Felicidade incomoda. Uma pesquisa recente mostrou que
pessoas ficam com inveja e raiva de posts de amigos nas redes sociais. Algumas pessoas são felizes por nada. Por nada, não. Por tudo. Conheço gente que
ama a vida profissional que tem. Ao ponto de não precisarem de um amor de
verdade, um "outro", para suprirem suas carências, visto que a felicidade consigo mesmo, o
auto reconhecimento, é tanta, que a pessoa é feliz e pronto. Muitos vão dizer
que a dedicação extrema ao trabalho é fuga do amor. Não acho. Pra mim, tem
gente que veio nesta encarnação pra trabalhar, outros para resolver
problemas amorosos. Faço parte dos que vieram para trabalhar e, por isto, sou
feliz. Às vezes, feliz por nada. Ao mesmo tempo, por tudo que conquistei, que
me proporcionei, que ofereci aos próximos. Nasci para produzir cultura e
oferecer, se possível de graça, shows, teatro, eventos literários e exposições
para quem não tem acesso. Sou feliz.
Partindo do princípio que AMO Martha Medeiros, fã de
carteirinha mesmo, seguidor, leio sempre suas crônicas aos domingos, tenho
muitos dos seus livros, alguns até autografados, e já tive o privilégio de
jantar com a presença da Martha na mesma mesa. Um prazer! Sua lucidez e
capacidade de dizer coisas sobre o dia a dia, que muitas vezes não sabemos como
falar, mas ela consegue dizer. E é isso que me encanta.
Em cartaz no Teatro das Artes, a peça “Feliz por nada”.
Tendo por base o livro de Martha Medeiros, Regiana Antonini faz uma adaptação
excelente do livro para o palco. Fluente e segura, criou uma peça com diálogos rápidos e sinceros,
pequenos monólogos explicativos, na medida certa, e a condução para um final de acordo
com o que esperamos que seja.
Duas mulheres: uma casada, infeliz, mas com marido. A outra
independente. Feliz, mas sem marido. A casada, reclama que não alcançou nada na
vida. Viveu para os outros. A feliz, diz que lhe falta um companheiro, mas
mesmo assim é uma mulher feliz. Por nada. Questões sobre a busca de uma vida própria
e a busca de um parceiro ideal é o caminho do espetáculo. Claro que uma
situação importante na peça gera todo o clímax capaz de deixar as duas mulheres
à beira de um precipício sobre a felicidade que buscam.
A direção de Ernesto Píccolo é muito interessante. Optando
por dar valor à palavra, conduz os atores por um palco vazio, porém nem
sentimos a necessidade de cenário. A interpretação fala mais alto. E é nisso
que eu acredito para um bom teatro: texto, palavra e ator. Como cenógrafo,
jamais poderia dizer a frase acima, mas têm peças que não precisam de cenário e
Feliz Por Nada é dessas. Píccolo é genial neste tipo de espetáculo e, neste
terceiro texto de Martha Medeiros em suas mãos, tem um domínio total de cada
frase e posicionamento em cena do elenco.
O figurino de Helena Araújo é bonito pra caramba e está 100%
de acordo com as características das personagens. A luz de Aurélio de Simoni
facilita a compreensão dos ambientes e ilustra os curtos monólogos. A trilha do
Rodrigo Penna é sempre genial.
No palco, Cristiana Oliveira e Luiza Thiré duelam pela
melhor interpretação, mas não há guerra. Há cumplicidade e parceria. Ambas
estão excelentes e lindas em cena. As falas, o texto, é dito com verdade e nos
convencem desde o primeiro entrar em cena. Aplausos de pé. Certamente duas das
melhores interpretações de teatro de 2013. Gil Hernandez, também muito bem em
cena, é o marido que dá a liga entre as histórias das duas mulheres. Mas a peça
é delas. É um texto para mostrar a cumplicidade feminina e esta informação nos
é passada com respeito e competência.
Aplausos para Rogério Fabiano que teve a brilhante sacada de
levar este texto ao teatro, valorizando os atores, a palavra, o livro, a língua
portuguesa, e a questão da felicidade nos dias de hoje. Não perca, vá já pro
teatro.
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