sábado, 11 de dezembro de 2010

INDICADOS ao Prêmio Zilka Salaberry de Teatro Infantil

FONTE: O GLOBO


RIO - Três espetáculos lideram a lista de indicados à quinta edição do Prêmio Zilka Salaberry de Teatro Infantil: "O barbeiro de Ervilha", "O soldadinho e a bailarina" e "Marina, a sereiazinha" concorrem, cada um, em cinco categorias. "Marina, a sereiazinha", da Cia. PeQuod, ganhou ainda um prêmio especial do júri, pelos bonecos utilizados na peça. "Os Saltimbancos", "Joaquim e as estrelas" e "Fragmentos de sonhos do menino da lua" vêm em seguida, disputando em quatro categorias.

Na categoria de melhor espetáculo concorrem "Marina, a sereiazinha", "O barbeiro de Ervilha", "O soldadinho e a bailarina" e "Os Saltimbancos". Na direção, disputam Gabriel Vilela ("O soldadinho e a bailarina"), Daniel Herz ("O barbeiro de Ervilha"), Cacá Mourthé ("Os Saltimbancos") e Miguel Vellinho ("Marina, a sereiazinha"). A premiação será em março de 2011.

Confira a lista de indicados ao Prêmio Zilka Salaberry de Teatro Infantil 2010

PRÊMIO ESPECIAL

- Confecção dos bonecos de "MARINA, A SEREIAZINHA", pela equipe da Cia. PeQuod Teatro de Animação.

- Luciano Porto e Márcio Vieira pelos elementos cenográficos de "DEVOLUÇÃO INDUSTRIAL"

MELHOR MÚSICA
- Victor Pozas, Sergio Módena e Ernani Maletta pelas músicas, letras e direção musical de "O SOLDADINHO E A BAILARINA"
- Leandro Castilho- pela direção musical de "O BARBEIRO DE ERVILHA"
- Alexandre Elias - pela direção musical de "OS SALTIMBANCOS"
- Fabiano Krieger - pela direção musical de "MARINA, A SEREIZINHA"
MELHOR ILUMINAÇÃO
- Paulo César Medeiros- "O BARBEIRO DE ERVILHA"
- Renato Machado - "MARINA, A SEREIAZINHA"
- Jorginho de Carvalho - "LUDI NA REVOLTA DAS VACINAS"
- Anderson Ratto - "JOAQUIM E AS ESTRELAS"
MELHOR CENÁRIO
- Carlos Alberto Nunes - "MARINA, A SEREIAZINHA"
- Gabriel Naegele - "IGI: A ÁRVORE DA VIDA"
- João Argelini - Pela concepção visual de "FRAGMENTOS DE SONHOS DO MENINO DA LUA"
- Rico e Renato Vilarouca - Pela concepção visual de "LUDI NA REVOLTA DAS VACINAS"
MELHOR FIGURINO
- Gabriel Vilela - "O SOLDADINHO E A BAILARINA"
- Alessandro Brandão - "FRAGMENTOS DE SONHOS DO MENINO DA LUA"
- Lu Gatelli - "FLOR DE MANDACARU"
- Leonam Thurler - "IGI: A ÁRVORE DA VIDA"
MELHOR TEXTO
- Miriam Virna - pela adaptação de "FRAGMENTOS DE SONHOS DO MENINO DA LUA"
- Bruno Bacelar - "IGI: A ÁRVORE DA VIDA"
- Jônea França - "FLOR DE MANDACARU"
- Renata Mizrahi - "JOAQUIM E AS ESTRELAS"
MELHOR ATOR
- Leandro Castilho- "O BARBEIRO DE ERVILHA"
- Mauricio Tizumba - "OS SALTIMBANCOS"
- José Mauro Brant - "OS SALTIMBANCOS"
- João Velho- "JOAQUIM E AS ESTRELAS"
MELHOR ATRIZ
- Janaina Azevedo - "O SOLDADINHO E A BAILARINA"
- Miriam Virna - "FRAGMENTOS DE SONHOS DO MENINO DA LUA"
- Raquel Penner - "O RICO AVARENTO E OUTRAS HISTÓRIAS DE ARIANO SUASSUNA"
- Elisa Pinheiro- "JOAQUIM E AS ESTRELAS"
MELHOR DIREÇÃO
- Gabriel Vilela - "O SOLDADINHO E A BAILARINA"
- Daniel Herz- "O BARBEIRO DE ERVILHA"
- Cacá Mourthé - "OS SALTIMBANCOS"
- Miguel Vellinho- - "MARINA, A SEREIAZINHA"
MELHOR ESPETÁCULO
- "MARINA, A SEREIAZINHA"
- "O BARBEIRO DE ERVILHA"
- "O SOLDADINHO E A BAILARINA"
- "OS SALTIMBANCOS"

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

TUDO QUE EU QUERIA TE DIZER


Em 2002 entrei pra o Clube da Letra. Grupo de letrados, poetas, contistas, cronistas, romancistas, engenheiros, médicos, delegada, advogados, donos de livraria, aposentados, que se reunem de 15 em 15 dias para comemorarem a vida, lerem textos próprios e sugerir melhorias nos textos dos celetristas. Acima de tudo somos amigos. Passamos por poucas e boas juntos, como uma sanfona. Ora somos apenas 5, ora somos 25. É muito bom quando temos reuniões. Sou sempre o bobo da côrte e adoro isso. Vê-los rir das minhas insanidades é delicioso.


Numa dessas, chegou até nós uma advogada super moderna que logo virou minha mais nova amiga de infância. Ela diz que sou seu quarto filho, visto que as datas de nascença dos outros 3 se aproximam da minha. Somos amigos a tal ponto dela ter virado uma personagem de meus contos: uma espiã internacional, visto que viaja mais que presidente em campanha! A cada viagem, novas histórias ela me conta. E eu re-conto, e re-invento, aventuras de Anaberta Hertz, minha espiã internacional favorita. E foi ela quem me apresentou Martha Medeiros, no lançamento de "Tudo que eu queria te dizer", o livro. Neste dia, jantamos com Martha Medeiros e foi inesquecivel para mim. Já gostava da escritora, passei a admirar a mulher.

Comprei neste dia dois exemplares. Um, presenteei um amigo com o livro e uma carta escrita de próprio teclado com tudo que queria dizer a ele, como uma dedicatória. O outro é meu, ninguem tasca, tá autografado. "Marcelo, um beijo supercarinhoso da Martha Medeiros - 24 set 2007". Que troféu. Devorei o livro. Ri, chorei, ri, chorei, chorei, ri, ri e ri.

Até que, há uns dois meses, a produtora Kelly Goldoni me convidou para assistir a peça, com as cartas da peça lidas por Ana Beatriz Nogueira no Centro Cultural Correios. Adorei a idéia! Parti pra lá.

O texto da peça, agora em cartaz no Teatro Clara Nunes, é composto de 6 cartas contidas no livro "Tudo que eu queria te dizer". Confesso que fiquei um pouco frustrado por serem apenas 6 contos, num universo tão rico quanto o do livro que eu li, e adorei. Este comentário da frustração é sinal - positivo - de que eu fiquei com vontade de mais. E mais, e mais. Será que cabem pelo menos mais umas 4 cartas na peça?

Victor Gracia Peralta é um diretor detalhista que sabe conduzir os atores por caminhos bonitos e corretos. E não é diferente com Ana Beatriz Nogueira nesta peça. Ele conduz a atriz por cada história com personagens totalmente diferentes uns dos outros. Faz com que fiquemos a peça toda olhando para o palco sem piscar. Rimos, choramos, odiamos, somos cúmplices. Cabe destacar a ótima luz da peça e o pretinho básico da roupa que Ana Beatriz usa.

Ana Beatriz Nogueira é uma grande atriz. Sou admirador incondicional do seu trabalho. Esta peça assina embaixo tudo o que eu acho de seu talento, comportamento no palco, respeito pelo publico. É um grande trabalho.

"Tudo que eu queria te dizer" é um espetáculo compacto, quase simples, mas de conteúdo humano. O que importa aqui é a palavra. A ferramenta principal do ator. Viver cada personagem como se fosse eu, tu, você, nós, vós, eles. E isto é muito bom. Divirta-se!

domingo, 21 de novembro de 2010

MAIS RESPEITO QUE SOU TUA MÃE.

A função da familia é amparar. Sempre digo isso pra minha mãe, qdo ela fica irritada com alguem da familia por algum motivo. Passávamos férias em Iguaba Grande e as confusões sempre aconteciam. Levávamos amigos, casais com filhos, primos, tios. Dormiamos em colchonetes com ventiladores Arno, circuladores Eletrolux. Éramos felizes e sabíamos. Uma das tias batia com o pano de prato molhado no tio quando este bebia muito. Papai voltava cambaleante do bar. Caíamos de bicicleta, ralávamos joelho. "Reutilizávamos" o tíquete que comprávamos na padaria pela manhã para comprar o pão à tarde... er... bem... era o mesmo tiquete, entendeu?! A burra da atentende nunca desconfiou que nós, crianças, roubávamos a padaria, hoje falida, claro. A fila do Bamerindus, primeiro banco da Iguaba não tinha preferencial. Falar com vovó no posto telefônico, sempre aos domingos às 8h, porque depois, a fila ia longe. Mamãe era dona de um bordão: quando queria desligar e vovó não deixava, ela começava: "Fica com Deus, mamãe". Era repetido ao menos 8 vezes. "Lá vem dona Fica Com Deus Mamãe", um dia ouvi a mocinha falar para a amiga. Era mamãe. Sabe o que eu disse pra ela? "Mais respeito, ela é a minha mãe". Pra finalizar o parágrafo, mamãe uma vez brigou nas Lojas Americanas pois o atendente destratou vovó. Sabe o que ela disse? "Mais respeito, que ela não é a sua mãe, mas é a minha!". Familia.

Poucas vezes em teatro, e eu sei que este é o sinal, choro e rio ao mesmo tempo. Choro pela situação e rio com lágrimas nos olhos quando a piada fatal vem em seqüência. Isto é identificação. Em "Mais respeito que sou tua mãe!" isto aconteceu novamente. A peça é fruto de um blog que virou teatro na Espanha, Portugal, Argentina e agora Brasil. Por aqui, claro, só Miguel Falabella para traduzir melhor que ninguém a peça para o nosso universo. E faz perfeitamente. Sabe o tom certo para a hora de emocionar e a hora de fazer rir. Sem contar na vasta experiência em contar histórias de familias de subúrbio, principalmente o carioca. Miguel Falabella é uma marca, uma referencia de qualidade, talento e bom gosto.

É dele também a direção, o que facilita na hora de traduzir e vice-versa. Uma peça ágil, onde a protagonista, ora narradora, ora participante das cenas, conta para nós o que é ser aquela mulher. A opção por dividir com a platéia a humanidade da personagem é um acerto total, visto que o carisma de Cláudia Jimenez é contagiante. Acerto também para as cores de figurino e cenário, luz, fotografia nas cenas. Tudo perfeito.


Ao talento de Miguel somam-se profissionais de alto nivel. José Dias assina uma cenografia muito simpática, criativa, funcional e totalmente preparada para que a estrela seja a mãe. Não é à toa que é um mestre na área. O figurino de Sônia Soares é de extrema correção, bom gosto e adequado as cores da peça: tons preto e branco. Apenas uma cueca Calvin Klain com o elástico aparecendo a marca, destoa da familia pobre. Ficaria mais interessante se fosse uma cueca falsa, não uma original bem a mostra. Sônia é generosa com o figurino de Cláudia Jimenez e tudo que a atriz veste lhe cai muito bem. A luz de Carlos Lafert explora e embeleza mais ainda o cenário, as cenas e os atores. Gostei muito do contra-luz na janela da cozinha e o céu estrelado. A trilha sonora de Leandro Lapagesse é muito interessante, pois ilustra e abraça as cenas.

Compõem o elenco, atores em crescimento profissional: Frank Borges, Sara Freitas, Gabriel Borges e Séfora Rangel. Henrique Cesar faz um avô liberal muito divertido. Ernani Moraes é cúmplice, generoso, amigo e parceiro de Cláudia Jimenez faz tempo. A sintonia dos dois é muito boa. Ele é o próprio machão e pai de familia desempregado do suburbio carioca. Perfeito.

E Claudia Jimenez? Meu Deus, obrigado novamente por me permitir vê-la em cena (momento "eu sou fã"). O tempo de comédia, as caras, os olhares, a velocidade com que vira o rosto e solta a bomba da piada, a verve, o carisma, tudo é perfeito. Cláudia Jimenez, que já me fez rir muito em "Como encher um biquini selvagem", me fez rir com seu mau-humor em "Vida Alheia" e me fez chorar em "No Natal a gente vem te buscar", agora me faz rir e chorar ao mesmo tempo. Sinceramente, o prêmio de melhor atriz de 2010, pra mim é dela.

Familia. Ruim com eles, pior sem eles. As vezes é brabo, às vezes é bom. Não importa. É com eles que vamos contar sempre. "Mais Respeito que sou tua Mãe" é a melhor peça em cartaz atualmente no Rio. Já vi muita coisa. Todas excelentes, vocês acompanham por aqui meus comentários, mas nenhuma delas supera esta. Se existe perfeição em comédia, "Mais respeito que sou tua mãe" está aí para servir de exemplo.

Tá esperando o que? Vá já comprar seu ingresso!
IMPERDIVEL MESMO!

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Mamma Mia em SP!

FONTE: O GLOBO

SÃO PAULO - Após ser visto por 45 milhões de pessoas, o espetáculo "Mamma mia!" estreia dia 11 de novembro no Teatro Abril, em São Paulo, com 32 atores e 10 músicos ao vivo. Mas, como ocorre nos 10 teatros onde está em cartaz pelo mundo, o musical não precisa de tecla SAP ou legendas para ser compreendido. Tudo é em bom e claro português, desde os diálogos às canções do grupo Abba, como "The winner takes it all", "Dancing queen" e "Take a chance on me", que dão o tom à comédia romântica.

A tarefa de fazer versões para os hits do quarteto sueco coube a Cláudio Botelho, outro nome forte na onda de musicais que vem conquistando o Brasil.

- É muito importante que em cada país o idioma do país consiga transmitir a emoção da história, é a melhor forma de a platéia se identificar com os personagens - diz o diretor musical David Holcenberg, que acompanhou os ensaios da peça ao lado de Robert McQueen (diretor associado) e Janet Rothernet (coreógrafa associada). O diretor e coreógrafo Floriano Nogueira serviu de elo entre elenco e os criadores estrangeiros, enquanto o maestro Paulo Nogueira cuidou de conservar nos arranjos os acordes originais de todas as canções, que são executadas e cantadas ao vivo em todas as sessões.

A montagem tem à frente dois dos nomes mais conhecidos do circuito musical brasileiro: Kiara Sasso e Saulo Vasconcelos. É da atriz de 31 anos o papel de Donna Sheridan, que na refilmagem para o cinema de 2008 foi desempenhado por Meryl Streep, então com 59 anos. Mas Kiara, até por conta dessa diferença de idade, por pouco não é escalada para a produção:

- Quando começaram a seleção do elenco, eu estava fora do país. Mas não me importei, já que me achava velha demais para fazer o papel de Sophie e nova demais para ser a mãe dela - conta a atriz.

Só que os diretores enxergaram nela a Donna perfeita assim que ela, motivada por colegas, fez teste para "Mamma mia!".

- A diferença principal agora é que eu, em vez de ser a mocinha, sou a mãe da mocinha - compara.

A mocinha no caso é a Sophie (Pati Amoroso), que, às vésperas de se casar, cisma de investigar quem é seu pai, segredo mantido a sete chaves pela mãe. Para isso, convida para a festa os três homens com quem Donna se relacionou na época em que engravidou: Sam Carmichael (Saulo Vasconcelos), Bill Austin (Carlos Arruza) e Harry Bright (Cleto Baccic).

Independentemente do desconforto que seu personagem tenha diante da situação, Saulo se sente em casa quando atua com Kiara.

- Eu e a Kiara temos um entrosamento muito grande, dentro e fora do palco. Aliás, este é o primeiro papel que faço sem máscara com ela neste teatro - lembra o ator, que foi o monstro de "A Bela e a Fera" (2002/2003) e o personagem-título de "O fantasma da ópera" (2005/2007). Em ambas os dois formaram par romântico, situação que se repetiu em "A noviça rebelde" (2008/2009), no Casagrande, Rio, e Teatro Alfa, em São Paulo.

O Teatro Abril fica na Av. Brigadeiro Luís Antônio 411, na Bela Vista, região central paulistana. Sessões às quartas, quintas e sextas, às 21h; sábs., às 17h e 21h; e dom., às 16h e 20h. Os ingressos, com preços entre R$ 80 (balcão, às quartas, quintas e domingos) e R$ 250 (setor VIP, às sextas e sábados), podem ser comprados pelo fone 4003-5588 (válido para todo o país).

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

COMÉDIA RUSSA

Trabalhei por 11 bons anos numa empresa de comunicação e entretenimento televisivo. Nomes para que? Já podem imaginar. Tentei ao máximo seguir as regras que nos eram impostas na função, mas sempre dávamos diversos jeitinhos para que tudo acabasse bem, para a felicidade geral da nação. Dizíamos que o diretor era a pessoa mais enganada do planeta, pois sem os nossos jeitinhos, nada andava. Agora, como produtor, passo por bons e cansativos momentos junto à burocracia das leis de incentivo, que GRAÇAS A DEUS, existem para salvar a cultura brasileira. Sem as leis de incentivo, certamente eu seria uma pessoa infeliz por não realizar projetos culturais.

Inscrever projetos em editais também requer paciência e aprendizado. Lidar com certidões, contratos sociais, xérox autenticadas, protocolos e encadernações é muito cansativo para quem tem que criar o texto, o cenário, a programação visual, tudo ao mesmo tempo agora.

Gargalhei com a peça Comédia Russa, quando, no início, um dos personagens sofre para entrar em seu primeiro dia de trabalho em uma repartição publica russa qualquer. A burocracia o irrita, mas ele leva na maciota até conseguir um lugar ao sol. Junto a esta vida cotidiana de esquemas, ordens, desmandos, jeitinhos, começa uma série de assassinatos em seqüência.

Prezada Agatha Christie, li todos seus livros. Gostei muito de alguns, de outros achei o final muito improvável. Mas, no todo, a senhora é muito, mas muito boa, no gênero assassinatos.

Pedro Bricio, autor da peça Comédia Russa, segue o estilo de Agatha e nos deixa com a pulga atrás da orelha catando o assassino. Se é que houve assassinato, pois o suicídio sempre é uma hipótese válida. Mas num determinado ponto da peça, a gente percebe que... bem... não devo contar. Mas falta um final à altura do espetáculo. Fica uma grande duvida no ar e nenhuma novidade é criada para garantir a atenção do publico. No último terço da peça, eu perdi o fio de meada e não entendi muito bem o que rolou por lá. Vou ter que ver novamente para mudar esta história.

O projeto de vida do grupo de teatro Os Fodidos Privilegiados é pra mim um dos mais bonitos da cena teatral carioca. De Abujamra a João Fonseca, acredito que tenha assistido a 60% das montagens. Um grupo unido, que ama o teatro. Gosto muito de trupes de teatro. Acredito que isto mantenha nosso teatro vivo. Estudos são válidos e os grupos fazem isso muito bem. Assim como os Fodidos. Alias, não poderiam ter dado nome melhor, pois ninguém consegue viver de teatro por muito tempo sem ter uma profissão que o sustente. E se não tiver, você fica fodido mesmo.

O elenco de 11 pessoas – Alexandre Pinheiro, Cristina Mayrink, Daniela Olivert, Filomena Mancuzo, Marcos Correa, Natália Lage, Ricardo Souzedo, Roberto Lobo, Rodrigo Nogueira, Rose Abdallah e Thelmo Fernandes - funciona muito bem em conjunto, com um ou outro se sobressaindo numa cena, mais que o colega. E não é uma peça de grupo? Pois este é muito bom.

O cenário do Nello Marrese é incrivelmente criativo. Admirável trabalho. Há pouco escrevi que achava seu “Maria do Caritó” seu melhor trabalho. Isso até ver Comédia Russa. Este sim é o seu melhor trabalho. Muito criativo mesmo. Cenografia de primeira categoria. O figurino de Rui Cortez abusa dos vermelhos sabiamente e dos tons cinza, tudo com a elegância necessária. A luz de Daniela Sanchez é bonita, principalmente na cena final que falarei mais adiante. Ah, claro, a excelente e criativa musica do André Abujamra. Tudo a ver.

Na direção, o João Fonseca. Vejo tudo dele. Acredito que seja um dos melhores diretores atualmente no teatro carioca. Esta é minha opinião, olha o ciúme, hein? Em Comédia Russa, João brincou de pique com seus amigos. Deixou-os a vontade. Talvez um pouco a vontade demais da conta. As duas cenas do casal tomando sorvete precisam de algo mais. Senti falta de cenas mais marcadas, quase coreografadas, que João faz em outras peças. A repetição das cenas de coreografia com musica – tanto coreografia quanto musica são ótimas - as vezes fica um pouco de mais. Mas, calma. Eu gostei muito. Principalmente da movimentação, da opção pela brincadeira, quase um Vaudeville.

A peça é bem divertida. Ri bastante, me identifiquei varias vezes e saí pensando sobre como a burocracia, o somatório de erros e assassinatos em seqüência, pode mudar a vida das pessoas. Que me perdoem os produtores, mas cena final eu vou ter que contar. Pra mim é uma das mais lindas que já vi no teatro. Dois personagens no palco. Topo de um prédio. Apreciam o pôr do sol. A luz vai baixando. Ela diz. “Lindo ver o pôr do sol daqui de cima”. Luz baixando. Ele concorda. Ela “Quando terminar, vamos aplaudir?”. “Claro”, ele diz. A luz vai diminuindo. Eles aplaudem. Blackout. Toda a platéia aplaude.

Aplausos!

domingo, 24 de outubro de 2010

MARLENE DIETRICH - As Pernas do Século


Quando ele me disse que ia morar na Alemanha, confesso que fiquei tenso. Depois de ter passado por Portugal e França, pensei que a escolha final pra o inicio de sua brilhante carreira internacional fosse Portugal. Mas não. Frankfurt o adotou. Centro nervoso e economico da Alemanha, uma das cidades mais internacionais da Europa. Não tinha lugar melhor para ele. E pra melhorar, muito bem acompanhado. Prometi que ia, e vou, encontrar com ele em todos os países que ele viver. Parto para a Alemanha no carnaval de 2011.

Confesso ainda que já vasculhei a internet e decorei o mapa da cidade. Santo Google que me consegue traduzir algumas palavras. Já sei onde ficam os teatros, museus, centros culturais. Quero ir a Berlim. Quero conhecer este povo, esta cultura forte que tanto admiro.

Sábado no Rio, vou ao Teatro Solar de Botafogo, um dos mais aconchegantes e elegantes do Rio. Sou presenteado com uma amiga na bilheteria, nos tempos de Dona Baratinha no Teatro Clara Nunes... tempos de longas filas. Éramos felizes e sabíamos. Sento-me à espera dos sinais. De cara uma elegante apresentação da peça nos informa que houve um erro no programa e pedem desculpas de uma maneira inusitada: erros de gravação de um filme alemão. Elegancia total.

Leio no programa que Sylvia Bandeira , assim como eu, tinha referências insignificantes sobre Marlene Dietrich. No palco, Aimar Labaki me ensina tudo que eu preciso saber sobre Marlene. Um texto elegante, de muito bom gosto, dramaturgicamente construido. Temos climax, história, História, emoção, conflitos. Diversos. Passo a conhecer, e a admirar uma mulher, estrela, popstar da 2ª grande guerra. Uma mulher que ama, mas acima de tudo ama a si mesma. Batalhadora, generosa, amiga, cantora, intérprete, mãe, filha, irmã, esposa, amante. Aimar não poupa um detalhe. E o melhor é que coloca na propria boca de Marlene todo o veneno contra si mesma. Acho acertadissimo que Marlene necessite contar para um garoto quem foi ela. Até hoje muitos jovens não sabem quem foi Elis Regina, Nara Leão, Sônia Mamede, Emilinha, Marlene, Marlene Dietrich, e tantas outras. Esta é uma das funções do teatro: homenagear e relembrar. Aimar faz isso com prefeição.

A direção da peça, de William Pereira é muito elegante. Acerta em tudo. Não vi um item no palco que tivesse que ser melhorado. Tudo perfeito. Dos trejeitos de Marlene, à opção da simples e bonita cenografia, hora certa para os numeros musicais, momentos de humor e dor temperados com a devida elegância. Belo trabalho do diretor.

No figurino, Marcelo Marques já pode separar um lugar na estante para receber outro prêmio Shell de teatro. Nisso ele é craque. Roupas muito bem confeccionadas, de excelente gosto, tecidos escolhidos a dedo - nem tudo que é caro funciona no palco - detalhes nas roupas e nas caracterizações. Eu sei bem quando Marcelo se entrega de corpo e alma a um texto, um projeto, e desta vez ele se entregou pra valer. A luz de Paulo Cesar Medeiros atinge o objetivo. É sépia quando o assunto é presente, é colorida e branca quando o assunto é passado. Muitas sombras, muito filme noir. Ele sabe. O visgismo de Beto Carramanhos transforma Sylvia em Marlene. Não há duvidas quanto ao seu belo trabalho. Os musicos, liderados por Roberto Bahal, arranjador, estão em total harmonia com o espetáculo.

Quanto ao maravilhoso elenco, Márciah Luna Cabral, Silvio Ferrari e José Mauro Brant dão um show de intrepretações, tanto nos seus papéis quando nas canções que defendem. Totalmente à vontade no palco, os três conseguem se sobressair, a cada entrada, a cada troca de personagem e figurino, interpretando papéis totalmente diferentes um dos outros. E que vozes!

Sylvia Bandeira ouviu a voz do sábio Fábio Pilar - obrigado! - e é a propria Marlene Dietrich. Prepare-se, Sylvia, para uma indicação ao premio Shell - alias adoro distribuir premio dos outros! - Sylvia compõe uma Marlene aos 90 anos, com tiques nervosos nas mãos, uma tensão constante, pois Marlene era tensa - veja as fotos que meu amigo Renato selecionou no site clicando AQUI . Sylvia compõe uma Marlene que se re-inventou para sobreviver na carreira. Sylvia é Marlene. Uma realização de um sonho muito bem executada, muito bem produzida, sábiamente escolhida.

Saio feliz do teatro. Saio acrescentado. Um espetáculo elegante, Histórico, correto, bonito, divertido, emocinonante, feito com amor e garra, que merece - e deve - ser visto por todos aqueles que têm alguma ligação com a Alemanha e com as artes em geral. Um espetáculo de extremo bom gosto que o Rio de Janeiro merece exportar para a Alemanha.

Tomara que esse meu amigo, que virá ao Brasil em dezembro, possa assistir a linda homenagem que Sylvia Bandeira e CIA estão apresentando não só para Marlene Dietrich, mas também para a Alemanha. APLAUSOS DE PÉ - em caixa alta para não haver duvidas.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A GAROTA DO BIQUINI VERMELHO

Começava o “Balança Mas Não Cai” e lá vinha mamãe com o misto quente e a Coca Cola – normal, sempre. Era domingo, hora do lanche. O cheiro do misto, que eu molhava na bebida e comia, ficou marcado. Marcado fiquei, quando apoiei meu braço na chapa quente. Hoje esta marca ficou mais visível.

Sônia Mamede pra mim é “misto com Coca Cola”. Ofélia pra mim é Sônia Mamede. Aquela brejeirice, aquela burrice ingênua nunca mais teve uma atriz à altura de sua primeira intérprete.

Ansioso por rever Sônia Mamede, parti pro SESC Ginástico e me deparei com uma linda homenagem de um fã. O sabor do “misto com Coca Cola” que o autor Arthur Xexéu sentia na infância e na adolescência, quando acompanhava a carreira de Sônia Mamede, está ali no palco. O carinho fica claro quando preserva a platéia das operações e doenças que envolveram os últimos tempos de vida da atriz. Mas ele não esconde o fraco pela bebida que aquela garota do biquíni vermelho tinha.

Longe de ser uma dramaturgia comme il faut de teatro – e quem se importa com isso? – a peça não tem conflito nem clímax. É uma homenagem a Sônia Mamede, ao teatro de revista e às coristas e vedetes que abrilhantavam as telas de cinema e os palcos cariocas. Época em que a televisão não dominava os lares da população. Xexéo caprichou na escolha dos fatos, entupiu a peça de referências de época, citou nomes de queridos companheiros de Sônia Mamede – não esqueceu ninguém -, utilizou-se de toda a pesquisa histórica de Daniel Schenker sobre a vida da atriz, sobre as vedetes, e nos acrescentou com esta homenagem justa e bonita.

A direção, leal ao texto, é de Marilia Pêra – minha favorita, mas não espalha. A peça precisa de ritmo até a sua metade. É muita informação no texto e as cenas ficam um pouco sem ligação uma com as outras. Se em algumas cenas os atores ficassem parados no palco, renderiam mais do que caminhando de um lado ao outro, sem motivo aparente. Sugestão: números musicais com texto no meio, três vezes na peça, fica muito igual, não? Outra rapidinha: evitar o contra-regra para colocar copos em cena, eles podem ser retirados de dentro de um dos baús. - Ok, quem sou eu para sugerir, opinar, comentar... sou apenas público, perdoem-me a ignorância. Depois que Sônia Mamede recebe o Mambembe, a peça cresce muito, fica mais ágil e o ápice é a imitação de Ofélia e Fernandinho recebendo Carlos Manga.

O ótimo figurino de Kalma Murtinho explora os contrastes preto-e-branco, de uma época em que as cores não apareciam na telona. O cenário do Marcelo Marques é composto de caixas que servem de bancos e escada, junto com uma moldura que serve de quadro, tela e janela. A luz de Tomás Ribas - gosto muito - usa os corredores internos do palco, coisa rara atualmente em teatro. Os números musicais são simples, nos recordam - e ensinam - como era bom aquele tempo. São cantados ao vivo pelos artistas - mas com músicos em playback -, ilustram a vida de Sonia Mamede no cinema. O autor nos presenteia com duas musicas de sua autoria que complementam o texto. Na coreografia, Manoel Francisco fez bem a lição de casa e acertou na composição que homenageia os filmes da Atlântida. Ele também nos dá uma palhinha de seu talento dançando como acontecia nos filmes.

Theresa Amayo compõe uma mãe carinhosa, Ricca Barros interpreta um Daniel Filho e um Carlos Manga iguaiszinhos aos originais, Ricardo Graça Mello canta bem um numero musical e interpreta outros personagens também com correção. Compõem o elenco Tati Pasqueli e Karin Roepke como coristas e amigas de Sônia Mamede. Regiane Alvez tem talento pra dar e vender. Sua criação para Sônia Mamede foi estudada a fundo. Da língua presa aos trejeitos, incorpora Ofélia no palco. Um trabalho correto, bonito e com muito respeito.

O filme que ilustra a cena final da peça emociona. Vemos que o carinho de Arthur Xexéo com a sua querida garota do biquíni vermelho é maior que o palco. É uma peça onde os mais novos vão aprender como era ser vedete, quando as atrizes tinham talento, mas o que valiam eram suas pernas – atualmente eu digo o quê? - É um belo registro histórico sobre uma atriz talentosa, divertida e acima de tudo, uma grande mulher. É trazer de volta o gosto bom do misto quente com Coca Cola. É recordar, homenagear e viver. Aplausos para a equipe.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Políticas culturais nos Governos FHC e Lula

Como este é um site que fala de cultural, resolvi publicar o artigo abaixo.

Políticas culturais nos Governos FHC e Lula

O segundo turno das eleições presidenciais de 2010 nos convida a uma reflexão acerca das políticas culturais inscritas nos projetos políticos em confronto. Mais que um mero embate entre as personalidades de Dilma e de Serra, como muitos querem fazer crer, importa entender que a efetiva disputa eleitoral acontece entre projetos políticos distintos que se expressam nestas candidaturas.

Para as pessoas interessadas em cultura, cabe analisar como estas forças políticas tratam a cultura. Tal compreensão implica, por exemplo, na análise comparativa das políticas culturais desenvolvidas pelos governos no plano federal: PSDB (1995-2002) e PT (2003-2010).

O Governo FHC teve um único Ministro da Cultura: Francisco Weffort. A atuação prioritária do Ministério da Cultura esteve voltada para desentravar e ampliar o funcionamento das leis de incentivo no país. Não por acaso a cartilha Cultura é um Bom Negócio se tornou um documento emblemático da atuação deste governo no campo da cultura. A efetiva ampliação do funcionamento das leis de incentivo foi conseguida, em especial, através da orientação do governo para as empresas estatais investirem no campo cultural.

Além de estimular a aplicação e ampliação da lógica das leis de incentivo, o ministério desenvolveu alguns projetos como o Monumenta, voltado para a área de patrimônio físico, mas realizado institucionalmente fora do IPHAN, e o programa de expansão do número de bibliotecas no Brasil, visando dotar todos os municípios de, pelo menos, uma biblioteca, meta não realizada apesar do esforço desenvolvido. Também a área de patrimônio imaterial foi contemplada, através da criação de legislação específica neste setor. Mas estas e outras iniciativas não se pretendiam como contraposições à prioridade conferida às leis de incentivo. Elas atuavam de modo complementar à opção política tomada.

Esta política de priorizar as leis de incentivo inibiu, em boa medida, a deliberação do governo sobre os projetos culturais e, por conseguinte, sobre políticas culturais, pois a decisão efetiva sobre a cultura a ser estimulada foi transferida para as empresas, conforme previsto na modalidade de leis de incentivo vigente no Brasil. A escolha se mostrava sintonizada com a conjuntura nacional e internacional de fortalecimento do papel do mercado e inibição da atuação do estado. O orçamento do Ministério no final do período é de 0,14% do orçamento nacional.

O Ministério da Cultura no governo Lula foi ocupado por Gilberto Gil (2003-2008) e Juca Ferreira (2008-2010). Tais ministros assumiram posição contrária ao predomínio das leis de incentivo, ainda que projeto neste sentido só tenha sido enviado ao Congresso em 2010. Eles defenderam desde o início a necessidade de retomar o papel ativo do estado na formulação e no desenvolvimento de políticas culturais.

A construção de políticas de cultura foi realizada com a participação da sociedade por meio de seminários, câmaras temáticas e encontros, como as duas Conferências Nacionais de Cultura de 2005 e 2010. Uma maior institucionalidade para o campo cultural foi buscada através do desenvolvimento do Sistema Nacional de Cultura (SNC), que pretende articular a federação, os estados e os municípios, e do Plano Nacional de Cultura (PNC), conformado em interação com o Congresso Nacional, além da criação de novas instituições culturais, como o Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), e novos órgãos como a Diretoria de Relações Internacionais do Ministério da Cultura.

Diversos projetos foram implantados e alguns ganharam grande projeção como: Pontos de Cultura, por certo uma das atividades de maior repercussão nacional e internacional do Ministério, e DOC-TV, que envolve televisões públicas de todo Brasil e o Ministério da Cultura para a produção e divulgação de documentários e que, dado o sucesso, já teve várias versões, inclusive internacionais, como as latino-americanas e para a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

As políticas para a diversidade cultural assumiram lugar relevante no governo Lula. No debate internacional sobre a diversidade cultural promovido pela UNESCO para construir a Declaração (2001) e a Convenção (2005), o Brasil teve inicialmente uma posição bastante ambígua. Mas tal postura foi radicalmente modificada com o novo governo. O Ministério da Cultura e o Ministério das Relações Exteriores, em conjunto, atuam vivamente em prol das normas internacionais de defesa da diversidade cultural. No plano interno, o Ministério da Cultura criou a Secretaria da Identidade e da Diversidade Culturais (SID) para implantar políticas e dar visibilidades aos documentos internacionais. Na busca de empreender políticas para a diversidade, a SID, pela primeira vez na história brasileira, desenvolveu uma
política cultural para os povos originários, algo que nunca tinha ocorrido no país.

A política cultural diferenciada implicou também em um aumento substancial do orçamento do Ministério, que se aproximou de 1% do orçamento nacional. O orçamento reforçado possibilitou ampliar o Fundo Nacional de Cultura, permitindo contemplar uma maior diversidade de expressões e regiões culturais. A articulação entre diversos ministérios, inspirado no PAC, viabilizou o Programa Mais Cultura, que ampliou os recursos para a cultura, com destaque, para as áreas mais carentes e de maior vulnerabilidade social.

Esta breve exposição das atividades culturais desenvolvidas nos governos do PSDB e do PT aponta nitidamente para dois projetos culturais bem distintos: um que deprime as políticas culturais do estado nacional e deixa a cultura ser regulada prioritariamente pelo mercado e outro que constrói políticas culturais públicas, através do diálogo entre estado e sociedade, visando preservar e promover a diversidade cultural brasileira. A comunidade cultural está convocada democraticamente a fazer sua escolha entre estes dois projetos expressos nas candidaturas de Dilma e de Serra.


Antonio Albino Canelas Rubim
Formado em Comunicação pela Universidade Federal da Bahia (1975) e em Medicina pela Escola Baiana de Medicina (1977), mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (1979), doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (1987) e pós-doutor em Políticas Culturais pela Universidade de Buenos Aires e Universidade San Martin (2006). Atualmente é professor titular da Universidade Federal da Bahia; docente do Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade e do Programa de Artes Cênicas, ambos da UFBA; Ex-Diretor do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA; Ex-Presidente do Conselho Estadual de Cultura da Bahia. Ex-Coordenador do Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura. Pesquisador I-A do CNPq. Autor de livros e artigos em periódicos nacionais e internacionais. Membro de Conselhos Editoriais de publicações em Cultura e Comunicação. Foi diretor da Faculdade de Comunicação da UFBA, por três vezes; Presidente da Câmara de Extensão da UFBA; Presidente da Câmara de Comunicação, Cultura e Turismo da Fundação de Amparo à Pesquisa da Bahia; Secretário de Cultura da Associação dos Professores Universitários da Bahia, por duas vezes, e Presidente da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação. Principais áreas de interesse: políticas culturais; cultura e política; comunicação e política; cultura, comunicação e sociedade.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

DEUS DA CARNIFICINA

Já dizia irmã Selma, personagem de “Terça Insana”: “eu quero muito abrir um orfanato, porque cuidar de criança é uma coisa que relaxa a gente”. Claro que o tom é de pura ironia. Vejo isto agora, com o projeto “Lê Pra Mim?” que estamos desenvolvendo no Rio e em Salvador, ao mesmo tempo. Crianças de diversas culturas se encontrando para ouvir história. E vocês pensam que elas ficam quietinhas? Negativo. É uma gritando mais que a outra, uma batendo e apanhando mais que a outra... porém é verdade que existem os ‘quietinhos’. Estes tramam e incentivam aos pancadeiros a socar o coleguinha no olho certo.

Sobre o tema “como fomos estragados ao longo dos anos”, sugiro a leitura de “Marcas de Nascença”, excelente livro de Nancy Huston que conta a historia de 5 crianças, pela ótica das próprias. Cada uma em sua época, sua década. Dos anos 2000 aos anos 30 – o livro vem de cá pra lá - podemos perceber as marcas que deixamos nas crianças e as marcas que temos hoje.

Em “Deus da Carnificina”, excelente texto de Yasmina Reza, autora francesa premiadíssima mundo a fora, o entrevero entre crianças é o ponto de partida para mostrar as feridas sociais que estamos vivendo, aqui no Brasil, lá na França. É tudo igual. Como os pais estragam e mimam seus filhos, como reagem ao falar deles, a dedicação total e nenhuma às crianças, como a inversão dos papéis de mãe e pai – segundo as “Normas Técnicas” da sociedade em que vivemos – influencia no comportamento das crianças, a falta de limites – tanto de pais quanto de filhos – e a derradeira e lamentável explosão de emoções (ufa!!), está tudo na peça. O texto não se localiza em uma cidade especifica, mas temos a certeza de que a história aconteceu ontem à tarde. Texto é merecidamente premiado e montado mundo à fora.

A direção é de Emilio de Melo, que recentemente foi premiado por “In On It”, atuando ao lado de Fernando Eiras. Em “Deus da Carnificina”, Emilio é rígido com marcas e ao mesmo tempo rígido com cada palavra que os atores estão falando. Tudo é aproveitado. De um simples toque do aparelho celular à desesperada cena de ataque de nervos de uma mãe incompreendida. Até fazer Julia Lemmertz vomitar em cena, ele consegue. Das peças que tenho visto, esta direção, sem duvida, é a que mais se aproxima da perfeição.

Já falando do elenco, Julia Lemmertz e Paulo Betti, Débora Evelyn e Orã Figueiredo são os casais que se confrontam para defender seus filhos e seus interesses. Elenco equilibradíssimo. Todos generosos, sabendo dar passagem ao colega, sabendo olhar no olho, levantar a bola para que o parceiro de palco possa cortar a bola e marcar pontos. Muitos pontos. Julia Lemmertz não desperdiça nem um suspiro. Débora Evelyn cresce ao longo da peça junto com sua personagem, defendida com unhas e dentes. Paulo Betti, como o pai “to-nem-aí” faz a gente ter ódio de aparelhos celulares. Em minha humilde opinião (hoje to humildezinho...) sugeriria ao Orã que não abusasse tanto de sua verve cômica. Claro que ele é brilhante nesta parte, mas o texto não precisa de apelações para ser engraçado. As situações já são suficientemente toscas para que aquele pai não seja tão bufão assim. Não precisa jogar para a platéia rir. Ela já está na sua mão desde o inicio. Adoro Orã desde “Bugiaria”.

Na cenografia, que infelizmente não tenho o nome, existe uma gigante mesa decorada com milhares de peças LEGO, o que nos traz ainda mais para universo infantil, assim como os livros de arte carinhosamente – e psicoticamente – cuidados por aquela mãe que mais parece uma menina adorando seu diário. O figurino, único, é bastante elegante e acerta em cheio para cada personagem. A luz ilustra as cenas apenas para acrescentar brilho ora aqui ora ali, mas sem duvida quem manda é o texto. E a trilha sonora da peça com uma musica no inicio do espetáculo nos prepara para a carnificina que vem a seguir.

Esta peça é para ser vista diversas vezes. Para sairmos do teatro acrescentados. O que estamos ensinando às nossas crianças, o que estamos deixando de legado para o futuro? Que educação recebemos e a que estamos passando adiante precisa ser revista urgentemente. Yasmina Reza, Emilio de Melo, Débora Evelyn, Julia Lemmertz, Orã Figueiredo, Paulo Betti e toda a equipe, ciente disto, dá o que o teatro carioca precisa: a chance de pensarmos e discutirmos o futuro da humanidade. Que carnificina é essa que este Deus para quem (???) todos rezamos diariamente, nos está conduzindo? Somos nós os Deuses da Carnificina?

Aplausos de pé.
Vá ver. Imperdível.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

MARIA DO CARITÓ

O teatro entrou em minha vida, definitivamente, em 1999 quanto fui viajar com a peça “O Casamento de Dona Baratinha” para o interior de São Paulo. À principio eu só ia operar o som durante as apresentações. Quem disse que me foi permitido executar apenas este papel? Montei cenário, contabilizei a bilheteria, paguei as pessoas, passei roupa, recebi o publico, embalei objetos nas malas... nascia um operário do teatro. Ninguém me ensinou. Eu ia fazendo. Deu certo.

Pra quem nunca ouviu esta história, uma solitária baratinha busca um parceiro para se casar, mesmo com sua idade avançada para a época. Longe de mim dizer que Dona Baratinha suborna seus pretendentes, pois tem fita no cabelo e dinheiro na caixinha, mas é bom saber que se está casando com alguém que pensa no futuro. Apesar disto, Dona Baratinha não casa nunca. Esta é a história. Os amores vão, e as amizades ficam, é o lema da peça.

Por falar em Dona Bartinha e em “como tudo começou”, estréio uma coluna de teatro no site Rio&Cultura. Lá teremos uma página com pequenos, mas nem tanto, comentários sobre a cena teatral carioca. Vou sugerir peças, comentar sobre outras, informar o que vem pela frente. Amo teatro e desejo muito que vocês também gostem de assistir.

Voltando ao assunto, Dona Baratinha é uma solteirona, de meia idade, que ainda não se casou. Opa, percebo que isto é o ponto de partida de “Maria do Caritó”, peça em cartaz no Teatro dos Quatro, com Lilia Cabral encabeçando o elenco. Em “Maria do Caritó”, a personagem que dá nome ao título é uma solteirona de meia idade, mas difere da tal Baratinha pois Maria está prometida a um santo, e, portanto, deve morrer imaculada. Pobre Maria. Faz promessas para Santo Antonio, pede ajuda a amigas, faz mandinga, e nada. A cidade acredita na santificação da Maria e cobra dela atitudes e milagres, maleficamente auxiliados pelos cambalachos dos habitantes que fazem uso da idéia dos milagres de Maria para se darem bem.

O texto de Newton Moreno é todo baseado na cultura nordestina. Desde “As Cententárias” que acompanho o trabalho deste autor e considero “Maria do Caritó” sua melhor peça. Mais rica em detalhes, furdunços, metáforas e rica no uso de expressões e comparações inusitadas. Certamente este texto será indicado para um bom premio de teatro.

O cenário do Nello Marrese é um dos melhores já criados pelo artistas. Mistura do circo com teatro, prateleiras (caritó) e elementos religiosos dão aos personagens condições para brincar em cena. Destaco o belíssimo arco móvel formado por bandeirinhas de São João. O figurino de J.C Serroni é lindo e também criativo. Em harmonia total com a cenografia, casamento perfeito. A luz de Paulo Cesar Medeiros é bonita e competente, como sempre é. Gosto da trilha sonora de Alexandre Elias que pontua e ilustra as cenas.

No palco Lilia Cabral é uma atriz que dispensa comentários. Sabe bem como interpretar este tipo nordestino, tem um carisma fenomenal e se entrega totalmente ao papel. Destaco nesta peça Dani Barros com interpretações sempre brilhantes, desta vez se supera ao interpretar a Galinha Damiana. Abraçando Lilia Cabral e Dani Barros estão os competentes Silvia Poggetti, Fernando Neves e Leopoldo Pacheco, cada um dando o máximo de si e se divertindo tanto quanto os outros.

Na direção, João Fonseca, que, desta vez, nos apresenta um trabalho voltado para um circo com atuações. Traz o circo para o palco, leva o teatro para a lona. Tudo ao mesmo tempo. Raras foram as vezes em que vi João não usar de seus costumeiros artifícios (e que sempre dão certo) para dirigir um espetáculo. Desta vez não consegui identificá-los. E isto é excelente, pois teve trabalho! E que belo trabalho. João Fonseca é um diretor que consegue inovar mesmo em linguagens pra lá de comunicativas, como o circo e o teatro. Mais uma vez, meu aplauso de pé e meu carinho.

Posto isto, indico para esta semana a peça “Maria do Caritó”. Um espetáculo que certamente irá ganhar prêmios, mas que sem sombra de duvidas irá mostrar que é possível ir ao teatro, se divertir (e muito!), refletir sobre economia, religião, política, família...

Vá e o teatro, e me chame!
Abraços,
Marcelo Aouila

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

RECOMENDO

Peças que eu vi mas ainda não comentei:
- Maria do Caritó
- Deus da Carnificina
- Pterodatilos
- Siricotico

Espetáculos obrigatórios!

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

A NOVIÇA MAIS REBELDE

Recebi uma ligação no meio de uma tarde de 2004: "Pelo amor de Deus, vai no figurino do Casseta e arruma uma fantasia de freira pra mim?!". Lá fui eu. Claro que com a autorização dos devidos responsáveis, troxe pra casa, e para o amigo, a freira ensacolada. Era para uma perfórmance engraçada num curso de inglês. Ele, professor, vestiu-se dela e deu aula assim, para risada geral da turma, que nunca mais esqueceu a lição, e principalmente de todas as palavras em inglês, que o professor "proferiu" em sala de aula, vestido de freira. Esta história é real. Só não conto o santo, pra não perder o amigo.

Freiras me são (missão??) um mistério (mosteiro??). Talvez pelo segredo de suas orações, por serem "esposas de Cristo", por não terem orelhas (???), por cobrirem a cabeça tal qual a religião islãmica, por serem sempre alvo de piadas, por serem severas, por terem vontade de não serem freiras... sei lá. Woopy Goldberg fez a melhor freira-fake do cinema, em Mudança de Hábito. No teatro, Octavio Mendes criou para Terça Insana, a mal humorada e hilária Irmã Selma. Muito antes dele, versões de Noviças Rebeldes, todas dirigidas por Wolf Maya, tiveram mulheres e até a Cia Bahiana de Patifaria vestindo hábitos. Como de hábito, contribuiram para a comédia bem escrita.

E da Patifaria, que na Bahia significa "brincadeira exagerada", vem Wilson de Santos trazendo a freira mais abusada, e ousada, novamente para o palco. Com auxilio do proprio autor de Noviças Rebeldes, Dan Goggin, surgiu um "solo" desta noviça, a mais rebelde, para continuar a saga das freiras cômicas nos palcos brasileiros.

O texto é uma costura de histórias com piadas, músicas e jogos de diversão. É um standup-comedy misturado com show de humor, dirigido em formato de monólogo de esquetes. O "motivo" desta peça gira em torno de uma palestra que a Madre Superiora irá fazer para alguns fiéis (a platéia). Porém, ela se atrasa, em função da visita de Sarney ao convento. Ok, Sarney é sempre piada. Bigodes, Maranhão... mas na época em que a peça foi escrita (ficando 2 anos em cartaz em São Paulo), ele estava em alta, assim como sua neta e o namorado da mesma, mas hoje em dia, é piada passada. Tem que mudar o político! E isso é moleza para a direção! Os números musicais são simpáticos, com Wilson cantando bem, e se emocionando, com razao de ser. Mas as imitações de alguns cantores é um "já visto antes". Porém, como Wilson é brilhante no palco, têm um diferencial que é a ironia do ator sobre os imitados. A melhor parte da peça fica por conta dos jogos. Não vou falar mais que isso, pois "nós combinamos" que não revelaríamos nada sobre os jogos para aguçar a curiosidade da platéia. Bingo!

Wilson é mestre. Desde A Bofetada que sigo este ator pelos palcos. Até fui à Bahia ver, pela minha 6ª e última vez A Bofetada quando ainda estava em cartaz por lá, em 2005. Adoro Wilson. Me diverte, é engraçadissimo e faz de sua Irmã Maria José uma pândega, carinhosa, simpática, divertida, humana, engraçada e ingênua. Adoro. Eu ri muito quando ele chama a "irmã" que conduz o canhão de luz de "Irmã Miopia"... identificação imediata!

A direção do Marcelo Médici auxilia o espetáculo com seu talento mostrado em Cada um com seus pobrema, e abusa da interação com a platéia, da escolha de um espectador "pra cristo". O povo gosta, mas isso já é feito em comédia desde os tempos em que Costinha era bebê. Nada contra, mas gosto de ser surpreendido. A peça tem uma direção ágil e tudo está encaixando no momento certo. Os altos e baixos de humor são propositadamente estudados para dar uma folga nas bochechas da platéia!

O cenário é uma lona pintada para poder se encaixar no horário das 19h que o Teatro Leblon ofereceu; o figurino é uma freira, claro, com uma surpresa no final; a luz é de comédia, branca, clara e alguns focos; e a trilha sonora traduzida por Flavio Marinho e Wolf Maia completa o show de humor.

A peça diverte. E muito. Gargalhei diversas vezes, mas tudo graças a Wilson de Santos e muitas vezes por causa dos seus muxoxos do que pelo texto propriamente dito. Sou realmente fã do ator. Versátil, bem humorado, engraçado, rígido consigo mesmo, domina o palco como poucos, e agrega todos os olhares da platéia para sí, não deixando a peteca cair um só minuto.

Se você precisa rir "pelos motivos que a vida nos impõe", ou está tão feliz que ri até de fratura exposta, corra para o Teatro Leblon e comece sua noite gargalhando com esta Noviça Mais Rebelde. Depois me conta.

PEDRAS NOS BOLSOS

Trabalhei em televisão e aprendi sobre programas, cenografia, iluminação, produção, como chorar escondido no banheiro, qual é o gosto do sapo que se tem que engolir a seco... E foi, te garanto, muito proveitoso. Os bastidores de uma gravação externa beiram o colapso, o caos. E o resultado a gente vê na Tv. Mas poucos sabem que um figurante ganha R$ 30,00 por dia e um lanchinho, bem "inho" mesmo. Tem os controladores dos figurantes, os famosos fiscais. Geralmente atores figurantes mais experientes que passam "todo o seu talento em ser figurante" para os mais novatos, ou necessitados de 30 contos. Uma agência de "modelos e atores" é contratada para providenciar os figurantes e tudo sob o comando do assistente de direção, o ralador-mor de um set de gravação e filmagens.

Posto isto, está em cartaz no Teatro Poeira, um presente para o espectador carioca, como bem disse a critica do maior jornal deste país. E é mesmo. Um presentão. A história de dois figurantes de um filme rodado no interior, que sofrem com os descasos da produção, com os mandos e desmandos do assistente de direção, as viagens na maionese do verdadeiro diretor e as frescuras e chiliques da estrela do filme. Tudo se passa em 3 dias de filmagem onde, neste tempo, um dos figurantes se suicida se jogando ao rio com pedras nos bolsos, uma vez que descobre que sua vidinha nada mais é do que uma eterna figuração. A realidade foi mais forte que a ficção para ele.

Soma-se a isso, que um dos figurantes tem uma idéia para um roteiro de filme e tenta a qualquer custo apresentá-la para a produção deste filme onde está trabalhando. Claro que nao dá certo, mas no final da peça, a idéia de transformar a vida de figurantes em roteiro de cinema é apresentada como "brilhante"... Menos. Eu já vi essa história e filme antes...

O bom do texto de Marie Jones é a costura. Frases humanas e cruéis, ditas pelos principais personagens, os dois figurantes, sao abraçadas por frases divertidas e caracteristicas de um set de filmagens e nós nos sentimos lá, fazendo parte disso tudo. Um texto muitissimo ágil, bem escrito, inteligente e honesto.

Incrivelmente, só temos dois atores, Luiz Furlanetto e Paulo Trajano. Não tem o melhor. Ambos são perfeitos, usam e abusam de suas vozes e corpos para viverem uns cinco personagens cada um. E haja fôlego! Os dois são incansáveis. Se divertem no palco. E com isso, nós, na platéia, nao piscamos um segundo.

A direção de David Herman, que também assina a cenografia, está enxuta, dinâmica e inteligente, pois usa todo o cenário para dar vida aos personagens. Observamos cada mudança de situação e personagens com clareza, nada ficando sem ser explicado ou mal entendido.

A luz de Wilson Reiz é muito boa, bonita, auxiliando o cenário com gobos de cela de presidio e vitral de igreja. Um casamento perfeito entre cenário, luz e direção. Assim como o figurino simples de Desirée Bastos está bastante adequado e as trocas de roupa são necessárias e rapidas, à vista dos espectadores, que se tornam cumplices da história.

A peça realmente diverte. A primazia dos atores surpreende e não se assustem se ambos forem indicados para algum prêmio de teatro.

Mas... tem sempre um mas. A peça não pega pela emoção. A história é simples, o motivo da morte de um dos personagens é a realidade que bate à porta de sua vida rudimentar, mas a emoção disso não é explorada no texto. Pensei, sinceramente, que fosse me emocionar na peça, e não aconteceu. Talvez pela autora ser irlandesa o seu humor e o seu sofrimento sejam um pouco frios demais para a nossa latinidade.

A peça é um excelente exercicio para toda a equipe e para o público que tem que prestar atenção para não se perder. O que me emocionou de verdade foi a coesão de toda a ficha técnica, a bela produção e o excelente trabalho de atores e direção. Isto sim é um presente para nós que amamos o teatro.

Vá ver. Recomendo.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

A GAIOLA DAS LOUCAS

Historinha simples: casal homossexual, dono de uma boate de shows de transformistas, tem que se virar nos 30 para receber a familia tradicionalissima da namorada do filho. Logo, um deles pede para que o mais afetado suma, o que nao acontece, obiviamente, e entao, tem-se a comédia no palco.

"A Gaiola" é hoje um dos melhores espetáculos de entretenimento da cidade. Tem dança, tem música boa, tem artistas famosos, tem riso e se vc for um pouco emotivo, dá até pra secar uma lagrima abusada. Confesso que aquele amor entre duas pessoas, entre dois pais com o filho criado conforme manda o figurino, apesar de serem dois homens, me comove e faz pensar sobre o futuro dos homossexuais. Até bem pouco tempo, não se falava no assunto. Depois, falava-se à boca miúda. Num passado muito proximo, cansamos de ver artistas internacionais com mais idade "sairem do armário" para espanto das nossas avós. Hoje o homoafetivo está em novela, em programa de talentos e em reality shows. Mas... e daqui a uns 40, 50 anos? Será que vamos nos acostumar a ver o que no passado era chamado ofensivamente de "bichas velhas" andando normalmente na rua sem serem apontadas como "objeto de zoológico"? Quer muito estar vivo para saber como será a vida na Terra onde os homoafetivos serão tratados como seres humanos e não aberrações da natureza. Oremos.

Voltando à peça, ao texto da comédia foram acrescidos números musicais e agora temos rodando o mundo não só a peça, mas o Musical A Gaiola das Loucas. Imagine se em cada cidade os produtores pegassem os numeros musicais dos transsexuais locais e levassem estes numeros ao palco por uma temporada? Não seria o máximo? Pois nao é assim. Infelizmente. Não sei se o objetivo do autor do musical original era esse, mas deveria ser. Afinal a boate "A Gaiola das Loucas" seria um lugar para os shows mais chiques e glamoursosos da cidade. Nesta montagem, no Rio, senti falta disto. Da brasilidade dos números musicais. É muito can can. A coreografia é quase toda centrada ao redor do fosso da orquestra. Imagina se uma bicha daquelas cai em cima dos músicos?

O figurino do Claudio Tovar, eu já disse faz tempo, desde o ensaio aberto, que era para Prêmio Shell. E ele está indicado. A luz, infelizmente não sei de quem é, mas é correta e bonita. O cenário da Clivia Cohen, competente cenógrafa, tem alguns pontos que me deixaram, digamos, inquieto na poltrona. Na casa dos donos da boate, por exemplo, faltou "a cara da riqueza" (como diria Hugo Gloss, personagem do Twitter). Gosto muito da cortina de lurex da boca de cena e de um detalhe colocado nos reguladores laterais e nas bambolinas, que têm uma tira de LED que muda de cor nas cenas. Ja o painel de LED ao fundo do palco da boite Gaiola, onde ocorrem os numeros musicais, as vezes falha durante as cenas e prejudica o trabalho da cenógrafa.

No palco Miguel Falabella e Diogo Vilela estão levando ao publico o que eles querem ver: Miguel e Diogo. Este ultimo se sai um pouco melhor pela sua composição, seu trabalho de corpo, voz e comportamentos de mulher. Ambos cantam muito bem, suas vozes são elegantes e afinadas. Diogo, que já canta em vários musicais, como em Cauby Cauby, empresta todo o talento de ator de musicais para a Gaiola. Na parte cômica da peça, Jorge Maya rouba a cena geral. Desde sua primeira entrada até sua última aparição a platéia cai na gargalhada. UM SHOW! Merecia ser indicado para um premio de ator coadjuvante. Completam o elenco, e também o côro vocal, Silvia Massari e Mirna Rubin, divertind0-se no palco com seus papéis.

A trilha sonora e a direção musical da peça é também outro show. Impossivel nao sair com uma ou outra melodia na cabeça. Os musicos são excelentes.

E, não menos importante, a direção do espetáculo, nas mãos dos competentes Miguel Falabella e Cininha de Paula, é agil e cria muitas vezes no palco uma bela fotografia, que agrada ao publico onde quer que estejam sentados. Sabe-se que muitas vezes temos que apelar para o óbvio no teatro, como na cena do jantar onde numa longa mesa só temos pessoas sentadas em um dos lados, e fica engraçado pois parece que estamos diante de uma entrega de diplomas numa colação de grau. Mas, fazer o quê? É a licença poética para se contar esta história divertida.

Se você ainda não viu "A Gaiola das Loucas" corra para o Oi Casa Grande agora e compre já seu ingresso. É só até domingo... por enquanto. Tomara que voltem em breve.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Blog Bom!

Amigos, está no ar um novo blog que irá fazer críticas de teatro do Eixo Rio-SP.

Recomendo uma visita!

http://claudiogonzagacriticateatral.blogspot.com/

Abraços,

quarta-feira, 14 de julho de 2010

INDICADOS AO PRÊMIO SHELL 2010

FONTE: O GLOBO

A comissão julgadora do Prêmio Shell revelou as primeiras montagens indicadas à sua edição de 2010.Numa lista que contempla as peças encenadas no primeiro semestre do ano no Rio, o destaque fica por conta de “Tomo suas mãos nas minhas”, que recebeu o maior número de indicações, quatro, ao todo: melhor ator (Roberto Bomtempo), melhor atriz (Miriam Freeland), cenário (Fernando Mello da Costa e Rostand Albuquerque) e iluminação (Maneco Quinderé).

“Broadway” no páreo
As adaptações de espetáculos encenados na Broadway não deixaram de figurar entre os indicados. O musical “Gypsy” concorre em três categorias: Totia Meireles disputa o troféu de atriz, e, por melhor figurino, concorre Marcelo Pies. O espetáculo ainda foi indicado na categoria especial (Flávio Salles e Janice Botelho) pela remontagem, pela adaptação e pela criação das coreografias. Outro sucesso da Broadway que concorre este ano é “A gaiola das loucas”, indicado ao prêmio de melhor figurino, de Cláudio Tovar.As indicações por melhor direção no semestre foram para Christiane Jatahy, com a peça “Corte Seco”; Inez Viana, por “As conchambranças de quaderna”; e Gilberto Gawronski, pelo espetáculo “Dona Otília e outras histórias”.Em janeiro serão conhecidos os indicados do segundo semestre e, no início de 2011, os vencedores do Prêmio Shell de Teatro do Rio de Janeiro.

domingo, 11 de julho de 2010

TANGO, BOLERO E CHACHACHA

A minha paixão pelo teatro começou por conta de "O Mistério de Irma Vap". Passado um tempo, a paixão voltou forte quando vi "Os Monólogos da Vagina". Depois dessas duas peças, num dia de domingo, início dos anos 2000, fui assistir aquela comédia que todos falavam maravilhas: "Tango, Bolero e ChaChaCha". O teatro era o Ginástico e só tinha lugar no balcão. Lá fui. Ao final da peça, a paixão, definitivamente estava instalada. Essas três peças são as responsáveis por definir que o teatro é e será eterno na minha vida.

E não é que a peça está de volta? Pois sim, lá no Teatro Clara Nunes. Do elenco da primeira versão só o Edwin Luisi está no palco. Mas se não fosse com ele, não teria a menor graça. Edwin ainda é Lana Lee com toda graciosidade, força, garra e trejeitos de transsexual. Devido a esse nosso mundo agitado, Edwin precisa estar acima do normal, quase uma caricatura de si mesmo. E ele chega lá. É um grande ator. Sabe bem que estar "uma oitava acima" faz parte do que a platéia de hoje em dia, menos exigente, porém mais pobre de cultura, precisa para se divertir.

Maria Clara Gueiros, divertidissima, sabe aproveitar cada palavra do texto para tirar qualquer piada. E as pessoas vão lá para vê-la falar seus bordões conhecidos do programa de humor aos sábados. E se não tiver bordão, a platéia os grita até ele falar! Marcia Cabrita é hilária, totalmente à vontade num papel que aprendeu muito bem no "Sai de Baixo". É recebida pelo publico com gargalhadas. Carlos Bonow defende-se muito bem, com ótimo sotaque italiano e dando o suporte que Lana Lee, quer dizer, Edwin, precisa para brilhar. Miguel Romulo está crescendo como ator. É um grande garoto, terá carreira longa, só não precisa mostrar a bunda! Jorge Fernando já faz isso e o teatro brasileiro não comporta duas bundas concorrentes!!! E isso é uma piada, não é uma critica!! Pode mostrar a poupança a vontade que dá ibope.

O cenário do Marcelo Marques fica prejudicado pela falta de espaço do Teatro Clara Nunes. A parte da sala da casa da familia está muito bem aproveitada, mas quando muda o ambiente, ao fim da peça, os recursos cênicos das cortinas e candelabros, embora belissimos, conseguem dar o ar de casa de shows, mas o resultado é menos satisfatório. E sendo ele mesmo o figurinista, as roupas estão bem confeccionadas, exageradamente lindas para Lana Lee e com algumas "licenças poéticas" como o cachecol no amante italiano que no verão carioca torna-se desnecessário e um ou outro vestido de noite para a personagem de Maria Clara que fico pensando aonde ela iria vestida assim, se num jantar no Golden Room do Copacabana Palace ou uma recepção para um embaixador estrangeiro. O glamour do Rio ja acabou faz tempo, portanto aquela roupas hoje em dia em nossa cidade só mesmo no teatro!

A direção do grande Paulo Afonso de Lima é sempre competente. Aproveita todo o material que lhe é apresentado para transformar tudo em comédia. Usa e abusa de marcas rígidas, cômicas e necessárias. Percebe-se o carinho que ele tem por esta peça, as contribuições para atualizar o texto e a vontade de que tudo dê certo. Claro que também fica prejudicado pelas limitações que o espaço cênico do palco do Clara Nunes impõe. Tanto é que antes do fim da peça tem que utilizar a cortina de boca de cena para trocar o cenário e com isso cria um numero de mágica para divertir a platéia, mas... Fazer o que? As limitações dos teatros são os calos nos sapatos das produções hoje em dia no Rio. Sugiro, que dê uma atenção ao número final da peça, pois algumas vezes não entedemos o que está sendo cantado. E aí, o "grand finale" que todos esperam perde um pouquinho a força.

Deixei por ultimo o texto de Eloy Araujo. Uma das minhas peças de teatro favoritas, como disse no primeiro parágrafo. Gosto desse vaudeville, acho a peça inteligente, bem construida, cujas confusões surgem quando se ouve conversa atrás da porta, ou quando se pensa que a outra parte já entendeu o que está sendo dito, quando o dito é meio-dito. Muitas pessoas hoje em dia não entenderão que dizer "entendido" é se dizer gay. A palavra perdeu força com o tempo, mas a peça nunca foi tão atual, e fácil de ser compreendida, como agora é. O texto envelheceu, mas como canta Danilo Caymmi, "...vinho guardado, é bem melhor, tem mais sabor".

"Tango, Bolero e ChaChaCha" é o que há de melhor no gênero comédia brasileira. Uma referência. Ainda temos o prazer de poder reviver um dos grandes momentos de Edwin Luisi no teatro. Abusadamente digo que esta peça é uma das melhores comédias de todos os tempos. Imperdivel.

sábado, 26 de junho de 2010

A NATUREZA DO OLHAR

Faço parte de um clube literário desde 2002 e a palavra "heterônimos", inventada por Fernando Pessoa, já escuto desde então. Um dos fundadores do Clube da Letra, doutor Antônio Chibante, natural da cidade do Porto, e que viveu na mesma rua que o poeta, é tão apaixonado por Fernando Pessoa, que escreveu um livro chamado "Um jantar com Fernando Pessoa" (Ed. Ao Livro Técnico - 2010) - lançamento dia 28 de junho na Travessa de Ipanema), no qual narra uma "experiência" extra- terrestre (ok, peguei pesado), uma experiência psicografada seria melhor, sobre um jantar de Fernando Pessoa com uma fã. Nesse jantar, eles conversam até mesmo sobe os heterônimos de Fernando e o que cada um traz de bom e ruim sobre Fernando Pessoa.

Está em cartaz no Teatro do SESI, no centro do Rio, a linda homenagem a Fernando Pessoa, a peça "A Naturaza do Olhar", que conta a história do "encontro" entre Alvaro de Campos e Alberto Caeiro, dois "fernandos pessoas" diferentes, dois heterônimos do poeta, que chegava ao requinte de terem formas de ecrever, personalidades e tipos fisicos totalmente diferentes deles mesmos e completamente diferentes de Fernando Pessoa.

O texto da peça é baseado no tal encontro, que de fato é uma troca de cartas, ou "Notas de Recordação para meu Mestre Caeiro", que Alvaro de Campos escreveu (isto é, Fernando Pessoa). A adaptação é de Elisa Lucinda e Geovana Pires que sabem muito bem conduzir o texto a favor do espetáculo. Nada está ali por acaso, tem uma lógica dramatúrgica adaptada para que as "notas" não sejam simplesmente uma transposição das notas para o palco. Tem trama, tem desconfiança, tem suspense, enfim, tem teatro.

A direção é um mix. Daniel Rolim assume uma assistencia de direção e Amir Haddad assina uma supervisão de um texto pra lá de inserido nas almas das atrizes, ocupando bem o espaço cênico, usando a cenografia e o figurino a favor do espetáculo, criando pequenos climas e deixando as atrizes bastante a vontade para conduzirem a peça por um caminho só delas.

O cenário de Colmar Diniz e Maria Duarte é bastante interessante. Sem mais do que necessário, usa dos tons de madeira e areia, é funcional e consegue nos dar a exata dimensão da distância imaginária que cada heterônimo tem do outro, consegue separar espaços, mesmo estando tudo ali ao alcance das mãos. Gosto muito do cenário. O figuirnos também da dulpa é bonito. E a luz eu diria que é um espetáculo à parte. Assinada pelo sempre excelente Djalma Amaral, dá vida ao cenário e às atrizes. Tem uma cena de um luar entrando pela janela que é deslumbrante no palco, entre outros tantos momentos ludicos e coloridos. Palmas de pé para Djalma.

Giovana Pires e Elisa Lucinda contribuem e muito para que estes dois heterônimos sejam conhecidos pelo grande publico teatral. Estão completamente à vontade em cena e saboreiam o texto e as marcas com precisão e prazer. Elisa Lucinda tem uma empatia maior com o público, talvez acostumado com seu tom irônico-divertido conseguido com "Parem de falar mal da rotina" e muitas vezes esse mesmo publico, esperando se divertir com o humor ironico da outra peça, fica esperando ela soltar qualquer piada para dar uma gargalhada histérica. E mesmo assim, Elisa Lucinda consegue fazer seu publico entender que o assunto agora é outro. É poesia, é prosa, é Pessoa. E o público entente isso e embarca na história querendo mais e mais. Geovana Pires é uma cúmplice e sabe que o povo esta lá por causa de Elisa Lucinda e faz desse limão uma limonada, dando ao público lindas intrepretações sobre poemas e poesias do mestre Fernando Pessoa e, ao fim, sendo aplaudida, merecidamente, de pé.

Pra quem gosta de Elisa Lucinda, poesia, Fernando Pessoa e teatro, este espetáculo é a dica boa do fim de semana. Linda homenagem aos heterônimos de Fernando Pessoa. Uma aula de cultura, de pesquisa, de qualidade profissional de toda a equipe.

Abaixo, eu e Fernando Pessoa - Lisboa, fevereiro de 2009.

sábado, 8 de maio de 2010

COLAPSO

Quando comentei que ia trabalhar num certo camarote de uma errada escola de samba, ouvi a seguinte pérola "Rico não tá nem aí pra festa. Eles estão lá para fazer negócios". E era a mais pura verdade. Lá no tal certo camarote, tudo funcionou a contento, do buffet a ida dos ricos para desfilar em seus carros alegóricos. Adoraram. E fizerem vários negócios!

Está em cartaz no Teatro Poeira, sem sombra de dúvida um dos melhores teatros da cidade, a comédia histórico-surreal "Colapso", texto e direção de Hamilton Vaz Pereira. Pelo programa, ele nos conta que a peça foi escrita e reescrita, desta ultima forma que vemos no palco, antes da eleição do Presidente Lula. É sem sombra de dúvidas um texto genial, como tudo que Hamilton Vaz faz (ok, abusei do travra lingua agora). Gosto quando um texto consegue unir o humor inteligente com referências históricas, principalmente sobre a lama em que chafurda a alta sociedade, os politicos e quem domina o país em que vivemos.

O que isso tem a ver com o primeiro parágrafo? Explico: tudo começa, na peça (olha eu de novo sacaneando o trava lingua), numa festa da alta sociedade na casa de Tuta Morvhan, senhora da alta sociedade, casada com um embaixador, amante do sócio de seu marido e, calma nao acabei, amante também de uma aspirante a atriz. Nesta festa (negócios, negócios) eles tramam a venda de armas para o Iraque e uma matança de baleias na costa brasileira. Fora isso, a atriz aspirante faz contatos e chantagem para conseguir verba para seu espetáculo.

Não conto mais nada sobre o texto, pois ORDENO que assistam ao espetáculo. É tudo tão tramado com competência, armado e desvendado com tanta inteligencia sob a batuta da genial direção de Hamilton Vaz Pereira, que fiquei boquiaberto. Destaque para a antológica cena do velório de um dos personages, onde são citados "Frank e Amaury", "Jambert" e outras pérolas dos finados anos 90. Magistral cena que deveria entrar para os anais do teatro brasileiro. Há tempos não ria tanto com tamanha inteligência do que me era dito pelo elenco.

A cenografia de Fernando Mello da Costa é funcional e o figurino de Inês Salgado é excelente. Harmonia de cores em diversas cenas. Belo, rico e criativo. A luz de Jorginho de Carvalho é o que é. Gosto muito da trilha sonora criada por Hamilton, Mario Manga e Iuri Brito Vaz Pereira.

O elenco é de primeirissima linha e excelente qualidade. Ricardo Tozzi e Emanuelle Araújo representam bem seus papeis de escritor em ascenção e atriz aspirante, respectivamente. Ambos estão naturais e a vontade. André Mattos faz um embaixador um pouco acima do tom da naturalidade. E é nas brilhantes atuações de Osmar Prado e Lena Brito que a peça tem seus maiores aplausos. Os dois criam personagens plausíveis e incrivelmente caricatos, com trejeitos e tiques nervosos que dão vida, graça e credibilidade aos seus papéis. São personagens pensados com carinho, com entrega, com competencia. Desses dois, o maior trabalho fica por conta de Lena Brito que consegue nos dar a dimensão exata de uma socialite que passa todos os tipos de creme para ter uma cara jovem, mas os tiques nervosos de uma velha senhora nao negam a idade. Excelente o trabalho de Lena Brito que, por mim, vale uma indicação ao premio Shell de melhor atriz de 2010.

"Colapso" é um titulo que mostra o momento da ruptura entre todas as tramóias, onde as máscaras caem e, como se diz no morro, "a casa caiu", mas nao traduz o que representa de fato o espetáculo. Colapso de relações? Colapso dos jogos de interesse? Até nisso Hamilton Vaz Pereira nos faz parar para pensar. E é aí que ganhou todos os meus aplausos. Adoro ser desafiado no intelecto.

Espetáculo OBRIGATÓRIO. Maravilhos. Brilhante e genial. Parabéns a toda equipe. Se fosse cinema, o bonequinho aplaudiria de pé.

sábado, 1 de maio de 2010

GYPSY

Houve um tempo nos carnavais cariocas em que a Imperatriz Leopoldinense andava ganhando o título de campeã do carnaval. Depois dela, a Beija Flor também teve seu momento "só dá ela". Mas sempre que eu assistia aos desfiles dessas agremiações, ficava a sensação de que, apesar do belíssimo trabalho, do excelente conjunto, da "impecabilidade" do que era mostrado na Marquês de Sapucaí, faltava uma comunicação com o público. O que víamos eram excelentes profissionais trabalhando exclusivamente para ganhar a nota máxima, e conseguiam. E o público... embora agraciado com belos espetáculos, ficava de fora do contexto.

Sem sombra de dúvida, os musicais da Broadway amplamente produzidos pelos excelentes Claudio Botelho e Charles Möller, são jóias raras em nossos palcos desde que começaram a trazer de fora aquilo que achavam que nós teríamos que ver, sem precisar ir até os EUA ou Londres. Eles praticamente quebram a patente do original e trazem para nós genéricos de musicais, que a meu ver são até melhores que os originais. Haja visto "O Despertar da Primavera" e "A Noviça Rebelde". Este último musical abriu o Teatro Oi Casagrande, no Rio e desde esta estréia a empresa Aventura, com a sociedade de Luiz Calainho, mestre nas mídias e marketing, vem com força total na produção teatral musical brasileira.

Assisti a "Gypsy", musical em cartaz no Teatro Villa Lobos, minha sala de espetáculos favorita no Rio de Janeiro que, pela grandiosidade do musical, fica uma sala pequena e apertada para tanto talento em cena. No palco, a velha história do teatro falando do teatro, onde uma "mãe de Miss" acha que só sua filha é talentosa e faz tudo para que ela brilhe. Praticamente um "Dois filhos de Francisco" no palco, dadas as devidas proporções. O texto se desenrola lento e repetitivo. A inventividade da mãe, Mama Rose, é pobre e os numeros musicais criados por ela são sempre iguais: minha filha no meio, rapazes em volta. Até que surge uma vaca-fake e, embora tudo com a mesma coreografia, a vaca dá vida nova ao todo, mas as coreografias que Mama Rose inventa sao sempre iguais. Ao ponto de quando a filha preferida foge, ela coloca a outra filha, a quase-rejeitada, para substituir a fujona com a mesma coreografia nos mesmo numeros musicais.

Até que, graças a Deus, eles precisam se apresentar num bordel. E, graças a Deus, precisam de alguem para fazer streep tease e aí... surge Gypsy, uma das maiores "exibicionistas de corpo" que a América já teve noticias.

O texto nao foge muito dessa história não. Muito recorrente, voltando toda hora para o mesmo assunto, nao chega a ter uma empatia com o publico, pois aquela realidade é muito diferente da brasileira e muito diferente do povo brasileiro. Em nossa terra, é mais fácil uma mãe vender a filha para um prostíbulo aos 8 anos do que montar um espetáculo, dar um trabalho, para a filha ganhar a vida. O texto de Gypsy nao emociona.

Já as músicas, essas sim, completam o texto, ilustram passagem, colorem o texto monótono. Músicas com belissimos arranjos e muito bem interpretada pelos atores-cantores ao ponto da platéia vir abaixo, aplausos calorosos, ao fim de algumas interpretações. Porém não existem aplausos "em cena aberta" para passagens do texto.

Sem sombra de dúvida, depois de "O Despertar da Primavera" este é o melhor musical da dulpa Charles-Claudio. Impecável direção, excelentes traduções das letras, coreografia adequada. Eles trazem para a platéia carioca o que de melhor pode existir em termos de musical para teatro e em "Gypsy" nada fica a dever.

O cenário logo da abertura, onde representa o ensaio de uma peça feita por crianças, é espetacular, mas, depois disso, se repete constantemente nas cenas das casas onde a familia se hospeda, mora, vive. Nessas casas existe sempre uma escada nao utilizada. Por que? Cabe uma exploração maior deste cenário ou nao precisa da escada. Muitas vezes, por causa da grandiosidade do espetáculo, a cenografia opta por descer as cortinas para a mudança do cenário e isso esfria um pouco a cena, mesmo em momentos musicais. Gosto de ver o cenário mudando e isso me distanciou da peça. E, no fim, no Cabaré, quando Gypsy faz sua primeira encenaçao de tirar a roupa, a cena acontece em cortina fechada na boca de cena. Assim como todas as outras exibições. Gosto muito da qualidade dos cenários. São lindos, claro, mas grandiosos demais e pouco explorados.

Figurino impecável. Nada a comentar. Indicação ao Shell garantida. A iluminação também muito boa, mas estranhei os atores estarem o tempo todo sob canhões e os cenários sempre um pouco mais escuro do que eles. Talvez seja a opção da direção em destacar o que a peça tem de melhor: seu elenco.

Falando neles, Patricia Scott Bueno faz uma excelente Sra Cratchitt, uma secretária de um diretor de teatro. Divertidissima e segura. Adriana Garambone tem talento de sobra para defender sua Gypsy, e com o tempo certamente irá ficar mais solta. Garambone é linda, talentosa e canta muito bem, mas a força que Gypsy precisa para enfrentar sua mãe e depois acolhê-la de volta ainda não está totalmente empregada no palco. Eduardo Galvão empresta-se para Herbie, produtor e fururo-marido de Rose, com total despudor, carinho, doçura e um quase-infanto-apaixonado. Muito bom. Destaco também Liane Maia no papel de Tessie Tura, mas me pareceu que neste dia era outra atriz, a Marina Santos...

Tivemos uma cena antológica no teatro musical para o número de dança, canto e sapateado do personagem Tulsa ("Só Me Falta o Meu Par"), que no programa nos diz que André Torquato é o interprete. Faz tempo que nao vejo um ator tão preparado, pronto e incrivelmente dedicado desde tão cedo ao seu oficio. Me emocionei mesmo com esta cena ao ponto de ter q respirar fundo para que as lágrimas não tomassem conta de vez de tanta emoção. Lindo trabalho, belissima entrega. Parabéns ao ator.

Sem sombra de dúvidas, Gypsy nunca foi e nunca será páreo para sua mãe Rose. A garra de Mama Rose, a vontade de que tudo saia perfeito, as inspirações e insights que Rose têm junto aos seus filhos, carreira, futuro marido ficam claramente explicitadas pela garra, carinho, dedicação e competência de Totia Meireles. Gypsy é um musical para Totia. Vemos a vibração de suas mãos, seus olhos brilhando, seu corpo totalmente entregue, seus graves e agudos saídos do útero. Totia é uma atriz que sigo sempre, pois além de linda, canta que é uma beleza e neste musical nao fica atrás, pelo contrario, digo que é seu melhor papel até hoje no teatro. Por mim, a indicação ao premio Shell de teatro e, logicamente a vitória, é dela.

Gypsy é teatro que fala de teatro, fala de garra e dedicação. E é isso que a dupla Claudio-Charles nos mostra. Um espetaculo competente, corretissimo, lindissimo, super-produção, um exemplo de como se fazer teatro. Porém a plateia, mesmo boquiaberta com tudo que vê, sai do teatro sem cantarolar uma musica, sem ter participado daquela história, sem ter se inserido naquele contexto.

É um espetáculo obrigatório pela qualidade que está nos sendo apresentada no palco. Excelente produção que me orgulha de dizer que é carioca! Não perca.

( http://www.gypsymusical.com.br)