sábado, 19 de agosto de 2023

AS DONAS DA CENA - BARBARA, CLARA, JOSÉPHINE e MELANIE


Após merecidas e sonhadas férias de 20 dias - neste verão resolvi fazer algo de diferente! -, volto às poltronas dos teatros cariocas com alegria e emoção. Em menos de 15 dias, quatro mulheres marcaram para sempre seus nomes na história do meu teatro carioca. 

Será tarefa difícil para os jurados de prêmios escolher qual a melhor - ou pelo menos aquela que mais mereça o prêmio - de "a" atriz de 2023. 

Sem mais delongas, vamos aos nomes, por ordem alfabética, com algumas considerações sobre as atrizes:

Ana Beatriz Nogueira com seu majestoso trabalho no espetáculo Sra. Klein (Teatro Prudential) , dando vida a uma psicanalista, Melanie Klein, Ana Beatriz aproveita todas as vírgulas, pausas e silêncios possíveis, em um texto difícil para aqueles que não estão acostumados aos termos da psicologia e psicanálise. O embate entre mãe e filha - lindamente interpretada por Natália Lage - e o quase assédio moral sobre a submissa e fiel assistente - interpretada por Kika Kalache. A inteligência cênica de Ana Beatriz é impactante. Ela não só sabe as suas marcas e falas, como está ligada em tudo que acontece ou possa vir a acontecer em cena. Ela comanda a história e a intensidade do espetáculo. Hipnotizante.

Bruna Pazinato na sua incorporação de Clara Nunes, em Uma DeCLARAção de Amor (Teatro Clara Nunes). Por diversas vezes tive a certeza de que Clara Nunes estava ali, em cena, se divertindo, num sobe-e-desce entre o além e a terra, para ora brilhar, ora deixar o “cavalo” brilhar. As expressões faciais, gestual coreografado, timbre vocal, olhar e força cênica de Bruna é uma alegria para todos que estão na plateia. Emociona saber que Clara Nunes vive sob o corpo de Bruna Pazinato. Aplausos ainda para a caracterização.

Marisa Orth pela perfeição em cena com sua Bárbara (Teatro XP), no espetáculo de mesmo nome, sobre o livro A Saideira, de Bárbara Gancia. Sem papas na língua, quem espera assistir a uma comédia rasgada é premiado por um drama com humor, música e muita ação boa. Marisa é tão maravilhosa em cena, segura, consciente da sua profissão, que capta todos os olhares e respiração da plateia. Tem o público nas mãos e faz conosco o que quer. Choramos, rimos - as vezes de nervoso, outras de graça -, torcemos, mas sabemos o fim da história, pois Gancia está aqui entre nós viva e exemplar. Marisa mergulha fundo numa aula de monólogo, muito bem dirigida e com o suporte caprichado de um contra-regra personagem. O trabalho de Marisa Orth é excelente. Que ela tem talento sabemos faz tempo, mas, neste nível de aprofundamento e qualidade, é, sem dúvida, um imenso salto em sua carreira, um de seus melhores trabalhos em teatro. 

Sirléa Aleixo pela composição sensacional da centenária Joséphine Linc Steelson, uma velha negra de quase 100 anos que sobrevive ao furacão Katrina, responsável pela devastação da cidade de Nova Orleans, no espetáculo Furacão (Espaço Sérgio Porto). Neste espetáculo, de produção da Amok Teatro, temos Sirléa doando todo seu corpo e voz para esta mulher sofrida, que tem valores fortes e desejos. Que assiste a mais um ataque sobre sua comunidade, quando estes são deixados para trás na hora da evacuação da cidade, momentos que antecedem a passagem do pior furacão da história dos EUA. E na sequência dos resgates da comunidade, massacrada e sacrificada, Joséphine se revolta e protesta, à sua maneira, se abrigando sob a bandeira americana, mostrando que aqueles abandonados também são cidadãos nascidos e criados, donos das terras. Excelente trabalho. Ainda vale o destaque para Taty Aleixo cantando divinamente bem durante o espetáculo.

Sei que o tempo urge e algumas das peças já estão em sua última semana em cartaz, mas, se der, não perca. Assistir a estas GIGANTES quatro atrizes, nos melhores papéis desta temporada, é mais que obrigatório. 

Corram, corram, corram e não percam estes espetáculos, essas entregas, esses talentos que dão orgulho aos deuses do teatro. Ana Beatriz Nogueira, Bruna Pazinato, Marisa Orth e Sirlea Aleixo merecem todos os aplausos de pé, até as palmas das mãos ficarem em carne viva! Viva o Teatro, viva a arte de interpretar! Vida longa a essas quatro atrizes brilhantes e talentosas.