quarta-feira, 1 de agosto de 2018

ELZA



Elza. Custei a escrever, pois o que assisti, na semana passada, no Teatro Riachuelo, foi impactante.

Elza.  Estamos vivendo um momento especial com O Pequeno Príncipe Negro, musical para crianças, a todo vapor num teatro do centro do Rio. O espetáculo Contos Negreiros do Brasil esteve em cartaz até bem pouco tempo no Rio com casa lotada. Dona Ivone Lara terá um musical contando sua vida em breve. Simonal já foi retratado, bem como Cartola. Apesar dos pesares dos governos atuais – municipal, estadual e federal – querendo acabar com todas as formas de arte e expressão cultural, a resistência e a resposta está sendo dada pelos artistas.

Elza. Vinícius Calderoni assina o texto deste musical-homenagem à cantora Elza Soares, onde ficamos sabendo de como sua vida foi sofrida e da capacidade de Elza se reinventar, levantar a poeira e dar a volta por cima. Sem a obrigação de contar a vida como uma biografia escrita, Vinícius pegou passagens mais que importantes na vida da cantora e costurou um roteiro recheado de sucessos. Com citação a Marielle, faz discurso político positivo, agrega raças, enxota o racismo. Para uma artista ainda viva, trabalhando, ativa e com grande sucesso nas rádios e mídia, é um acerto. Pra que falar de coisas que possam magoar a cantora? Pra que tocar nas feridas que ainda possam estar abertas e sangrando? O que precisamos hoje em dia é de mais amor, por favor, e Vinícius faz isto. Diz o que interessa sobre Elza e presta uma homenagem. E quem quiser saber das fofocas, que busque nos livros ou pergunte à própria cantora!

Elza. No palco, as atrizes cantoras Kesia Estácio e Khrystal ganharam números musicais que levam a plateia ao delírio. Janamô, Júlia Dias, Verônica Bomfim e Lais Lacôrte são também Elza, cada uma ao seu momento, compondo com competência e qualidade o elenco de 7 mulheres, sete vidas da cantora. E é Larissa Luz a responsável pela composição mais parecida com Elza verdadeira. No timbre vocal e nos arranhados característicos. Uma beleza de composição, afinação e interpretação. Impossível não chorar.

Elza. Corpos diversos em movimentos, ora acelerados, ora escondidos por latas, têm na cenografia André Cortez e no figurino Kika Lopes e Rocio Moure um apoio fundamental para a beleza do musical. O cenário tem ao fundo um palco formado por latas prateadas com um tablado por cima e um painel. Ainda descem do teto adereços que enriquecem aos números musicais, junto com os carrinhos de mão que permitem ótima movimentação cênica. O figurino é maravilhoso! O inicio genial com todas da cor da lata, passando para o colorido extremo e terminando com o brilho cor-da-pele-dourado. Moderno, criativo, belíssimo! Iluminando tudo isso a generosa e certeira luz de Renato Machado. Uirandê de Holanda faz o visagismo das atrizes. A direção musical de Pedro Luiz, com arranjos de Letieres Leite, é belíssima. Elogiar é uma forma de continuar aplaudindo a eles e aos músicos.

Elza. Duda Maia, é a diretora. Incansável seu trabalho. Detalhista. Duda consegue fazer deste espetáculo um marco no teatro carioca. A modernidade empregada não só nas marcações, como movimentação dos corpos, quase um balé coreografado minimalista, faz com que fiquemos sem piscar um segundo aguardando o próximo número musical, a próxima parte da história, a próxima caída-e-levantada na vida de Elza. Destaque para o número em cima de carrinhos que juntos ou separados preenchem o palco. Usando os objetos, Duda coloca os homens sobre latas, lata escondendo rosto, latas nos peitos das mulheres, latas nos pés, um imenso turbante na cabeça da cantora coroando todo o talento de Elza... Poderia ficar horas escrevendo sobre a maravilha de direção, mas prefiro te convencer a correr para o teatro e assistir ao musical Elza.

Elza. Impactante, moderno, criativo, econômico, delicado, necessário, brasileiro, forte, respeitoso, completo. São estes os adjetivos que me chegam após digerir tudo aquilo que foi vivido no palco, com a presença da própria Elza Soares na plateia. Que momentos, senhores! Que momento! Aplausos para Andréa Alves pela garra e imenso talento em nos trazer os melhores trabalhos culturais. Aplausos de pé para toda a imensa equipe. Vida longa ao espetáculo!