quinta-feira, 8 de junho de 2023

MEUS DOIS PAIS


É como diz Fábio Jr... “Pai, pode ser que daqui algum tempo haja tempo pra gente ser mais, muito mais que dois grandes amigos, pai e filho talvez...” e assim segue a canção que faz qualquer um chorar. Quem ainda tem pai ou já teve, sabe que a relação nem sempre é das mais bonitas, mas quando acontece de existir um pai-amigo de verdade, aí é só alegria. E aqui temos Pedro Monteiro, aquele pai-exemplo. Explico os motivos.

Recentemente ele levou ao cinema o documentário “Primeiro Ano”, que conta e mostra os primeiros 365 dias de vida – e alguns mais – de sua filha Pilar, fruto do amor com Gabriela Estevão. O filme é uma delícia. Acompanhamos o desenrolar de uma pandemia, o sufoco, o medo, o crescimento solitário da menina sob os cuidados da mãe e do pai. 

Soma-se a isto os recentes trabalhos realizados por Pedro cuja temática é justamente o ato e o efeito de ser pai. Tem o pai fujão e arrependido, tem o pai que faz de tudo pelos filhos mesmo estando preso e, agora, um pai mais moderno – diante dos olhos da sociedade careta. Uma trilogia que começa com “Pão e Circo”, uma peça-filme que mistura futebol e paternidade. Em seguida, já no teatro presencial, “Pai Ilegal”, cujo pai preso se desdobra para sair da cadeia e voltar pra filha. Completando a sequência, Pedro Monteiro nos traz “Meus 2 Pais”, que é mais que teatro, é ensinamento, educação e realidade.

Está em cartaz no Teatro Oi Futuro, no Flamengo, este espetáculo, com texto de Walcyr Carrasco, o mestre das novelas e de peças de teatro de qualidade. Walcyr fala o necessário. Explica quando precisa, toca o dedo na ferida quando se chega ao clímax e, mais que tudo, apresenta um diálogo que faz o público pensar. Tanto para as crianças – público alvo deste trabalho – quando aos adultos. Assistimos a história de um garoto que se descobre filho de dois homens que moram juntos e se amam. Ele sofre com os preconceitos dos colegas e familiares. Mas, graças ao amor e ao DNA desta nova geração de crianças, ele dá um baile nisto tudo e prova que as crianças ensinam muito mais aos adultos do que o inverso.

No palco, temos o cenário de Beli Araújo, duas telas grandes que podem também ser balões de falas de uma história em quadrinhos e, ao chão, círculos coloridos de carpete. Uma cadeira de gamer auxilia os movimentos. No telão, a excelente projeção mapeada de Renato Krueger, nos traz elementos de vídeo-game, que fala direto com as crianças, e as participações em vídeo dos demais personagens. Marcelo Olinto assina o figurino que transforma um adulto em um garoto. Tudo isto sabiamente iluminado pela craque Ana Luzia de Simoni. Cabe destacar a contribuição de Carol Ozório na direção de movimento, pois temos em cena um garoto brincando com as telas ao mesmo tempo que conta uma história ao público. É uma séria brincadeira no palco e isto aproxima ainda mais as crianças do tema da peça. Completando a parte criativa, André Poyart assina uma trilha sonora divertida, marcante e que também fala a língua dos games e das crianças.

Além de Pedro Monteiro, temos no elenco as generosas, talentosas e divertidas participações, em vídeo, de Betina Viany (como a avó conservadora), Cláudio Lins (como um dos dois pais), Gabriela Estevão (a coleguinha da escola), Kelzy Ecard (a mãe parceira), Rodrigo França (o outro dos dois pais) e Tamires Nascimento (também colega de escola).

Mestre Cesar Augusto, da CIA dos Atores, conduz o espetáculo com sabedoria e focado no objetivo de falar sobre o tema com as crianças. De quebra ele atinge os corações e mentes dos adultos mais presos às convenções sociais e aos preconceitos. Cesar Augusto usa da linguagem corporal e falada para esclarecer dúvidas, oferecer argumentos àqueles que querem contar sua experiência aos filhos, mas não sabem como; desenha um espetáculo calmo, apesar de movimentado, mas sem a pressa do atropelo de palavras. Aqui a peça é falada para que todos entendam tudo que está sendo dito. E o resultado é mais que excelente. 

A cabeça disto tudo é ruiva: Pedro Monteiro. Certeiro, atual e moderno, com este espetáculo faz um trabalho belíssimo de educação, ensinamento, misturado à arte cênica. Sabe quando se está na sala da psicóloga e ela encena com você uma situação para te dar força, segurança ou aliviar uma dor? É isto que Pedro faz no palco. Ele representa uma situação aparentemente delicada e mostra os caminhos possíveis de conversa, de acolhimento, de verdade, de novos tipos de família, de modernidade comportamental. Pedro “desenha” através da encenação como é a dor, a descoberta, o amor, a aceitação. É aula, é educação, é teatro, é vida. Pedro se transforma em um menino, sem perder sua maturidade. Vira criança na sua arte de representar e brinca com palavras e cenário. Educa adultos olhando no fundo do olho e cantando um funk/rap cheio de ironias com o público.

Dani Carvalho é a diretora de produção, que acerta no cuidado do espetáculo, no tema abordado com seriedade e que sabe trabalhar com qualquer público para que mais e mais pessoas assistam e saiam do teatro modificadas.

A letra da canção é a melhor forma de ilustrar como a peça chega no público: “Pai, você foi meu herói, meu bandido. Hoje é mais muito mais que um amigo, nem você, nem ninguém tá sozinho, você faz parte desse caminho que hoje eu sigo em paz”.

Vida longa ao espetáculo “Meus 2 Pais”. Que sirva de exemplo, siga educando e que muitas crianças possam aprender que o que vale é o amor incondicional. Aplausos de pé emocionados. Viva Pedro Monteiro, viva a arte, viva o teatro!


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