Estamos em uma época onde qualquer tema se relaciona à
política ou ao momento em que vivemos, ou, ao contrário, o momento em que
vivemos inspira a soma de espetáculos relevantes e que estão fotografando a
realidade brasileira? Ainda não surgiram espetáculos especificamente políticos,
como na época de “Eles não usam black tie”, mas o teatro está se utilizando de
musicais, tragédias gregas e comédias para mostrar a quantas anda a nossa
sociedade.
Na tese sobre Behavorismo Radical, da psicóloga Denise
Torós, “As primeiras tentativas do homem para controlar os demais fora
grosserias, apoiando-se, em grande parte, no uso da força. Sons, gestos
ameaçadores, ou mesmo força física, eram técnicas pouco sutis. À medida que o
homem adquiriu a fala, as palavras tornaram-se um veículo adicional para
influenciar os outros. À força física foi acrescentada toda uma gama de técnicas
verbais, de apelos emocionai e argumentos de raciocínio e inteligência”
Posto isto, está no Teatro Gláucio Gil até 16/12, e espero que circule por
muitos outros teatros, a comédia “Pequenos Poderes”, ótimo texto de Diego
Molina. O espetáculo, dividido em esquetes, muito bem costurados pela direção
de Breno Sanches, mostra histórias engraçadas, corriqueiras e elevadas à
enésima potência do absurdo para que possamos enxergar toda a loucura que nos
cerca. Tem assalto a banco transformado em empréstimo, tem professora
humilhando aluno, tem padre penitenciando pecador, tem entrevistado que reage a
jornalista sem noção, tem juiz sendo engolido pela disputa de advogados...
enfim, pequenos poderes do dia a dia.
Breno Sanches contribui imensamente para a valorização do
texto. Não são simples esquetes, mas, sim, sucessão de histórias interligadas,
mesmo uma não tendo nada a ver com a outra. Breno caprichou na ligação, na
troca de cenário (de Diego Molina). Criou pequenos quadros hilários para dar
tempo dos atores mudarem mesas e cadeiras, figurino (de Bruno Perlatto) e
iluminação (de Ana Luiza de Simoni), apoiados numa trilha sonora competente (de
Armando Babaioff, DJ da festa SOPA). Além disso, Breno se preocupa com a
dicção, com o posicionamento, com a seriedade da brincadeira. Tudo ali está
pensado e estudado. Um trabalho de direção que merece reconhecimento.
Será que nunca faremos senão confirmar a incompetência da
América católica, que sempre precisará de ridículos tiranos? Será, será, que
será?
O quarteto fantástico, formado por Bia Guedes, Mariana
Consoli, Andy Gercker e Zé Auro Travassos, não poderia estar mais afiado e
dedicado ao trabalho. Quatro comediantes da melhor qualidade, primeira linha do
humor carioca, jovens atores que já tem muito a dizer e a mostrar. Além de suas
ótimas interpretações, estão atentos ao colega, atuando mesmo em silêncio sem
ofuscar quem está com a palavra. Destaque para a advogada sem um braço e a professora
de Bia Guedes, a beata, a ex-rica e a gerente do banco de Mariana Consoli, o padre
e o menino de Andy Gercker, e o assaltante e o machão pecador de Zé Auro. Morrer
e matar de fome, de raiva e de sede são tantas vezes gestos naturais.
Já dizia Caetano, enquanto os homens exercem seus podres
poderes, vemos por aí vários exemplos de pequenas medições de força, pequenos
usos de poderes, para que uma pessoa possa fazer exatamente aquilo que a outra
quer que seja feito. Eu quero aproximar o meu cantar vagabundo daqueles que
velam pela alegria do mundo e me sinto parceiro deste sensacional grupo que
montou este espetáculo. Gargalhei vários momentos e o sorriso não saiu dos
lábios enquanto assisti ao espetáculo. Então... corra, pois só temos mais 2
semanas na Casa da Gávea, e não perca “Pequenos Poderes”. Comédia da melhor
qualidade! Viva o humor carioca!
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