quinta-feira, 18 de agosto de 2022

A PLEBE DO CORIOLANO


É inegável que, no momento atual, o assunto de todas as rodas seja “política”. Impossível não falar, respirar, sentir, sofrer sobre este assunto às beiras do primeiro turno de uma das eleições mais importantes do nosso país. Depois das Diretas Já, com a primeira eleição para presidente em 1989, esta, de 2022 é a segunda mais importante e simbólica.

O livro “Como as democracias morrem” fala sobre como as democracias tradicionais entram em colapso. Os autores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt - professores de Harvard - comparam o caso da eleição de Trump com exemplos históricos de rompimento da democracia nos últimos cem anos: da ascensão de Hitler e Mussolini nos anos 1930 à atual onda populista de extrema-direita na Europa, passando pelas ditaduras militares da América Latina dos anos 1970. O alerta do livro: a democracia atualmente não termina com uma ruptura violenta nos moldes de uma revolução ou de um golpe militar; agora, a escalada do autoritarismo se dá com o enfraquecimento lento e constante de instituições críticas - como o judiciário e a imprensa - e a erosão gradual de normas políticas de longa data.

Por acaso... assim como quem não quer nada... estamos vivendo isto, exatamente neste momento, no Brasil? Cartas para a redação.

Precisamos escolher entre a barbárie e a democracia. Não basta eleger um presidente com “P” maiúsculo, é preciso se atentar para o legislativo. Quem faz as leis: deputados – federais e estaduais – e senadores. Temos que eleger pessoas que se preocupem efetivamente com o povo que, neste momento, passa fome, é discriminado, morto por balas perdidas, marginalizado. Já volto ao discurso político. Pausa para algo importante: teatro.

Está em cartaz no Espaço Cortiço Carioca, na simbólica Lapa carioca, uma versão das obras de William Shakespeare e Bertold Brecht que têm o personagem Coriolano como protagonista. “A Plebe de Coriolano”, texto de criação coletiva, que bebe na fonte dos dois autores famosos, propõe uma inversão de protagonismo: o povo tem voz narrando os acontecimentos ocorridos com o general romano Coriolano.

Extremamente oportuna, a montagem tem adereços e ótimos figurinos criados pelo grupo e direção musical de André Poyart bastante pontual e importante. Destaque para o excelente samba enredo “Samba da Plebe de Coriolano” (letra de Xando Graça e música de André Poyart).

A direção de Adriana Maia é inteligente e criativa. Usa todos os espaços possíveis e imagináveis do Espaço Cortiço Carioca para dar vida, voz e movimento ao espetáculo. Ótimas as intervenções na escada, nas entradas e saídas das salas/quartos laterais, e todo o comportamento cênico dos atores. Destaque ainda para a perfeita utilização dos objetos de cena e o completo domínio da palavra pelos atores. Falas sem pressa, com precisão.

É o numeroso elenco que brilha nesta peça-show. Em ordem alfabética, Ana Achcar, Anna Wiltgen, Angelo Bessa, Aramís Correia, Gilberto Góes, Henrique Manoel Pinho, Mariana Consoli, Miguel Ferrari, Paula Muricy, Stefania Corteletti e Xando Graça, cada um a seu momento, tem a presença marcada, forte e segura. Estão ali defendendo não só seus papeis, como valorizando o fazer teatral, e, mais que isso, dando voz à democracia. Tenho meus personagens favoritos, mas prefiro que você assista e escolha os seus!

Não poderíamos ter melhor momento para levar este trabalho ao público. Mostrar como a escolha de um congresso competente é também de suma importância para nosso país. Após a apresentação, tivemos um bate-papo com atores, publico e quem mais lá estivesse. Cada um pode falar sobre sua visão do momento e sobre a urgência das boas escolhas nas próximas eleições.

Votei para presidente, com 17 anos, pela primeira vez em 1989, junto com minha mãe, aos 44 anos – também primeira vez - pós ditadura.

Faço votos que “A Plebe de Coriolano” fique em cartaz por muito tempo, para que os indecisos, os que não ligam para política, mas amam teatro, possam avaliar a importância de espetáculos como este para nossa democracia, nossa cultura, nossa arte. Agradeço a oportunidade de assistir a um trabalho tão rico e necessário. Aplausos de pé!

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