Um dos meus primeiros trabalhos em produção foi sendo
assistente no infantil A Bela e a Fera. Fui conhecer a peça na estreia. Me
encantei pela montagem, que ficou em cartaz por 6 meses no Teatro dos Grandes Atores,
na Barra. Meus personagens favoritos eram o Relógio, a Vassoura, o Candelabro e
o Gaston. Este último, um machão que tentava a todo custo roubar à força o
coração da mocinha Bela. Coitado. Era um vilão atrapalhado. Ainda mantenho contato com esses 4 atores. O Relógio, sempre que o encontro digo:
você vai ser meu Willy Wonka quando eu montar A Fantástica Fábrica de
Chocolate. O Candelabro virou surfista. A Vassoura continua na luta para ter
seu talento reconhecido. E o Gaston, bem... este ator era ninguém mais, ninguém
menos, que Mateus Solano. Desde aquela época o seu talento já era reconhecido
por todos que assistiam ao espetáculo. Mateus deveria ter uns 20 anos. Já era
um grande ator. Seu trabalho em cena era muito elogiado. Virei fã desde
então. Sempre que ele está no palco, estou na plateia.
“Do tamanho do mundo” está em cartaz no Teatro do espaço Tom
Jobim, no Jardim Botânico. Um certo dia um homem acorda, vai para o jardim e
cai. Suas pernas não lhe obedecem. Seu lado esquerdo não lhe respeita. Custa a
se levantar, se posicionar na cadeira. Até que chega sua mulher e ele tenta
convencê-la do ocorrido. A partir daí, este homem começa a viver diferente.
Está mais preocupado com o aproveitar os momentos da vida do que com a rotina.
Se questiona ao ponto de perguntar à mulher se ele gosta ou não do amigo que
irá jantar lá aquele dia. Já a mulher não entende patavinas e também começa a
se questionar sobre esta nova relação com seu “velho” marido. Está ali o tema
principal da peça: devemos nos render à rotina deixando para aproveitar o mundo
apenas nas férias contadas de 30 dias ou devemos tirar umas “não-férias” e sair
por aí enquanto durarem os estoques financeiros até que se tenha a plenitude da
vida a ser aproveitada?
O texto é bastante ágil e o mérito é todo de Paula Braun.
Muito inteligente, o narrador nos convida a entrar no questionamento sobre a
vida, nos adestra para perceber o rumo da história e depois este mesmo narrado
entra para bagunçar ainda mais aquele coreto. Cabe a nós decidirmos o “e o que
vem depois” do fim da história. Gosto muito da fluência e competência dramática
deste primeiro texto da Paula. Me lembrou um pouco aquele realismo fantástico
que Aguinaldo Silva usava em suas novelas como Fera Ferida, A Indomada, Pedra
Sobre Pedra. Uma beleza este texto de “Do tamanho do Mundo”!
O cenário de Cristina Novaes é ótimo! A parte de lazer de
uma casa de classe média alta mostra ainda mais que a rotina impede que se
tenha a plenitude dos pequenos prazeres da vida, como beber um vinho no café da
manhã às 4 da madrugada! Gosto muito das portas e entradas e saídas como se fossem
“lá dentro de casa”. Um cenário lindíssimo! Gosto também do figurino de Antônio
Medeiros, bem como a luz de Felipe Lourenço que nos mostra perfeitamente a
passagem do tempo, da manhã até a noite. Não posso deixar de falar também na
interessantíssima preparação corporal, principalmente do Mateus e suas tentativas
de se levantar do chão, no momento em que suas pernas não obedecem. Ponto para
Toni Rodrigues.
Jefferson Miranda é o diretor. O espetáculo tem uma ordem,
uma organização, e é tão limpo que observamos a direção de Jefferson nos
pequenos detalhes (que invariavelmente acabam na gargalhada da plateia).
Jefferson tira partido de tudo de excelente que tem em mãos: elenco, cenário,
luz e texto.
O elenco pra mim é um dos mais afiados e entrosados dos últimos
tempos. Alcemar Vieira é um narrador/parceiro da plateia. Ele nos representa na
condução da história. E Alcemar fraz com perfeição. Isabel Cavalcanti
interpreta uma tia totalmente descompensada, um ótimo senso de humor e verve
cômica que enriquecem o espetáculo nos momentos em que rivaliza a sua
interpretação com a tensão da cena marido-mulher em que ela, a tia, nem percebe
o climão. A dupla de protagonistas, Karine Teles e Mateus Solano, da um show!! A
naturalidade de Karine e sua personagem Marta é incrível! Sua fragilidade
diante da mudança de comportamento do marido, seu ódio contido ao falar no
telefone com uma cliente quase histérica, é de uma beleza, uma naturalidade,
que me fez ficar de boca aberta. Tenho certeza que qualquer lista de melhores
atrizes de 2013 haverá o nome de Karine Teles escrito. Não esqueçam este nome.
E, não menos importante, Mateus Solano. Tudo já foi dito
sobre seu talento, sua credibilidade, sua competência e a capacidade de escolher
textos que são à altura de seu compromisso com a arte de representar. Seria uma
piadinha infame dizer que o talento de Mateus é “do tamanho do mundo”, mas me
permito fazê-la. Graças a Mateus e sua composição de Arnaldo, fiquei com vontade
de fazer igual e passar o resto da vida sem sapatos, de malas feitas e
viajando para conhecer o mundo e pessoas.
É um grande prazer assistir ao crescimento de um ator que
vimos despontar nos palcos e tivemos a oportunidade de fazer parte da sua vida
por alguns poucos meses. Me sinto honrado por poder abraçar o Mateus (ainda mais
neste momento de grande evidência televisiva). Mais prazeroso ainda é ver a competência
e capacidade técnica de atores, autora, direção e equipe unidos a favor do bom
teatro, aquele que deixa a marca e transforma o espectador.
Tenho elogiado muito os espetáculos assistidos
recentemente. O mérito é todo deles. Felizmente os palcos cariocas dispõem,
neste momento, de belíssimos trabalhos de atores, diretores, cenógrafos,
técnicos, iluminadores, figurinistas, diretores de movimento. Pode parecer
chato ler sempre aplausos e elogios. Mas se o patrocínio não é suficiente, nem
o arrecadado com as bilheterias, que possamos abraçar os profissionais, aplaudi-los,
para que mantenham o Teatro brasileiro em excelente forma!
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