segunda-feira, 22 de agosto de 2011

EMILINHA E MARLENE - As Rainhas do Rádio

O aniversário era de Cauby Peixoto. Parte da comemoração foi no Domingão do Faustão, lá no Projac. Após o Arquivo Confidencial, Cauby embarcou na limousine para levá-lo "para casa". Ele não sabia, mas a tal casa seria uma festa surpresa, com seus amigos e colegas, no Canecão. Enquanto isso, na casa de espetáculos, recebíamos o público e os artistas. Fui escalado para levar Emilinha Borba até a sua mesa. Ela chegou, fomos apresentados. Metade da minha altura. Entramos no Canecão de mãos dadas. A platéia se levantou. Emilinha, Emilinha, Emilinha! Ela apertava firme a minha mão, emocionada. Eu? Fiquei mínimo ao seu lado. Não era ninguém ao lado daquela Rainha. Até a chegada à sua mesa foram 3 eternos minutos de um aplauso contínuo da platéia. Emilinha, Emilinha, Emilinha! Segura pra não chorar. Ganhei dois beijos e um abraço longo seguido de um "Obrigada, meu filho". Saí dali e foi impossível não conter as lágrimas de emoção. Emilinha, Emilinha, Emilinha... até hoje a voz da platéia ecoa na minha cabeça. A festa era do Cauby, mas quem ganhou o melhor presente, fui eu.

Não vivi a rivalidade entre as cantoras. Rainhas do rádio. Marlene, ainda acompanho sua trajetória pelos jornais e programas de tv. Emilinha, eu a vi vendendo CD numa banquinha no Largo do Machado. Brasileiro tem memória curta e a mídia nem quer mais saber das cantoras que fizeram este país feliz. Ainda bem que Thereza Falcão e Julio Fischer (autores) e Eva Joory e Rodrigo Faour (pesquisadores) são bons de história e trazem para o Teatro Maison de France o musical "Emilinha e Marlene - As Rainhas do Rádio".

A peça tem por base a briga de duas irmãs pela paixão e pela defesa que cada uma faz em favor de sua favorita. Pano de fundo para contar histórias (e músicas) das duas cantoras. Um roteiro simples e eficiente, sem barriga e nem grandes revelações, mas que mostra com perfeição o talento das cantoras e a rivalidade entre os seguidores de uma ou de outra.

O cenário é um bom apoio para as entradas e saídas dos números musicais e sustenta os músicos no segundo plano. Lembra um grande armário de onde as memórias foram guardadas e agora são revividas. O figurino é bonito, com alguns exageros permitidos, reconstituindo roupas que as cantoras usavam em suas apresentações. A iluminação abraça o espetáculo e nos faz perceber claramente a diferença entre realidade, shows e delírios.

Durante a apresentação não ouvi, em nenhum momento, as cabecinhas brancas das senhorinhas da terceira idade reclamando que a peça é longa. Elas querem é mais! Querem reviver suas histórias. E neste quesito a direção de Antônio de Bonis é perfeita. A gente nem sente o tempo passar. Um grande espetáculo. Ágil, divertido, agitado, veloz, com excelentes números musicais. A história é dirigida com carinho. Cada ator está bem amparado, bem orientado, e compreendemos muito bem todas as frases ditas. A direção de movimento é fundamental para o sucesso do espetáculo. Por conta do limitado espaço do teatro, a direção consegue fazer milagres com o apoio da luz e do cenário. Vem Shell ai.

O elenco é apaixonante. Vontade de ouvir mais histórias das irmãs Angela Rabello e Rosa Douat; de aplaudir Luiz Nicolau na sua homenagem ao Cauby; de ouvir a voz de Cristiano Gualda cantando cada vez melhor; de rir e se emocionar com a divertida interpretação (e homenagem) de Cilene Guedes vivendo Bibi Ferreira; de abraçar Stella Maria Rodrigues, Mona Vilardo e Ettore Zuim em todos os papéis que interpretam e nas músicas muito bem cantadas.

Solange Badim e Vanessa Gerbelli estão perfeitas como Marlene e Emilinha, respectivamente. A composição que Solange Badim faz de Marlene, braços com movimentos marcados, forma de falar, agitação e afinação vocal são impecáveis. Emociona todas as fãs. Meninas, eu vi! Senhorinhas chorando à primeira entrada de Solange Badim como Marlene. Solange já foi indicada ao Prêmio Shell por seu trabalho em "Oui, Oui, a França é Aqui". Vanessa Gerbelli é uma Emilinha carinhosa, delicada, apaixonada, generosa, e totalmente dominada pela música. Emociona as fãs saudosas de Emilinha que, em 2005, nos deixou. As duas rivalizam (no bom sentido) e se revezam em belíssimos e carismáticos números musicais. Impossível não se envolver.

Marlene e Emilinha (ou Emilinha e Marlene) alimentavam a briga de suas fãs. Isto é fato. E gostavam de dizer que eram amigas. Eram? Se respeitavam, isso que importa. E quem ganhava, e ainda ganha, é o público. São, sem duvida alguma, grandes rainhas do rádio e da MPB. Vivemos numa época em que o passado, ao invés de ser enaltecido é enterrado. Reviver as cantoras e esta rivalidade é dar nova vida à História da Música Brasileira. Um espetáculo excelente, de grande emoção, prefeito e brasileiro. Imperdível.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

O INCRÍVEL SEGREDO DA MULHER MACACO

Era verão, era Iguaba Grande. Um parque de diversões foi armado atrás do posto de gasolina. Vendemos azeitonas na praia para podermos brincar à noite nas atrações do parque. O "brinquedo" mais visitado, era da mulher que virava macaca. E a diversão do povo era ficar lá fora vendo os marmanjos saírem correndo quando aquela gostosa, por truques de espelho, era substituida pelo contra-regra, vestido de macaco. A macaca arrebentava a jaula e corria em direção do público. Gargalhada geral.

De volta ao berço do seu primeiro sucesso, "Surto", os Surtados voltam ao Teatro Cândido Mendes, na comédia "O Incrível Segredo da Mulher Macaco". Numa deliciosa brincadeira com os filmes de Hollywood, identifiquei "O que teria acontecido a Baby Jane?", "Assassinato por Morte", "O Iluminado" e, claro, os filmes de Agatha Christie. Suspense, sustos e... gargalhadas! Num enredo de tirar o fôlego, o autor e também diretor Saulo Sisnando armou uma trama sem nenhuma falha. Tudo está bem explicado e pensado com uma lógica que só a comédia permite. Todos os requintes de suspense, mistério e humor estão presentes. Sem falar na utilização, brilhante, das piadas muito recentes coletadas através da Internet.

A criatividade da direção fica evidente quando é necessário um momento "troca de figurino". Saulo cria pequenos números solos com os atores, sem deixar a peteca cair. A marcação dos atores e a velocidade quase alucinante do espetáculo, que a comédia exige, é compensada com olhares, pausas dramáticas e sonoplastia necessários aos espetáculos de suspense. Destaque para uma direção de movimentos muito bem casada com a direção dos atores.

A cenografia é o necessário para um teatro micro como o Cândido Mendes, mas tudo ali no palco é bem escolhido e está de acordo com o espetáculo. O figurino é muito bem confeccionado e combina muito bem com cada personagem. A luz é simpática e muito bem dividida entre o suspense e a comédia. Um acerto só.


Comentar sobre o carisma, casamento, generosidade, inteligência, perspicácia, simpatia e criatividade de Wendell Bendelack e Rodrigo Fagundes no palco, é falar sobre o talento destes dois atores de primeira linha da comédia carioca. Cada um brilha no seu momento, e são generosos com o parceiro ao passarem a bola redondinha um para o outro. Eles têm talento de sobra. Não é à toa que "Surto" é um fenômeno de público e "Mamãe Não Pode Saber" só foi autorizada por João Falcão para ser remontada por conta do talento dos dois atores. Rodrigo mata a platéia de rir com a matriarca, com o lourinho noivo da mocinha e com a louraça toda de azul. Wendell arranca gargalhadas com sua interpretação da mocinha ingênua e virgem. Aplausos para a criada, sóbria e sinista! E, não menos importante, Renato Bavier se diverte - e sua em bicas - na sua incrível interpretação da macaca, personagem principal da peça!

E teve boatos de que as comédias do Cândido Mendes estavam na pior. Se isto é tá na pior... Poham! Que que é dizer tá bem, né? Corram para o teatro no fim de semana mais próximo e não percam a O Incrível Segredo da Mulher Macaco! Pra ficar com as bochechas doendo de tanto rir.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O FILHO ETERNO

A velha pergunta "Por que eu?" somada ao sentimento de que "isso só acontece com os outros, comigo nunca" é o ponto de partida do livro "O Filho Eterno", sucesso de vendas há pouco tempo. Conosco nada acontece. Problemas, defeitos e acontecimentos ruins só com os outros. Muitas vezes convivi com pessoas que escondiam seus entes "queridos", por motivos mais diversos: dependência química, defeito físico, sindrome disso, síndrome daquilo. Síndrome de Down. Conheci uma menina linda com a síndrome e o carinho que ela nos dava, era sempre um presente. Pra nós. Mas a família passou algum tempo devastada pela presença daquele anjo.

Está em cartaz no Oi Futuro do Flamengo, a excelente adaptação de Bruno Lara Resende para o espetáculo baseado no livro "O Filho Eterno", de Cristóvão Tezza. A adaptação é concisa e foca nas mais variadas emoções da relação pai-filho. O pai, assim como no livro, narra em terceira pessoa, como se não fosse com ele que estivesse se passando aquela história.

A cenografia de Aurora de Campos é bastante simples e realmente é apenas o necessário. Uma cadeira e um fundo branco. Figurino de Marcelo Pies, elegante e perfeito para diferenciar o frio de Curitiba do calor do Rio de Janeiro. Inteligente também a passagem de tempo com acréscimo dos óculos ao personagem. A luz do Aurélio de Simone, como sempre criativa e competente, separa espaços, comprime a cena, divide com a platéia angustias, amplia universos, conduz o ator. Excelente! A direção musical de Lucas Mercier contribui bastante para o andamento do espetáculo.

O casamento entre a direção de movimento, de Márcia Rubin, com a direção do espetáculo, do Daniel Herz é perfeito. Se completam, se fundem, são quase a mesma coisa em cena. Um balé de tão perfeita. Daniel também conduz as falas, o timbre e o volume da voz do Charles com total segurança. Destaque para a genial cena em que o pai vai deixando de ouvir o que estão falando ao seu redor, porém é o ator quem diminui o volume de sua fala. Lindo!

E Charles Fricks? Sem duvida sua mais marcante e brilhante atuação em teatro. Uma entrega total ao personagem, com carinho, sem criticar aquele pai, entendendo a dor daquele homem, Charles dá vida com emoção e grande talento às dores, que só vamos descobrir que temos, e às conquistas, que só vamos comemorar com o tempo, daquele ser humano que não é nada no início da peça, mas se torna tudo ao final dela.

"Por que eu?", "Por que comigo?". Certamente você já se fez esta pergunta alguma vez. Lembro-me de conversar com uma faxineira do Projac e, contando minha tristeza, ela me veio com a pérola: "Por que NÃO, com você?" E a partir daí, observei que aquela tristeza era um crescimento, um aprendizado.

O Filho Eterno é obrigatório, não só pela genial, brilhante e incrível atuação do Charles Fricks, como também pela grandiosa direção do Daniel Hertz. Mas principalmente para que uma centelha de humildade e humanidade se acenda em todos nós, para que compreendamos os sinais da vida, como temos que encarar as provações e os presentes que Deus nos dá.

Mais que recomendo. Imperdivel.