quinta-feira, 24 de outubro de 2019

O AMOR EM TEMPOS DE BOSSA NOVA



     Na minha casa sempre se escutou de tudo. De tudo que era bom, diga-se. Havia rodas de música com amigos, as crianças ficavam na sala participando. Na casa de praia, reuníamos na varanda. Na casa dos tios, no terraço grande. Sempre tinha teclado e violão. Outros parceiros apareciam e completavam a banda.  O grupo vocal nunca teve nome, mas cantaram em festas dos outros, restaurantes, aniversários da família, fim de semana na região dos lagos... e assim eu fui crescido e criado dentro das melhores músicas brasileiras.
     Comemorando 60 anos do gênero, Iza Eirado convidou Aloisio de Abreu para escrever uma história de amor em tempos de Bossa Nova. Daí surge, no teatro I do CCBB esta comédia romântica – O Amor em Tempos de Bossa Nova – onde a história de um casal, idas e vindas, desde o primeiro olhar até o reencontro final são embalados por canções, paródias, textos com rima, prosa poética. Aloisio é craque nisso. Consegue nos apresentar um texto leve e divertido, com conteúdo, referências históricas e atuais, mantendo o ritmo de curiosidade da plateia até o fim: será que vão acabar juntos? Qual a música vão usar neste momento?
     No palco a cenografia do mestre José Dias é um telão na frente com videografismo de João Maia. A projeção não só ilustra como emoldura as cenas. Figurinos de Tiago Ribeiro vestem com elegância e harmonia o casal. A luz de Daniel Galvan é bonita, respeitando a projeção e a elegância com simplicidade do tema.
     Na direção musical, Maurício Gueiros nos traz o melhor do trio da bossa nova: piano do mestre Itamar Assiere, baixo de Zé Luiz Maia e bateria leve e segura de Diego Zangado. Um tio baterista uma vez me mostrou que o bom instrumentista é aquele que acompanha a música e não concorre com os colegas nem com o cantor, e este trio é mais que nota dez. Um deleite vê-los em cena tocando e homenageando a Bossa Nova. 
     Na direção, Walter Lima Júnior nos apresenta um espetáculo bonito, simpático, delicado, leve, engraçado, que presta uma justa e bonita homenagem aos 60 anos do gênero musical. Destaque para o bonito o início da história na lua, com os personagens andando em compasso de gravidade lunar e para os números “banquinho e violão” dos atores na boca de cena. 
     Iza Eirado vive a mocinha que se apaixona pelo belo rapaz, vivem um romance, mas aí... no bom estilo voz rouca de  Bonnie Tyler com pitadas de Nara Leão, Iza é carismática, desenvolta e interpreta as canções como se estivesse realmente vivendo as histórias. Aloisio de Abreu é sempre um show-man. Escreve, canta, dança e representa como poucos artistas brasileiros fazem. Assisti-lo em cena é sempre uma aula de elegância, respeito ao colega, bom humor e diversão.
     O Amor em Tempos de Bossa Nova agrada muito pela qualidade do texto, pela calma e pelo tom das interpretações musicais. Não há grito, não há sofreguidão, não há vibrato, poucos melismas (que aprendemos com o The Voice). Há clareza, respeito ao som. É uma peça onde os cantores, assim como na bossa nova de João Gilberto e Nara Leão, cantam para si, em lugar da valorização de “grande voz” da época de ouro do rádio. O musical diverte o público, que fica em silêncio, canta baixinho, mas quando é solicitado participa com vontade! Como já disse, um espetáculo leve e divertido para tempos de nervos à flor da pele... Viva a Bossa Nova!

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