quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

AS PESSOAS



A Síndrome da Cabana (ou Casulo) ficou evidente quando a pandemia deu uma trégua e os encontros voltaram com tudo. Só a ideia de ter que sair de casa depois de tanto tempo em isolamento social, enfrentar multidões, já dá taquicardia. E se eu não for?  

Porem, “dendicasa”, sozinho, com quem falar? Sozinho consigo mesmo! E a hora de desabafar sobre todos os assuntos, sem amarras, sem preocupação social, soltar o verbo, exorcizar, falar mal dos comportamentos humanos, das pessoas ao redor, do governo fascista, do vizinho reaça, falar, falar, falar.

Marcia Santos teve a ideia: uma mulher, sozinha, em casa, prestes a se mudar, rodeada de vida empacotada, propõe um desabafo consigo mesma - e com as caixas - sobre a vida, as pessoas, o país, o mundo, o comportamento. Marcia produziu um texto sólido, fluido, inteligente, cheio de referências, atual e bastante lúcido.

No palco, a cenografia de Daniel Leão compõe o espaço do apartamento em processo de mudança. Ao fundo, uma janela-quadro, com imagem de pessoas. Paulo Cesar Medeiros ilumina toda a ação com a perfeição de sempre. Wanderley Gomes assina o figurino. Marcelo Alonso Neves propõe uma bela trilha original e assina a direção musical. Sabe quem faz a valiosa preparação vocal? Jorge Maya! 

Rogério Fanju é o diretor. Sábio, deixa Marcia à vontade, porém pontua a utilização do espaço, acerta na escolha das caixas como “alguém que escuta e troca segredos”, acelera e retrai as falas no momento certo. 

Marcia Santos tem total domínio do texto e do espaço. Aproveita cada vírgula, cada nuance da palavra, para passar a informação que deseja. Sua dicção é impecável. Sem falar na sua beleza e força cênica, que deixa o público, as pessoas, hipnotizadas. Sabe tirar graça dos dramas da vida, sabe expor seu descontentamento, joga luz em questões dúbias dando à plateia a oportunidade de se reconhecer e se melhorar.

As Pessoas é um espetáculo de excelente qualidade. Todos somos as pessoas ali retratadas: os que evitam festas, adoram ficar em casa e estão “por aqui” com os absurdos do dia a dia na politica, negacionismo, preconceitos, falta de amor ao próximo. 

As Pessoas faz um recorte do mundo atual, marcando bem o momento que estamos vivendo. Desejo que fique um longo tempo em cartaz para que outras pessoas possam assistir e saírem modificadas, como eu saí. Aplausos calorosos!




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