sábado, 20 de setembro de 2014

A QUANTAS SEPARAÇÕES UMA MULHER É CAPAZ DE SOBREVIVER?


O tema é vasto. As discussões sem fim. Relacionamento a dois ainda é um dos maiores problemas da humanidade, quando sentam no consultório de um psicólogo. Minha culpa? Culpa do outro? Onde está o erro? Houve erro? O que fazer para melhorar?

Ao longo dos meus - muito bem vividos - 7 anos de terapia, aprendi que o nosso comportamento é sempre o responsável pelo que sofremos. As pessoas só fazem com a gente, aquilo que a gente, conscientemente, ou não, deixa que elas façam conosco.

Sempre digo que teatro tem que deixar uma reflexão pra levarmos para casa. Assim como na terapia, na sala de aula, refletir em casa, amadurecer a ideia, gastar o assunto, é importante. Se vamos aprender, só o tempo dirá.

Dentre o que aprendi na terapia, uma conclusão: quanto mais rápido chegar ao fundo do poço, mais rápido você sobe de volta. Imagine um poço, com uma mola embaixo. Se você descer devagar, curtindo a fossa, adorando sofrer, ao pisar na mola, você estará tão sem forças, que a mola não vai te impulsionar de volta e, portanto, a cura demorará a chegar. Ao passo que, se descer ao fundo do poço logo, na velocidade, se acabando duma vez, a força do resgate, retorno, é muito maior e logo logo você estará são e salvo, pronto para outra. De novo.

Está em cartaz no Teatro Leblon, sala Tônia Carreiro, a peça “A quantas separações uma mulher é capaz de sobreviver?”. Texto de Renata Tobelem. A peça conta a história de Ana, que acabou de tomar um pé na bunda. O cara nem se deu ao trabalho de ir pessoalmente dizer adeus. Deixou uma mensagem na secretária eletrônica e acabou com o humor da moça. Ela, que já vem de alguns pés-na-bunda, faz uma reflexão, consigo mesma, e tendo a plateia como ouvido e cumplice, sobre seus mais recentes relacionamentos. Em todos, ela comete os mesmos pecados comportamentais, que uma boa terapeuta iria enumerar e ajudá-la a não cometer mais os mesmos erros. Quem sabe outros? Novos erros?

O texto flui muito bem. Renata sabe escrever e contar histórias com inteligência. Tem humor nas entrelinhas e nas ações que Ana se envolve. Sem apelos, mantendo a sequência em ascendência até o clímax, o texto em si já é um prazer para o público acompanhar. A cada novo relacionamento frustrado, vemos a evolução dos erros e acertos na vida de Ana, mesmo sem ela se dar conta. Embora Ana faça terapia, a alta médica está longe de chegar. Aliás, acho que Ana merecia mudar de analista, pois seus sofrimentos com sua vida amorosa têm cura!

O lindo cenário de Lídia Kosovski e Nicole Marengo, onde a personagem escreve no quadro negro informações para que não se esqueça dos fracassos, como se a vida lhe desse uma aula, mostra bem a cabeça de Ana: muita informação bagunçada e confusão. Adorei o lustre em formato de forca! Lembra ainda uma sala de aula, onde a vida vai ensinando para Ana a forma de se adequar ao comportamento social de sua geração. O figurino de Sol Azulay está bonito e confortável, dando a leveza necessária para a personagem que está em casa, envolta em seus problemas. A iluminação: Felipe Lourenço deixa claro o momento da confusão, da diversão e da reflexão. E a trilha sonora de Michel Bercovitch dá o tom certo para os momentos em que a passagem de tempo, pensamentos e devaneios são importantes.

Guida Vianna dirige a peça, explorando toda a capacidade que Renata tem. Ela consegue sugar o que a autora-atriz quis dizer com cada frase e fazê-la passar com toda a verdade. Aplausos para um trabalho elegante e sábio.

A vantagem de ser autora e atriz é que, Renata Tobelem pode brincar a vontade com a palavra. Está ótima em cena. Segura, divertida, cativante, firme. Já conheço seu trabalho desde a peça Aberrações, onde tive o prazer de assisti-la durante meses. Eu me apeguei ao espetáculo e ia a quase todas as apresentações. Agora, em “A quantas separações uma mulher pode sobreviver?”, Renata mostra mais uma vez a grande atriz que é. Olho nela, pq vai longe. Precisamos que a mídia reconheça o grande talento que ela tem.


“A quantas separações uma mulher pode sobreviver?”. Sinceramente? A todas. A opção pela vida, mesmo que o luto seja grande, o sofrimento forte, não pode ser posta em duvida. Morrer é fácil. Difícil é encarar de frente com força, resiliência (aprendi essa palavra há poucos dias e estava louco pra usar!), se recuperando e seguindo em frente a cada lombada que a vida nos dá. Portanto, vá ao teatro. Terças e quartas, assistir a este espetáculo. 

Certamente você sairá de lá refletindo sobre seus relacionamentos, como eles foram importantes para sua vida e o que fazer (e não fazer) no próximo, ou próximos, namoros ou casamentos!