Raul Seixas já cantou ”Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade.”
Evelyn Castro tinha um sonho: fazer uma peça em homenagem a Tina Turner. Chamou João Fonseca pra dirigir. Kacau Gomes tinha um sonho: fazer um tributo a Tina Turner. Chamou João Fonseca pra dirigir. Não. Eu não repeti a frase. Eram sonhos idênticos, mesmo diretor. João contou pra Kacau que Evelyn tinha feito a mesma proposta a ele. Banho de água fria? Jamais. Uma ligou pra outra e... Vamos fazer juntas esse sonho? Assim nasceu “Quebrando Regras”, tributo a Tina Turner, que estreou no Teatro Clara Nunes.
Stella Maria Rodrigues escreveu a história que conta o desespero de duas fãs para entrar no show que Tina Turner está fazendo no Maracanã, em 1988. Além das vidas das duas se cruzarem no portão, naquela realização frustrada de um sonho, Stella conta um pouco da história de glória, comédia e tragédia da “rainha do rock internacional” da época, e nos dá um pitaco sobre a vida brasileira, com jingles de comerciais, comportamento e política. Um texto hábil e conciso, escrito por alguém que sabe muito de musicais.
João Fonseca, imprime a sua marca desde a escolha da equipe de sucesso – cenário ótimo do Nello Marrese simulando a entrada do Maracanã com estátua de Bellini, as colunas e o gradil; figurino do Marcelo Marques totalmente de acordo com a época e homenageando a cantora tema; visagismo do Beto Carramanhos que nos faz lembrar da Tina Turner sem apagar as expressões das atrizes; luz do sempre ótimo Paulo Cesar Medeiros; e as divertidas coreografias do Alex Neoral (que nos lembra as dancinhas de Tina e o que fazíamos na pista de dança da época!) – até seu desenho do espetáculo, alternando números musicais, comédia e “momento mensagem para pensar em casa”. Adoro a cena em que as duas fãs contam parte de suas vidas amparadas em duas músicas extremamente fortes de Tina Turner. Gosto muito de ver Bellini se transformar em repórter. João sabe que tem duas divas dos musicais nas mãos, ambas ávidas em homenagear Tina Turner e deixa as atrizes, embora marcadíssimas, livres e unidas para contar a história.
Todo musical precisa de duas coisas importantes: boas vozes e ótimos músicos. Tony Luchesi assina a direção musical com sabedoria, pois usa os arranjos de sucesso das músicas de Tina Turner, que temos no inconsciente, e se apropria das vozes das duas cantoras-atrizes para dar um pouco mais do que só canto: a interpretação das canções.
Evely Castro e Kacau Gomes. Kacau Gomes e Evelyn Castro. Sonho que se sonha só... é um sonho só. As duas sonharam e estão juntas. Evelyn tem uma timbre mais parecido com Tina Turner. Kacau tem uma extensão vocal inacreditável! Evelyn tem o gestual de Tina na veia. Kacau tem a emoção te Tina à flor da pele. Evelyn e Kacau estão unidas, fortes, seguras e inteiras em cena. Uma dupla que entendeu que a união faz, sim, a força. Sonho que se sonha junto, é realidade. Saulo Segreto interpreta todos os personagens masculinos. Sua presença é carismática e divertida. Ele sabe que as duas atrizes ao seu lado são divas e ele reverencia ambas com sua competência e generosidade de colega.
A equipe de “Quebrando Regras” se empresta, se doa, se entrega a este musical que chega em ótima hora. Momento em que o público está sumindo e o patrocínio minguando, mostrando que a cultura e a qualidade da cena teatral carioca jamais irá morrer. Este espetáculo nos serve de lição: juntem-se. Formem grupos com pessoas que estejam dispostas a seguir uma caminhada com amor e suporte. O trajeto será mais curto e a viagem menos dolorosa.
Quem não se lembra da Regina Casé como Tina Pepper da novela Cambalacho? “Você me incendeia, meu corpo serpenteia. E me deixa louca, com água na boca...”. Foi com muita água na boca que saí do teatro. Vontade de assistir de novo e cantar várias vezes Tina Turner. Tenho certeza que Tina Turner está muito bem homenageada. Espetáculo obrigatório!
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