Riva era o nome da professora da inglês. Louraça belzebu que havia morado na Inglaterra. Acho que deveria ter menos de 40. Nós eramos todos estutantes do Instituto Guanabara - que ainda existe na Tijuca. Numa dessas idéias mirabolantes, Riva decidiu que iríamos encenar uma musica. Isto mesmo, encenar uma musica. Idéia de girico. Porém, como eu sempre fui chegado a um ridiculo, combinei com mais 4 companheiros, sendo 3 moças, e levamos "The Logical Song" - Supertramp ao tablado principal da sala. Foi uma gargalhada do início ao fim. Nunca antes na história daquela turma nos divertimos tanto numa aula de inglês quanto naquele dia. Claro que não vou contar sobre os 4 ensaios, as 2 brigas e a escolha tortuosa do figurino, que incluia até um par de asas de anjos com manchas de sangue. Nem sei o motivo disto. Infelizmente, nunca foi registrada esta feita na sala de aula. Mas está tudo aqui na minha memória.
Acabo de chegar da peça "R&J de Shakespeare - Juventude Interrompida", adaptação de Joe Calarco com tradução de Geraldo Carneiro para Romeu e Julieta. A já conhecida história é contada por quatro alunos, que "fazem uma brincadeira em sala de aula", e se utilizam de diversas ferramentas de estudo como réguas, transferidores de madeira, giz, prancheta, clips, quadros negros para contar, com necessária e sábia economia de personagens, a história de amor entre dois jovens. Alguém disse em recente entrevista, se não me engano na Globo News, que Julieta não passava de uma menina mimada. Concordo plenamente. Entre uma sineta e outra, entre uma aula e outra, os quatro alunos interpretam o que de melhor tem em Romeu e Julieta. E de quebra, dão um show para a platéia que, embasbacada, saboreia as atuações, no Sesc Copacabana até domingo. Infelizmente.
Recentemente vi no Roda Viva uma ótima entrevista com a critica do O Globo, Sra. Barbara Heliodora, especialista em Shakespeare, dizer que quando uma história é contada, seja ela um clássico ou uma primeira montagem, a peça atingiu seu objetivo. E eu tenho certeza que a história de R&J foi contada com todos os detalhes necessários à sua compreensão.
Com uma equipe que já trabalha há muito tempo junta, Nello Marrese no cenário, Ruy Cortez no figurino, Rafaela Amado na direção de movimento e Luiz Paulo Neném na luz, todos fazem parte desta sala de aula auxiliando, brilhantemente, aos 4 alunos a se divertirem nesta saga em nome do Amor. Destaco a incrivel utilização de clips, réguas, pranchetas, quadro negros e apetrechos de sala de aula para servirem de mais de um item, objeto, como tocha, espada, brincos, chapéu e leque. Muito legal! Muito criativo e muito bem aproveitado. Gosto muito também do figurino dupla face, separando Montéquios de Capuletos. Sábia luz que num momento único limitou uma King Size no chão e transformou duas folhas de papel em travesseiros. Tudo isto com um movimento limpo, correto e ágil. Quer saber mais? Corra para o Sesc Copacabana.
Rodrigo Pandolfo pode separar na estante espaço para um prêmio de teatro de melhor ator. E eu não costumo falhar nos meus palpites. Pablo Sanábio pode separar na estante um premio de teatro. E eu tenho acertado ultimamente nos meus chutes... Mas este premio deverá ser repartido com João Gabriel Vasconcellos e Felipe Lima. Os quatro Cavaleiros do Apocalipse, ou ainda, os quatro Mosqueteiros, ou melhor, os quatro Amigos, colegas de classe, se entregam totalmente aos seus papéis e demonstram um amor à arte que não tem preço. Certamente os ensaios devem ter sido divertidos e com um brainstorming incrivelmente produtivo. É impressionante a capacidade de entrega dos quatro atores. Aplausos em cena aberta duas vezes.
Já perdi a conta de quantas peças do João Fonsca assisti e posso garantir que vi elementos únicos que João usa com certeza de um tiro bem dado: a câmera lenta numa briga. Sempre funciona. Saí da peça pensando que João é um "tirano do bem". Os atores não param quietos um minuto sequer. Me emocionei ao abraçá-lo e receber toda a energia que emana daquele cérebro que transborda criatividade. João Fonsaca está para o Teatro Brasileiro assim como Joãozinho Trinta, e agora Paulo Barros, estão para o Carnaval. João Fonseca é hors concours. Perfeição é seu nome. E deveria receber um premio por seu conjunto de obras dirigidas e pela criatividade com que suas peças contribuem para a cena teatral brasileira.
Romeu e Julieta é, acima de tudo, uma história de amor. R&J é uma história de amor entre toda uma equipe e as profissões que exercem, do cenógrafo ao elenco, do diretor ao iluminador, do movimento de todos ao figurino, da produção ao teatro de arena.
A peça termina sua temporada domingo que vem e poucas vezes escrevo minha opinião assim de "xupeitão" ao chegar em casa depois de assistir ao espetáculo. A minha emoção e a vontade de que vocês todos corram ao teatro é muito grande. Meu amor pelo teatro me permite dizer: não percam o melhor Shakespeare deste verão.
Um comentário:
Foi sensacional!!! Confesso que achei que iria dormir no meio da peça, mas fiquei tão empolgada com tudo. No final, gostaria que ela durasse horas. A atuação dos 4 rapazes foi, realmente, brilhante. Parabéns!!!
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