quinta-feira, 7 de abril de 2016

A CUÍCA DO LAURINDO


A primeira quadra de escola de samba que entrei foi da Estação Primeira de Mangueira. Que prazer! Inesquecível.  Tal foi a alegria daquele dia, onde teve até o Cordão da Bola Preta, que me apaixonei pela escola, sem, jamais, esquecer o amor pela minha Portela. É com grata surpresa que, ao ler o programa da peça A Cuíca do Laurindo, descobri que em Mangueira também havia outras agremiações carnavalescas, num passado bem distante. Mangueira, teu cenário é uma beleza!

Está em cartaz no Centro Cultural do Banco do Brasil o musical A Cuíca do Laurindo, idealização e texto de Rodrigo Alzuguir, que também assina o roteiro musical. Que beleza da história criada por cima de uma história criada por dentro de uma poesia musicada! Laurindo, tocador de cuíca, domina a agremiação, mas é convocado para guerra. Vai e volta diferente. Uma fatalidade (ou seria algo premeditado?) tira Laurindo de cena. Como descobrir a verdade? Terá Laurindo sido assassinado? A história é narrada em prosa e canções, onde as músicas também são instrumentos de fluidez do roteiro. Um trabalho de pesquisa e compilação de alto nível e ótimo resultado.

A direção de Sidnei Cruz acerta bastante na movimentação dos atores pelo palco, utilizando-se das escadas do cenário, ora de fuga, ora de cena, para dar agilidade e glamour ao musical. Cenário de José Dias no leva até a Mangueira,  com escadas e patamares entrelaçado por telhas de plástico que ora nos remete à favela e ora reflete a luz no palco auxiliando os números musicais. O figurino de Flávio de Souza é de excelente qualidade e bom gosto, carinhosamente amparado nas cores rosa, roxo, vinho, verde escuro, vermelho, bastante adequados à época retratada. Gosto muito também da iluminação de Aurélio de Simoni e a direção de movimento de Ana Paula Bouzas.

O elenco é ótimo. A começar por Alexandre Rosa Moreno, o protagonista de uma história que mistura comédia, musical, chanchada, melodrama e espionagem, Alexandre vive Laurindo com competência. Cláudia Ventura, como sempre muito bem, afinada e esperta, é daquelas atrizes que presta atenção em tudo ao mesmo tempo. Ajuda colega, corrige posição, faz o seu, canta, dança, representa e ainda sobra! Hugo Germano é o comediante do espetáculo, trazendo para a cena a gingada do malandro carioca e a qualidade do bom ator. Marcos Sacramento é Dodô, personagem da comunidade que todos respeitam. Inegável seu talento de cantor. Rodrigo Alzuguir é Zé da Conceição e o detetive Hercule Perrier, conseguindo fazer dois papéis importantes totalmente diferentes um do outro. Vilma Melo, a Zizica, mulher que vive para seu amado Laurindo, tendo deixado a vida artística de lado, está ótima. E, não menos importante, porém, para mim, uma gratíssima surpresa, Nina Wirtti interpreta uma jornalista estrangeira e uma dançarina de cabaré. Céus, que voz linda e afinação tem Nina! É de ficar boquiaberto quanto Nina canta.


Exagerei nos elogios. Mas A Cuíca do Laurindo merece. Além de ser um dos poucos musicais do teatro com um ator negro como protagonista (tão esquecidos pelos prêmios de cinema e teatro), nos traz um pouco da cidade do Rio de Janeiro do passado e presta uma homenagem ao centenário do samba. Os números musicais, cuja direção e arranjos são de Luís Barcelos é uma grande oportunidade de se conhecer o melhor do samba carioca, com uma turma que sabe muito bem onde quer chegar: apresentar um produto nacional de excelente qualidade. Vá já ao teatro assistir a este belíssimo e competente trabalho da Marraio Cultural! Viva A Cuíca do Laurindo!