terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

NOVOS BAIANOS



     Sentado na poltrona do teatro, meu programa predileto, pensei: quem está fazendo boa música no Brasil de hoje? Quem tem carreira construída, sólida, com melodia de qualidade, letras sonoras com conteúdo? Alguns nomes: os fenômenos Duda Beat e Tiago Iorc, a voz do norte de Gaby Amarantos, os jovens talentosos Jão e Maria Gadú, o rock de Pitty e As Bahias e a Cozinha Mineira, o extravagante Johnny Hooker. Uma geração mais acima temos ainda compondo com nível alto Carlinhos Brown, Vanessa da Mata, Ana Carolina e Isabela Taviani. E é preciso incluir neste pensamento os mega sucessos dos artistas Anitta e Pabllo Vitar que exportam o Brasil dançante de bundas e molejo. O Tio Sam está querendo conhecer a nossa... raba! Não sou apreciador de funk ostentação sexual – que gruda na cabeça – nem tampouco sertanejo de um acorde só com pitadas de sofrência e rimas fáceis e pobres.
       Veio de São Paulo, com temporada de sucesso e algumas indicações a prêmios, o musical Novos Baianos, em curta temporada carioca no Teatro Riachuelo. O bom texto de Lucio Mauro Filho faz um recorte na vida dos principais integrantes do grupo. Ficamos sabendo como se reuniram, onde moraram, quantos filhos, quais musicas fizeram, como ganhavam a vida e, principalmente, invejamos a sua liberdade e amor à música. Se em tempos de ditadura eles eram livres e faziam músicas maravilhosas, onde foi parar aquele brasil musical de alto nível? Ausência de referências? Não. Emburrecimento da população? Talvez. Os tempos mudaram. Eis aqui um registro cultural da época.
       Dirigindo este ótimo musical, Otávio Muller opta por uma liberdade cênica, pois tem em mãos talentos novos da arte cênica, provando que mais vale um encantamento visual pela simplicidade e valorizar as vozes e a história, do que se basear em firulas tecnológicas para contar uma história onde os protagonistas amam o simples. Destaque para a cena das mulheres cantando na boca de cena e Baby atravessando um disco voador. Ah, e é emocionante sentir o mar passando por sobre as cabeças da plateia e virando céu azul no palco.
       A direção de arte, cenário e figurino de OPAVIVARÁ! merecem todos os aplausos. Roupas coloridas com bom gosto, cenário simples e criativo, com destaque para as redes, o disco voador, as lampadinhas de led e os mini-trios-elétricos. Harmonia visual com elegância e talento. Na luz, Monique Gardemberg e Adriana Ortiz dão show. Vale destaque também a coreografia de Johayne Hildefonso e Gisele Bastos.
      Ninguém melhor que Davi Moraes e Pedro Baby na direção musical. Frutos do amor livre, nascidos em berço musical, têm no DNA, e ainda pulsa nas veias, o que de melhor tem a Música Brasileira. A reprodução fiel das músicas, do jeito que aprendemos a cantar, sem firulas e sem medleys, ajuda a contar a história e embeleza o espetáculo.
      O ótimo elenco tem Ravel Andrade como o poeta e narrador da peça Luiz Galvão, Barbara Ferr linda e talentosa se emprestando para Baby Consuelo (canta que é uma beleza!), Felipe El como Moraes Moreira, Filipe Pascual como Pepeu Gomes, Gustavo Pereira como Paulinho Boca de Cantor, Julia Mestre como Marilhona, Clara Buarque como Leilinha, João Moreira como Dadi, Miguel Freitas como Jorginho Gomes, Mariana Jascalevich como Marilhinha, João Vitor Nascimento como Gato Feliz e Beiço como Chacrinha. Um elenco unido, seguro, que canta bem, atua com competência e, acima de tudo, tem grande comunicação com o público.
     Chorei bastante durante a peça. Cantei quase todas as músicas. “Acabou Chorare”, número musical logo após a citação de João Gilberto, padrinho e professor da turma, foi um vale de lágrimas! Lágrimas de alegria, “saudade do que não vivemos”, ânsia que esta onda nefasta passe logo... E tudo acabou em “Besta é Tu” e saímos do teatro dançando. Corra pro Teatro Riachuelo e não perca este ótimo musical sobre o que há de melhor na nossa música. Aplausos de pé.

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