Martins Pena nasceu no Rio em novembro de 1815. Portanto,
este ano comemoramos seu bicentenário. É inacreditável a atualidade de seus
textos. Com ironia e humor, as graças e desgraças da sociedade brasileira e das
nossas instituições ainda estão aqui entre nós. Desde o simples falsificar de
notas, ao “molhar a mão de um guarda”, namorar dois ou três ao mesmo tempo,
enganar por causa do dinheiro... estamos na mesma. Martins Pena ainda está
presente entre nós!
Em cartaz no Teatro Poeira, O Pena Carioca, primeiro
clássico nacional montado pela Cia Atores de Laura, nos traz três bons exemplos
do brilhantismo de Martins Pena. Como curiosidade, entre os anos de 1844 e
1846, nada mais, nada menos, que 17 espetáculos seus foram encenados. Em O Pena
Carioca, “A Família e a Festa na Roça”, “O Caixeiro da Taverna” e “Judas em
Sábado de Aleluia” ilustram a obra do escritor, que é Patrono da cadeira 29 da Academia
Brasileira de Letras, escolhido pelo teatrólogo Artur de Azevedo. Ou seja, não
é pouca coisa não!
Além do humor e do retrato da sociedade, observamos alguns elos
entre as peças. Um deles é que tudo se justifica em nome do amor. E quando o
assunto acontece dentro das famílias, é furdunço certo. Na primeira peça curta
apresentada, um jovem retorna à cidade depois de formado em medicina e, junto
com a filha do fazendeiro, tramam para ficarem juntos. Na segunda, o ambicioso Caixeiro
trama casar-se com a dona do estabelecimento onde já trabalha para virar sócio
e viver feliz da vida com sua outra mulher! Na terceira história, o mocinho
tem-se que passar por Judas a ser espancado no Sábado de Aleluia para escapar
do pai-policial da moça, mas descobre falsificação de dinheiro, corrupção e que
a menina é mais rodada que disco de vinil dos anos 80!
O cenário de Fernando Mello da Costa faz uma homenagem aos
muitos personagens de Martins Pena, e os bonecos-manequins estão ali servindo
de côro, biombo, cabide e figurantes. O figurino de Antônio Guedes é muito
bonito e bem confeccionado, totalmente adequado para as cenas e de excelente
qualidade. A iluminação de Aurélio de Simone é muito bonita, destaque para a
cena final. A trilha sonora de Leandro Castrilho completa todo o clima de humor.
Os Atores de Laura, aqui quase completos, são Ana Paula
Secco, hilária até não poder mais; Gabriela Rosas (atriz convidada pela Cia para
esta montagem), ótima em todas as mocinhas; Anderson Mello, o pai fazendeiro fácil
de ser enganado; Leandro Castilhos, ótimo como o mocinho-espantalho; Luiz André
Alvim, mostrando sua versatilidade entre o médico-mocinho e o pai-policial;
Marcio Fonseca, muito bem como policial e do pretendente da dona do
estabelecimento; e Paulo Hamilton, igualmente hilário como a vidente espanhola,
o caixeiro e o velho corrupto. Todos, sem medo de errar, estão ótimos. Bem
dirigidos, confiantes e certos de que estão realizando um trabalho honesto e
digno.
Daniel Herz dirige este espetáculo usando toda sua
criatividade na expressão corporal dos atores – que até parapeito de janela eles
viram! – e, principalmente, dando atenção à palavra, aos ótimos textos Martins
Pena. É bastante acertada as inclusões, entre as cenas, de pequenas frases
contidas em vários textos de Martins Pena, o que mostra a atualidade de seus
personagens e a última frase do espetáculo, onde o próprio Martins Pena declara
seu amor ao teatro.
O Pena Carioca é mais um trabalho excelente dos Atores de Laura que merece ser visto por todos que gostam do teatro, pois Martins Pena, que é muito pouco encenado no Rio, escreveu sobre a sociedade carioca, cidade onde vivemos, e merece nossa reverência pelo seu bicentenário. Viva Martins Pena e os Atores de Laura!
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