabalho está árduo neste pós-folia e início de novo ano “letivo”. Chegamos a Salvador para o Lê Pra Mim? na sexta-feira 01 de março, aniversário do meu RJ. Em cartaz na cidade a peça “Caixa de Areia”, do talentoso Jô Bilac, com Taís Araújo no elenco. Fomos assistir. Também tive a oportunidade de ver “Namíbia Não”, com direção de Lázaro Ramos. O casal Lazaro-Tais dominava os principais palcos da cidade! Para fechar com chave de outro, revi, pela sétima vez, o brilhante “A Bofetada” com a Companhia Baiana de Patifaria.

Escrever sobre um espetáculo de teatro, como se fosse um crítico, não é das tarefas mais fáceis. Por isso, aqui neste espaço, digo que são “opiniões de um leigo” - pois não estudei teatro - sobre o que vi no palco. Tenho uma escala mental de 0 a 10 e se o espetáculo assistido se encaixa no eixo “de 5 a 10” costumo fazer comentários favoráveis, mesmo que eu não tenha gostado muito, mas sempre encontrando algo de importante que mereça ser valorizado na montagem. Afinal tem uma equipe imensa trabalhando e não cabe a mim derrubar espetáculo de ninguém. Quando a escala é abaixo de 5, eu reprovo o comentário e ele fica apenas na minha cabeça. Aprendi, faz um certo tempo, que se não é para falar bem, melhor não falar nada.

“Caixa de Areia” estreou nos palcos cariocas no confortável Teatro do SESI, centro do Rio. Este texto, segundo li nas matérias publicadas, faz parte de uma trilogia (“Savana Glacial” e “PopCorn”) deste autor já premiado. Gosto muito do jeito e da inteligência do Jô Bilac. A peça fala sobre  uma critica de teatro que vê a sua vida como se não fosse sua. Como se assistisse de fora os acontecimentos, do presente e do passado, que envolve mortes e fazem com que a crítica de teatro reflita sobre a sua própria vida.

Jô Bilac realmente tem o dom de nos surpreender com suas tramas rebuscadas, contando a história em pedaços para juntar tudo depois. Como se nos desse em doses homeopáticas todas as peças do quebra-cabeça. Confesso que minha capacidade de compreender o espetáculo naquela sexta-feira da viagem estava abaixo da crítica. Prestei atenção, reuni as peças do quebra-cabeça mas, “ou o texto esta muito rebuscado ou eu sou uma perfeita anta”, pensei. Após o espetáculo, na mesa do restaurante, expus minhas hipóteses sobre o assistido. E, junto com os amigos, chegamos as respostas sobre o fio condutor da história contada. Foi ótimo ficar conversando, durante a pizza de peperoni, sobre o espetáculo, arrumando todas as informações que Jô Bilac havia nos dado. Tal qual investigadores num livro de suspense.

No palco, o maravilhoso - repito: maravilhoso - cenário de Flávio Graff, composto de móveis antigos, armários, um conjunto de cadeiras empilhadas e folhagens secas, nos faz passear pelo universo de uma casa antiga, onde histórias aconteceram e plateia de teatro onde a personagem critica de teatro passa sua vida a limpo. O figurino de Patrícia  Muniz é lindo pra caramba e cheio de detalhes de bom gosto. A luz de Adriana Ortiz aproveita o espaços entre os móveis, explora com beleza as cores do cenário e dá o tom de mistério ao espetáculo.  Além de trilha sonora bastante competente de Samantha Rennó.

A direção é do próprio autor que, junto com Sandro Pamponet, sabem do seu desejo de jogar as peças para que a plateia as junte em sua cabeça, tem total domínio das possibilidades de movimentos e utilização do palco e cenário a favor do espetáculo. E soma-se a isto a direção de movimento da competente Viétia Zangrandi


No elenco, todos estão muito bem, se posicionando diante do desafio desta montagem com respeito ao novo autor/diretor, se entregando aos seus papéis com confiança e segurança. Tais Araújo - aliás linda de cabelos curtos a lá Halle Belle - e Luiz Henrique Nogueira encabeçam o elenco com segurança. Cris Larin e Julia Marini chegam a roubar algumas cenas para si tamanha a entrega; e Jaderson Fialho completa o elenco dando vida a outros papéis masculinos.

Sem dúvidas, Caixa de Areia é uma produção de alta qualidade, de alto nível de competência de toda equipe. Depois de passar por algumas cidades brasileiras, é uma opção para quem gosta de desafios de quebra-cabeça e, principalmente, aprecia o talento de Jô Bilac.