terça-feira, 17 de setembro de 2013

O DIA EM QUE RAPTARAM O PAPA


Éramos pequenos e fomos em fé até a Praça da Bandeira esperar o Papa passar. “A bênção, João de Deus, nosso povo te abraça. Tu vens em missão de paz. Sê bem-vindo, a abençoa a este povo que te ama”! Como percebem, ainda me lembro da música. Cantávamos em pé à espera dele. Bandeiras de papel amarelas misturadas às verde e amarelas. Veio o ônibus. Na frente, a figura de branco passou acenando pelo lado de dentro do vidro. Passou. Nos sentimos abençoados. Isso foi em 1980 e eu nem tinha 10 anos de vida! Infelizmente este ano, Papa Francisco não me viu no Rio. Estive fora, trabalhando, e acompanhei pela TV a JMJ que, se pelo lado da desordem a falta de infraestrutura nos envergonhou como cariocas, por outro lado nos encheu de alegrias como católicos e brasileiros, ao receber, tão carinhosamente, o novo Papa em sua primeira viagem internacional.

Está em cartaz no Teatro Clara Nunes a comédia “O Dia em que Raptaram o Papa”. O texto de João Bethencourt teve mais de 40 encenações pelo mundo. Precisa dizer mais alguma coisa sobre o texto? Sucesso, claro. Divertido e totalmente coerente, não falta uma explicação e tudo que se diz é sério e de ótimo gosto. As piadas atualizadas ajudam a aproximar o público da história. E nada mais atual e oportuno do que esta montagem, que estreou próximo à Jornada Mundial da Juventude.

Um taxista recebe uma bênção divina: conduzir o Papa no seu dia de folga. O que ele faz? Tem uma ideia de jerico (Pausa para amadurecimento profissional: no Nordeste, jerico é igual a mula): raptar o Papa e pedir resgate. Leva o dito cujo para sua casa, para enlouquecer sua esposa e filhos. A notícia se espalha. O mundo fica temeroso com o sumiço do pontífice. Até a eterna bola da vez Al Qaeda é acusada. O local do sequestro é descoberto. E, partir daí, surgem o Rabino, o Xerife da cidade, e o repórter contando tudo, ao vivo, para todas as televisões do mundo. O pedido de resgate é inovador e esperançoso. Será que vão conseguir liberar o Papa são e salvo? Haverá perdão pra o sequestrador? Vá ao teatro e assista até o fim.

A direção do Tadeu Aguiar é ótima! Integrando muito bem elenco, cenário, trilha sonora, ocupando com inteligência o espaço apertado do teatro Clara Nunes. Tadeu explora o talento do elenco para as frases da comédia e acerta na velocidade em que o elenco diz o texto. Comédia tem que ser rápida, mas com tempo para saborearmos as piadas. E assim Tadeu faz.

A cenografia de Edward Monteiro, em dois andares, é bastante bonita, colorida e bem acabada. Gosto dos janelões soltos no ar, nas laterais. Destaque também para os adereços de Clívia Cohen. Adorei a geladeira amarela pintada como um taxi novaiorquino. O figurino de Ney Madeira, Dani Vidal e Pati Faedo é sempre bom. Nada além do necessário para caracterizar a família judia, o rabino, o adolescente, o cardeal e o Papa e com isso acerta em cheio. O perfeito vídeo de Paulo Severo conta com Vanessa Gerbelli Ceroni e Françoise Forton interpretando âncoras de um telejornal, narrando a saga do Papa desaparecido. Tudo bem iluminado por Rogério Wiltgen.

No palco, o Papa de Rogério Fróes é mais parecido com Papa Francisco do que o antigo Bento XVI. Carismático e seguro. Marcos Breda é o divertido e atrapalhado sequestrador-taxista. Com um tempo de comédia bastante apurado, faz a plateia torcer por ele para que, no final da peça, seja feliz junto com sua família. Debora Olivieri, hilária como a esposa. Me arrancou gargalhadas! Renan Ribeiro e Sabrina Miragaia interpretam os irmãos, filhos deste pai louco, mas que amam a família e fazem tudo para ajudar a solucionar este imbróglio. Silvio Ferrari interpreta muito bem o Cardeal, exatamente como pensamos ser um deles lá no Vaticano (ok, fui irônico). E ainda temos Fabio Bianchini como o Xerife, Bruno Torquato como o repórter e Valter Rocha como o policial que, coitado, é explodido junto com o jardim da casa! Diversão pura!


Aplausos mais uma vez para os produtores Norma Thiré, Eduardo Bakr e Tadeu Aguiar. Espetáculo de excelente gosto, oportuno, bem criado, bem dirigido, que justifica os patrocínios recebidos. Além da atualidade do tema, trazer João Bethencourt para os palcos é sempre um tiro certo.  Pra você que aprecia o bom teatro, aquele que nos orgulha ver, vá já para o Teatro Clara Nunes e não perca esta oportunidade.


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