Bill, Golden Retriever de uma ninhada de 9 filhotes, chegou em agosto de 2004, mas nunca dormiu na cama. Se latiu dez vezes ao todo foi muito. Varria-se um cachorro extra de pelos todos os dias. Era amável, falava com os olhos, um lord. Se comunicava com todos de maneira elegante, um príncipe. Bill subia no sofá e se alocava entre as pessoas, se achava um mini toy, mas era maior que um adolescente subnutrido. Se reclamou de dores foi aos 15 anos, quando a coluna já dava sinais de exaustão. E nos deixou em março deste ano, dormindo no chão da sala. Quando cheguei para dar o último adeus, ele ainda estava quente. Obrigado pelo amor incondicional e até breve, Bill.
A comédia Sylvia, em cartaz no Teatro Petrorio das Artes (Shopping da Gávea), é adaptação de Simone Zucato para texto de A.R. Gurney. Manchete de jornal sensacionalista: “Marido bem sucedido pega cachorra (o animal!) em parque, leva pra casa e causa ciúmes na esposa”. A relação da novata com seu dono muda a relação familiar, profissional e pessoal do homem. Mas... seria Sylvia apenas estopim para problemas acumulados? Insatisfação no trabalho, ausência dos filhos, rotina do casamento? Além das questões, a peça propõe uma reflexão sobre como as pessoas tratam seus animais domésticos como filhos. Quem se lembra de Françoise Forton no brilhante papel de Meg Trajano e a sua cadelinha pug, Inès, na novela Por Amor?
No palco, o ótimo cenário de Camila Schimtz ora é parque, ora é casa. O figurino é do craque Marcelo Marques, luz bonita e eficiente de Wagner Freire, direção de movimento de Sueli Guerra e trilha sonora de Daniel Maia, que capricha nas escolhas de músicas com tema. Até “Dog Days Are Over” está lá!
Gustavo Wabner é o diretor da peça e consegue captar o que de melhor cada ator tem a oferecer ao público, não faz economia de boas marcas e limpa a cena sempre que tem conflito. Gustavo valoriza os momentos de extremo humor e reflexão. Além disso, na cena da psicóloga, mesmo em tom de humor, Gustavo ilumina informações relevantes sobre as relações humanas, fuga, evitação, desgaste. Os personagens se mostram muito reais.
O elenco, diferente de São Paulo, tem Claudia Ventura (em SP era Françoise Forton) e Alexandre Dantas (em SP era Cassio Scapin) nos papeis de esposa e marido. Casados na vida real, a sintonia dos dois em cena é imensa. A verve cômica e a afinação musical de Claudia Ventura dão lugar a uma interpretação segura de uma esposa, Kate, que tenta resgatar seu marido perdido para a cachorra (o animal!). Alexandre Dantas é Greg, o confuso marido que se perde no amor pelo animalzinho, transferindo as frustrações e descobrindo novos caminhos de vida. Ótimos, como sempre. Simone Zucato acumulando as funções de produtora, tradutora e Sylvia é uma beleza em cena. Acerta no tom e na medida em que sabe que a cachorra é o ponto de ligação entre as questões da peça.
Rodrigo Fagundes se alterna entre Tom, o amigo do parque que sabe tudo sobre cachorros, Sônia a amiga descompensada de Kate, e Nadir, a(o) psicólogo(a) que deixa o paciente decidir se ele(ela) é homem ou mulher. A presença de Rodrigo Fagundes em cena é um deleite para os deuses do teatro e para o público. Só a sua entrada em cena já faz a plateia prestar atenção, pois sabe que vem coisa! A cena de Sônia com Kate é hilária. Impossível segurar a gargalhada. Rodrigo se destaca pela versatilidade, tom de voz, presença cênica, verdade e compromisso com o humor.
Sylvia traz para os palcos cariocas reflexão com humor. A sensibilidade de toda a equipe, a competência dos atores e direção, faz desta comédia romântica um espetáculo leve e divertido mas que tem a emoção e a reflexão apresentadas para que saiamos do teatro pensando nas relações, nos animais de estimação e, principalmente, como estamos valorizando as pessoas que nos cercam. A gargalhada é garantida. Não perca a comédia Sylva. Viva o teatro!!
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