sexta-feira, 8 de outubro de 2010

MARIA DO CARITÓ

O teatro entrou em minha vida, definitivamente, em 1999 quanto fui viajar com a peça “O Casamento de Dona Baratinha” para o interior de São Paulo. À principio eu só ia operar o som durante as apresentações. Quem disse que me foi permitido executar apenas este papel? Montei cenário, contabilizei a bilheteria, paguei as pessoas, passei roupa, recebi o publico, embalei objetos nas malas... nascia um operário do teatro. Ninguém me ensinou. Eu ia fazendo. Deu certo.

Pra quem nunca ouviu esta história, uma solitária baratinha busca um parceiro para se casar, mesmo com sua idade avançada para a época. Longe de mim dizer que Dona Baratinha suborna seus pretendentes, pois tem fita no cabelo e dinheiro na caixinha, mas é bom saber que se está casando com alguém que pensa no futuro. Apesar disto, Dona Baratinha não casa nunca. Esta é a história. Os amores vão, e as amizades ficam, é o lema da peça.

Por falar em Dona Bartinha e em “como tudo começou”, estréio uma coluna de teatro no site Rio&Cultura. Lá teremos uma página com pequenos, mas nem tanto, comentários sobre a cena teatral carioca. Vou sugerir peças, comentar sobre outras, informar o que vem pela frente. Amo teatro e desejo muito que vocês também gostem de assistir.

Voltando ao assunto, Dona Baratinha é uma solteirona, de meia idade, que ainda não se casou. Opa, percebo que isto é o ponto de partida de “Maria do Caritó”, peça em cartaz no Teatro dos Quatro, com Lilia Cabral encabeçando o elenco. Em “Maria do Caritó”, a personagem que dá nome ao título é uma solteirona de meia idade, mas difere da tal Baratinha pois Maria está prometida a um santo, e, portanto, deve morrer imaculada. Pobre Maria. Faz promessas para Santo Antonio, pede ajuda a amigas, faz mandinga, e nada. A cidade acredita na santificação da Maria e cobra dela atitudes e milagres, maleficamente auxiliados pelos cambalachos dos habitantes que fazem uso da idéia dos milagres de Maria para se darem bem.

O texto de Newton Moreno é todo baseado na cultura nordestina. Desde “As Cententárias” que acompanho o trabalho deste autor e considero “Maria do Caritó” sua melhor peça. Mais rica em detalhes, furdunços, metáforas e rica no uso de expressões e comparações inusitadas. Certamente este texto será indicado para um bom premio de teatro.

O cenário do Nello Marrese é um dos melhores já criados pelo artistas. Mistura do circo com teatro, prateleiras (caritó) e elementos religiosos dão aos personagens condições para brincar em cena. Destaco o belíssimo arco móvel formado por bandeirinhas de São João. O figurino de J.C Serroni é lindo e também criativo. Em harmonia total com a cenografia, casamento perfeito. A luz de Paulo Cesar Medeiros é bonita e competente, como sempre é. Gosto da trilha sonora de Alexandre Elias que pontua e ilustra as cenas.

No palco Lilia Cabral é uma atriz que dispensa comentários. Sabe bem como interpretar este tipo nordestino, tem um carisma fenomenal e se entrega totalmente ao papel. Destaco nesta peça Dani Barros com interpretações sempre brilhantes, desta vez se supera ao interpretar a Galinha Damiana. Abraçando Lilia Cabral e Dani Barros estão os competentes Silvia Poggetti, Fernando Neves e Leopoldo Pacheco, cada um dando o máximo de si e se divertindo tanto quanto os outros.

Na direção, João Fonseca, que, desta vez, nos apresenta um trabalho voltado para um circo com atuações. Traz o circo para o palco, leva o teatro para a lona. Tudo ao mesmo tempo. Raras foram as vezes em que vi João não usar de seus costumeiros artifícios (e que sempre dão certo) para dirigir um espetáculo. Desta vez não consegui identificá-los. E isto é excelente, pois teve trabalho! E que belo trabalho. João Fonseca é um diretor que consegue inovar mesmo em linguagens pra lá de comunicativas, como o circo e o teatro. Mais uma vez, meu aplauso de pé e meu carinho.

Posto isto, indico para esta semana a peça “Maria do Caritó”. Um espetáculo que certamente irá ganhar prêmios, mas que sem sombra de duvidas irá mostrar que é possível ir ao teatro, se divertir (e muito!), refletir sobre economia, religião, política, família...

Vá e o teatro, e me chame!
Abraços,
Marcelo Aouila

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