quarta-feira, 2 de maio de 2012

Marco Nanini e Fernando Libonati abrem centro cultural em Botafogo


FONTE - O GLOBO - CRISTINA TARDÁGUILA


FOTO: LEONARDO AVERSA/AGÊNCIA O GLOBO



RIO - Doses cavalares de adrenalina circulam pelas veias de Marco Nanini e Fernando Libonati, e a exaltação tem razão de ser. Em agosto, a dupla que há 26 anos coleciona prêmios e sucessos de bilheteria à frente da produtora de teatro A Pequena Central inaugura, em Botafogo, um novo espaço cultural.

Batizado de O Reduto, o sobrado de paredes amarelas, pé-direito alto e lotação máxima de 30 pessoas foi pensado para levar Nanini e Libonati muito além do universo teatral — num passeio por artes plásticas, música e até gastronomia — e nasce com o poder de confirmar a dupla entre os produtores culturais mais ativos do Rio. Tudo isso, é claro, gera muita, muita ansiedade.

— O primeiro evento d’O Reduto será uma mostra de artes visuais — adianta Nanini, com um sorriso largo. — Os artistas plásticos Analu Prestes, Antônio Guedes, Leo Battistelli e Marcelo Jácome ocuparão a casa por dez dias seguidos, um de cada vez, e, enquanto estiverem por lá, serão os programadores do espaço, além de os responsáveis por tudo o que vai acontecer durante sua estadia.

— Queremos dar aos artistas a oportunidade de trabalharem também como curadores — completa Libonati. — Eles decidirão o que será exibido no salão principal, no subsolo e até na cozinha d’O Reduto, que poderá oferecer refeições com cardápios bacanas nos fins de semana.
Vem aí o Teatro do Bairro

Analu Prestes trabalhará em torno de três ideias: o tempo, a vida e a morte. Durante sua estadia na casa, vai garimpar folhas, frutos e flores para montar composições e, depois, fotografá-las. Antonio Guedes terá como tema o momento em que a rua invade a casa, fazendo um trabalho em torno da moda e dos figurinos. 

O argentino Leo Battistelli vai expor peças de cerâmica resgatadas na região serrana do Rio após a inundação de janeiro de 2011, e Marcelo Jácome fará duas instalações: uma com pipas de papel de seda e outra com linhas.

Para que O Reduto siga à risca a filosofia que A Pequena Central vem adotando em seus projetos nos últimos anos — a de "espalhar cultura por toda a cidade" —, os artistas que passarem por lá deverão, logo depois, ter um momento de convivência no Centro Hélio Oiticica, no Centro da cidade, e, em seguida, migrar para o Galpão Gamboa, espaço que Nanini e Libonati mantêm aberto na Zona Portuária desde 2008.

— Queremos fazer com que a arte circule pela cidade — diz Nanini. — E a ideia é estabelecer uma ponte entre o que fazemos em Botafogo e o que levamos para o Gamboa.

Há quatro anos, o Galpão Gamboa, que funciona por trás de um chamativo portão vermelho, oferece, por meio das artes e dos esportes, oportunidades de formação e inclusão social para os moradores das comunidades carentes e dos bairros da região. Em agosto de 2010, Nanini e Libonati inauguraram ali um teatro com uma política de preços acessíveis — R$ 5 para quem residir nas redondezas. Assim, vêm conseguindo formar um público local fiel e ter a casa sempre lotada. Segundo eles, nos últimos espetáculos, os moradores da região representaram ao menos 40% dos cerca de 80 lugares de cada sessão.

— Detectamos que ali existe interesse e demanda pela cultura e que nós temos que construir as oportunidades — destaca Nanini. — Vai ser ótimo levar artes plásticas para lá.

— E esse caminho que adotamos está alinhado com a política cultural vigente na cidade, no estado e também no país — diz Libonati. — Queremos democratizar a cultura. Queremos que as pessoas não tenham medo de ir aos centros culturais. Queremos chegar perto delas, deixá-las mais à vontade conosco, fazer com que queiram ir a um espaço determinado e que saibam que ali sempre haverá algo de qualidade para ser visto.

Depois da mostra de artes plásticas, O Reduto abrigará uma programação de teatro de câmara. Na lista de monólogos e diálogos selecionados aparecem, entre outros, "Ato de comunhão", de Gilberto Gawronski, "Sonhos para vestir", de Vera Holtz, "Produto", de Marcelo Aquino, e "Inglaterra — versão brasileira", de Bel Garcia.

— As temporadas serão bem curtas — avisa Nanini. — No máximo dois meses para cada peça. Este é o embrião do projeto Teatro no Bairro, que A Pequena Central pretende levar adiante no segundo semestre.
Segundo Libonati, entre agosto e setembro, o novo monólogo de Nanini — "A arte e a maneira de abordar seu chefe para pedir um aumento", de George Perec, com direção de Guel Arraes — vai passar por ao menos sete bairros:

— Vamos ao Teatro Armando Gonzaga, em Marechal Hermes, ao novo Imperator, no Méier, ao Teatro Gláucio Gil, em Copacabana, ao Teatro Ipanema, ao Sergio Porto, no Humaitá, ao Ziembinski, na Tijuca e, é claro, ao Galpão Gamboa.

Nanini adianta que a peça conta a história de um personagem que cria um gigantesco organograma mental em que prevê todos os caminhos possíveis para pleitear um aumento.

— Não se trata de um teatro convencional. Não tenho ambições comerciais e não vou competir com ninguém fazendo ele. Vai servir, sobretudo, para eu me reciclar — diz o ator. — É um texto tragicômico com frases muito parecidas e que serve como teste para manter a atenção do espectador.

Enquanto a esperada estreia não chega, Nanini se preocupa mesmo com o casarão amarelo. Numa visita ao espaço, ele brada frases como "Esse bar precisa de uma passagem!", "Vamos derrubar o muro que separa essa casa d’A Pequena Central" e "Esse porão aqui bem iluminado vai ser palco de performances incríveis!".

Libonati, por sua vez, pensa na programação do Gamboa:

— Assim que acabar o Rota Gamboa (programação multicultural que já levou à Zona Portuária espetáculos como "Os mamutes", de Inez Vianna), retomaremos o Gamboavista. A segunda edição do evento terá 14 semanas e deve virar nosso programa de verão. Depois, o galpão terá seu primeiro espetáculo de dança!
No projeto Dança Gamboa, que terá curadoria de Marcia Rubin, estão listadas 14 companhias — seis consagradas (Lia Rodrigues e Marcia Milhazes, entre outras), quatro iniciantes e quatro infantis. As primeiras apresentações acontecem em abril de 2013.

— A Pequena Central está feliz por poder arcar com todos os custos desses espaços e por jogar limpo com os atores — diz Nanini, questionado sobre qual é o maior obstáculo como produtor cultural. — Mas não podemos pedir que os artistas trabalhem de graça. Então estamos, como muitos outros, aguardando os editais.

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