Se tem uma arte que me faz voltar a ser criança é o Circo.
Desde pequeno íamos muito assistir aos que chegavam no Rio e se instalavam na
Praça Onze. Agora estão na Barra e fica difícil de ir até lá. Desde a primeira
vinda do Cirque du Soléil assisti a todas as apresentações. Ali estão reunidos artistas
que, usando de sua excelente forma física, equilíbrio, desprendimento quanto
aos medos de altura, animais e de morte, fazem tudo para divertir a plateia. Me
excita também a arte de mambembar. Cada período em uma cidade. Plateias novas,
rosto novos.
Sou completamente apaixonado por palhaços. Coleciono em
casa. E tenho um sonho, que nunca contei a ninguém, mas que agora será
revelado: quando eu tiver 60 anos, vou procurar um circo e fugirei com ele
sendo um dos palhaços. Já até vi o preço na Escola Nacional do Circo, do preço
do curso de palhaço. Afinal, toda arte merece estudo!
Entre as comemorações dos 70 anos de Chico Buarque, a
produtora Primeira Página traz ao Rio “O Grande Circo Místico” em formato de
teatro musical, no Theatro Net Rio (Como é gostoso estar no Theatro Net Rio!).
Newton Moreno e Alessandro Toller nos contam uma história de amor entre um espectador
e uma integrante de trupe, a bailarina. Soma-se à trama uma invejosa noiva, a
guerra que os separa e todo um circo com cavalos, leão, mulher barbada,
trapezistas e malabaristas. Tudo isso regado com músicas de Edu Lobo e Chico
Buarque. Quer coisa melhor?
João Fonseca, o meu diretor favorito (não escondo...),
coloca toda a sua marca no espetáculo. Bom humor, inteligência, competência e
criatividade. Destaque para a queda da bailarina do cavalo, as cenas da guerra,
a condução da trama, a reunião de todos os integrantes da “trupe” no fim da
peça cantando à capela. Tudo de bom gosto e emoção. João se cercou de uma
equipe competente. A direção musical e os músicos, a coreografia, a direção de
movimentos circenses, toda a extensa equipe merece aplausos.
O cenário do Nello Marrese é um achado! Lindo, criativo,
funcional, prático e eficiente. Suas soluções para o circo, enfermaria, a
cidade ao fundo, a corda bamba de arame farpado, as caixas-relicários-armários,
tudo harmônico, bem construído e o necessário para contar a história. E a
surpresa das filhas gêmeas no final da peça? Prêmio Shell já! O figurino de
Carol Lobato também competente, colorido quando tem que ser e sóbrio nos
momentos da guerra. Luz do Nenén (tive o prazer de trabalhar com ele recentemente)
é criativa e bonita.
Os atores estão muito bem selecionados e o conjunto faz um belo
trabalho. Ótimos momentos são as músicas cantadas à capela por Fernando Eiras,
a mulher barbada de Ana Baird, o solo da música Beatriz de Gabriel Stauffer (que,
aliás, emocionou a plateia todas as vezes que entrou no palco com sua verdade
cênica), a voz e a beleza da bailarina Letícia Colin, a inveja da mulher não
amada na pele de Isabel Lobo e a composição de Lily Browun feita por Paula
Flaiban. Gosto também dos personagens de Marcelo Nogueira e Felipe Habib (que,
se não me engano, faz o palhaço que abre o espetáculo). Ainda no elenco, Renan Mattos,
Thadeu Torres, Leonardo Senna, Juliana Medella, Leo Abel, Natasha Jascalevich,
Douglas Ramalho e Luciana Pandolfo.
Mas tenho que destacar o palhaço de Reiner Tenente. Não
existem adjetivos que possam aplaudir seu trabalho nesta peça. Uma entrega ao
personagem. Ele é “O” palhaço. Dos melhores palhaços que o circo já viu.
Apaixonado pela Bailarina, entende o amor da mocinha pelo visitante e se
conforma em ter a amizade (outra forma de amor) da sua amada. Destaca-se nas
cenas da guerra, enfrenta os problemas da trupe, anima quando é chamado a exercitar
sua arte. Canta bem pra caramba. É o grande personagem da peça, sem desmerecer
os protagonistas. Reiner Tenente compôs um palhaço, Clown, digno de prêmio. Aguarde,
garoto, chegará.
Ouvir “Ciranda da Bailarina”, “A História de Lily Brown” e “Beatriz”
num musical de teatro era um dos meus sonhos. Ontem, assistindo à peça, me
realizei por vários motivos. Circo, músicas, elenco, palhaços. Voltei a ser
criança, mergulhei neste circo e aplaudi de pé e emocionado o final do
espetáculo. É difícil, depois de assistir a tantas peças de teatro (em média
vou a 2 por semana), não achar tudo já visto, mas em O Grande Circo Místico me desliguei
de tudo que já vi e me entreguei à história. É o teatro bem feito, com paixão e
vontade de acertar e agradar ao público. Bela homenagem a Chico Buarque, belo
trabalho de equipe. Obrigado pela excelente apresentação de ontem. Aplausos de
pé.
Nenhum comentário:
Postar um comentário