Minha relação com futebol é abaixo de zero. Não entendo, não
gosto, não assisto, mas não julgo quem goste. Só não me peçam para tirar a
bandeira do Flamengo da parede, porque este amor não se explica. Uma vez Flamengo,
sempre Flamengo.
Ouvi dizer que o Museu do Futebol, no interior das
arquibancadas do Pacaembú, em São Paulo, era imperdível. Fui conferir e,
realmente, é incrível. Ali, no museu, está tudo relacionado ao futebol para
quem gosta e para que não aprecia muito. As Copas, os times, flâmulas, bolas,
jogadas, locutores, a torcida, personalidades, escritores, música, a televisão
e fotos da época. Tudo contextualizado. Impossível não amar este museu vivo da
história do futebol brasileiro. Recomendo a visita.
Neste “Pós-Copa”, enquanto a vida volta ao normal, os
teatros, aos poucos, voltam a receber público, bem como as salas de cinema, os
shows nas melhores casas do ramo e as livrarias. A rotina nos traz para a dura realidade
das obras inacabadas. Imagina na Copa? De 2018? Voltei aos palcos cariocas para
me atualizar das rodinhas de conversas dos amigos artistas. E fui surpreendido
pelo musical “Samba Futebol Clube”, em cartaz para uma curta temporada no
Teatro Carlos Gomes.
Com roteiro e direção de Gustavo Gasparani, expert em pesquisas sobre
comportamentos, textos e música que marcaram a vida carioca do último século, reunir
num espetáculo textos e músicas sobre futebol, no período Copa e Pós-Copa, é
muito oportuno. Gasparani, que vem de sucessos como “Opereta Carioca”, “Oui Oui
a França é Aqui” e “As Mimosas da Praça Tiradentes”, percebeu, durante a
pesquisa para a primeira delas, que material não lhe faltava para tantos outros
espetáculos e compilou sabiamente os três espetáculos e ainda sobrou material
para este! O casamento entre as crônicas dos jornais, por colunistas
apaixonados, acrescidas de marchinhas e canções com tema futebol, é perfeito e construído
de maneira impecável. Não bastava apenas colocar as músicas e os textos em uma
ordem aleatória, o bom (e o que foi feito) era achar uma ligação entre este
material, e o resultado apresentado é positivo.
Sabiamente, Gasparani, com tudo na cabeça, reuniu uma equipe
competente que embarcou na proposta de atores-cantores-músicos, onde tudo é
feito em cena, às vistas do público. Troca de objetos de cenário,
interpretação, instrumentação. Os atores, ora são coro, ora músicos, ora
protagonistas, sem nenhum deles deixar de ter seu momento de estrelato. Um
trabalho impecável de direção.
Na equipe técnica, uma time de primeiro: cenografia de
Marcelo Lipiani, com apoio dos vídeos de Thiago Stauffer (onde até os jogos
eletrônicos estão ali representados); o figurino de Marcelo Olinto, colorido e
explorando as combinações das cores dos times, sem privilegiar nenhum deles; a
luz de Paulo Cesar Medeiros, que tira partido deste teatro fantástico; e a
direção de movimento de Renato Vieira que auxilia e acrescenta ao diretor,
fazendo os atores apresentar um trabalho completo em cena. Aplausos também para
Nando Duarte, diretor musical, que construiu a parte das músicas junto com os
atores e direção. Trabalho de conjunto excelente.
O elenco, formado por Alan Rocha, Cristiano Gualda, Daniel
Carneiro, Gabriel Manita, Jonas Hammar, Luiz Nicolau, Pedro Lima e Rodrigo
Lima, dá um show de bola, talento, interpretação e voz no palco. Não há
protagonista, todos são explorados e são coadjuvantes do Futebol. Todos são
competentes e estão em harmonia. Um trabalho de entrega ao espetáculo,
valorizando os textos, a pesquisa e as músicas. É excelente a dedicação de
todos para que tenhamos um visual, uma sonoridade e uma fluência. A plateia, e
a equipe, certamente ficam atônitos e totalmente ligados no espetáculo.
Realmente, são um time. Como no futebol.
Há muito escutava as expressões “cultura do futebol” e “futebol
também é cultura”, mas, até conhecer o Museu do Futebol, nunca tinha me ligado
nesta junção entre arte e esporte. O Museu me mostrou a necessidade e a
importância deste casamento. Porém, foi somente ao assistir ao musical Samba
Futebol Clube, que pude compreender, e concordar, com a importância de se
mostrar o futebol também como cultura e dar valor à cultura deste esporte. Assim
como no Museu do Futebol, este musical é necessário para avaliar a importância
do futebol na vida de todos nós, mesmo aqueles que não têm tanta intimidade
assim com o a bola nos pés. Samba Futebol Clube é um braço, uma espécie de
Museu do Futebol vivo, e ao vivo, voltado para o teatro. Imperdível.
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