Atualmente
estamos vendo o crescimento de uma população que antes consumia apenas o
necessário para sobreviver. Hoje têm poder de compra maior do que há 10 anos.
Televisões de plasma, ar condicionados, TVs por assinatura, viagens para
lugares nunca antes pensados. Nunca antes na história deste país viu-se tanta
oferta por geladeiras, fogões e móveis nas grandes lojas de departamento com
IPI zero. Se a estratégia dos dirigentes da nação está certa ou não, fica para
uma outra discussão. O que proponho é: basta ter tudo sem saber como usar
educadamente? Rádios transmissores aos gritos na rua, pessoas falando ao
celular como se estivessem em casa, viajantes gritando pelos corredores dos aeroportos,
amigos conversando durantes filmes e peças de teatro. De que adiante dinheiro,
sem educação? Instrução é possível, mas e a educação, onde fica? Não fica. Aqui
no Rio pelo menos, “educação” está caindo em desuso.
Graças a Deus existem formas de se protestar contra
o consumismo que vem abarrotando a nova classe emergente - junto com sua falta
de educação. Uma das melhores respostas é o espetáculo “O CARA”, que está em
cartaz no Teatro dos Quatro. A peça faz um belíssimo
registro do momento atual. Com muita ironia, humor e abusando dos jingles de anúncios,
Miguel Thiré acerta em tudo. Brinca com os comerciais mais famosos da televisão
brasileira, com o IBOPE, com a valoração do consumo e mostra o que acontece
quando o “Meu, meu, meu. Quero, quero, quero. Posso, posso, posso” chega ao
limite. No fim do espetáculo, aquilo que mais amo em teatro aconteceu
novamente: sair pensando no que assisti, com vontade de discutir o assunto à
exaustão. A pergunta que não cala é “basta ter tudo na vida?” E outra “Você não
se sente sozinho depois que conseguiu o que queria?”
Ainda Miguel Thiré assina uma direção muito
competente, rápida, rígida e eficiente para seu texto. Encaixa o necessário à
trama (um cabide, uma cadeira e um microfone) às necessidades dos personagens.
Como se tudo fosse um documentário, com depoimentos, cenas longas, flashback e
rapidinhas para acelerar a vida. Explora totalmente o palco e faz um casamento
perfeito entre o ator e a plateia. A luz e o figurino (único) estão de acordo
com a necessidade proposta pelo diretor. Belissimo trabalho de texto e direção.
Agora, pra melhorar isso tudo, temos em cena Paulo Mathias
Jr. Um ator que fica imenso no palco, embarca na onda do diretor, se deixa conduzir e cria personagens totalmente reais e diferentes. Sua expressão facial e corporal são fabulosas! Uma ousadia até.
Paulo usa mãos e pés, quase se joga de costas no palco. É um mímico, um pândego.
Interpreta e executa com perfeição as marcas e as falas. Paulo não economiza,
se entrega. Entendemos todos os fonemas. Sai exausto do seu espaço de trabalho, que domina com
perfeição. A plateia que está no teatro para receber e oferecer parceria ao
ator nem respira. Aplausos de pé.
Felizmente a nova classe emergente agora pode ir ao
teatro. Mas, infelizmente, no dia que assisti ao espetáculo, alguns representantes
desta classe não estavam a fim de se envolver com a história, mas sim gastar dinheiro, mostrar que podem consumir o teatro, ainda com a ideia de que
ir ao teatro dá status. Teatro dá cultura e conhecimento! Fiquei - e ainda
estou - pensativo sobre o consumismo, sobre o “aproveitar a vida em vez de se
dedicar exclusivamente ao trabalho”. Sobre o que se está fazendo com a nova
classe emergente. É espetáculo para ver e conversar muito depois. Fiquei muito
feliz em ver no palco esta dupla de sucesso: Paulo Mathias Jr, um ator que admiro, respeito e sou fã; e Miguel Thiré, que desde “2 pra viagem” respeito e sigo. “O CARA” é teatro
que fica. Não é descartável. É assunto atual, é vida real. Recomendo muito.
Obrigatório.
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