Certa vez, um profeta e seu discípulo andarilhos, pediram
pousada em uma das residências. No jantar, serviram apenas um copo de leite.
Era a única coisa que o dono da casa tinha para oferecer, embora todos que ali
moravam fossem pessoas saudáveis. A terra era boa, tinha bastante área para
plantio, porém a família nada cultivava. Possuíam apenas uma vaca leiteira, de
onde vinha o leite que sustentava toda a família. Pela manhã, o profeta e o
discípulo levantaram, agradeceram a hospedagem e continuaram a viagem. Um pouco
adiante da casa, viram que a vaca pastava à beira de precipício. O profeta,
então, ordenou ao discípulo “Vá até ali e empurre a vaca para o penhasco”. No
dia 13 de maio próximo completam 5 anos que fui demitido da Tv Globo. Jogaram a
minha vaca do penhasco aquele dia. E a minha vida prosperou, tal qual a vida
daquela família da vaca, que você pode ler o fim da história no link: http://rosyaguirre.blogspot.com.br/2010/11/fabula-da-vaca-e-do-precipicio.html
Felicidade é o título do espetáculo de Cristina Fagundes, em
cartaz no Teatro Maria Clara Machado, no Planetário da Gávea. Quatro pessoas à
beira da morte (a vaca no precipício) têm uma chance de mudar, em 24 horas as
suas vidas. Diferente da fábula de vaca, os personagens à beira do fim têm
a chance de encontrarem a Felicidade para poderem continuar vivos. O marido
banana, a idosa apaixonada, a criança culpada e o músico taxista são obrigados
a se livrarem de suas dores, culpas, medos, para que encontrem a felicidade e
busquem uma nova vida. Aquela que realmente os faça sair da zona de conforto,
que não os agrada, para seguirem em outro rumo, que os faça feliz.
No palco, a cenografia de Paulo Denizot e Janaína Wending é
composta apenas por bancos de madeira, uma cortina transparente ao fundo e
quatro emblemáticos relógios. Assinando também a iluminação, Paulo Denizot
completa a sua cenografia com apoio da luz, e ainda faz ótimos recortes no
palco, separando cenas da peça. O figurino de Lua Monteiro está de acordo com a
classe econômica de cada personagem. Importantíssima é a trilha sonora de
Flavia Belchior e Cristina Fagundes, bem como a narração de Clarice Niskier. Ótima
também é a contribuição de Duda Maia para a direção de movimento, auxiliando a
direção do espetáculo.
Cristina assina o texto e a direção. Temos um pedacinho de
Nelson Rodrigues em certas cenas, o que me fez gostar mais ainda, pois sou fã
de Nelson. As quebras na narrativa são bem estudadas e conseguimos acompanhar
os quatro momentos dos personagens sem nos perdermos no jogo de cena proposto.
Gosto muito também dos momentos em que todos se lembram da “ordem” de
conseguirem a felicidade em 24 horas e suspiram assustados em conjunto.
Destaque para a linda cena da idosa rezando e ao fundo os outros 3 atores
imitando imagens sacras.
Ana Paula Novellino, como a menina e a mulher
dominadora; Bruno Bacelar como a idosa; Jorge Neves como o músico taxista e o
sogro; e Renato Albuquerque como o marido banana, estão igualmente muito bem em
seus papéis, com destaque para Ana Paula e Jorge que fazem dois personagens
completamente diferentes e Bruno que interpreta uma idosa convincente, sem
caricatura nem pieguismo. O conjunto funciona muito bem no palco. Atores generosos, sabendo interpretar na
medida certa o que cada papel pede, sem exageros, sem criticas, apenas
emprestando seus talentos aos personagens. Mérito também da diretora/autora.
Quem nunca pensou em mudar de vida, jogar sua vaca no
penhasco, sair da zona de conforto? As vezes se você mesmo não se joga, a vida
te dá um empurrão. Sinto falta dos amigos da Tv Globo, mas nenhuma falta do
trabalho que lá realizava. Sou grato à Vênus Platinada, não me canso de dizer.
Jamais traí sua confiança por ter me ensinado sobre cenografia e televisão. Sou
hoje um profissional das artes graças ao empurrão que deram na minha vida, na minha
vaca, para o precipício. Assista ao espetáculo e tome fôlego para, ao sair,
correr com vontade em busca da sua Felicidade. Não percam, a temporada é curta.
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