quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O FILHO ETERNO

A velha pergunta "Por que eu?" somada ao sentimento de que "isso só acontece com os outros, comigo nunca" é o ponto de partida do livro "O Filho Eterno", sucesso de vendas há pouco tempo. Conosco nada acontece. Problemas, defeitos e acontecimentos ruins só com os outros. Muitas vezes convivi com pessoas que escondiam seus entes "queridos", por motivos mais diversos: dependência química, defeito físico, sindrome disso, síndrome daquilo. Síndrome de Down. Conheci uma menina linda com a síndrome e o carinho que ela nos dava, era sempre um presente. Pra nós. Mas a família passou algum tempo devastada pela presença daquele anjo.

Está em cartaz no Oi Futuro do Flamengo, a excelente adaptação de Bruno Lara Resende para o espetáculo baseado no livro "O Filho Eterno", de Cristóvão Tezza. A adaptação é concisa e foca nas mais variadas emoções da relação pai-filho. O pai, assim como no livro, narra em terceira pessoa, como se não fosse com ele que estivesse se passando aquela história.

A cenografia de Aurora de Campos é bastante simples e realmente é apenas o necessário. Uma cadeira e um fundo branco. Figurino de Marcelo Pies, elegante e perfeito para diferenciar o frio de Curitiba do calor do Rio de Janeiro. Inteligente também a passagem de tempo com acréscimo dos óculos ao personagem. A luz do Aurélio de Simone, como sempre criativa e competente, separa espaços, comprime a cena, divide com a platéia angustias, amplia universos, conduz o ator. Excelente! A direção musical de Lucas Mercier contribui bastante para o andamento do espetáculo.

O casamento entre a direção de movimento, de Márcia Rubin, com a direção do espetáculo, do Daniel Herz é perfeito. Se completam, se fundem, são quase a mesma coisa em cena. Um balé de tão perfeita. Daniel também conduz as falas, o timbre e o volume da voz do Charles com total segurança. Destaque para a genial cena em que o pai vai deixando de ouvir o que estão falando ao seu redor, porém é o ator quem diminui o volume de sua fala. Lindo!

E Charles Fricks? Sem duvida sua mais marcante e brilhante atuação em teatro. Uma entrega total ao personagem, com carinho, sem criticar aquele pai, entendendo a dor daquele homem, Charles dá vida com emoção e grande talento às dores, que só vamos descobrir que temos, e às conquistas, que só vamos comemorar com o tempo, daquele ser humano que não é nada no início da peça, mas se torna tudo ao final dela.

"Por que eu?", "Por que comigo?". Certamente você já se fez esta pergunta alguma vez. Lembro-me de conversar com uma faxineira do Projac e, contando minha tristeza, ela me veio com a pérola: "Por que NÃO, com você?" E a partir daí, observei que aquela tristeza era um crescimento, um aprendizado.

O Filho Eterno é obrigatório, não só pela genial, brilhante e incrível atuação do Charles Fricks, como também pela grandiosa direção do Daniel Hertz. Mas principalmente para que uma centelha de humildade e humanidade se acenda em todos nós, para que compreendamos os sinais da vida, como temos que encarar as provações e os presentes que Deus nos dá.

Mais que recomendo. Imperdivel.

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